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Vegetarianismo e o vinho

Pode parecer estranho, mas o vinho não é, necessariamente, um produto estritamente vegetariano e menos ainda vegano, uma filosofia de vida que vai muito além de uma dieta isenta de alimentos de origem animal.

Embora em sua composição só existam uva e leveduras, ambos 100% vegetais, nos diversos processos de elaboração de um vinho podem ser empregados produtos de origem animal. Acreditem, a lista é grande e, em alguns casos, altamente insuspeitos.

Depois de fermentado, o mosto tem aparência muito turva com muita coisa em suspensão no líquido. São restos das cascas das uvas, algumas proteínas decorrentes da reação e resíduos das leveduras que precisam ser removidos para assegurar uma boa aparência e qualidade de aromas e sabores ao final.

Um dos produtos mais simples e antigos usados no processo de clarificação de um vinho é a clara de ovo, que não se enquadra nas regras da dieta vegetal. Além dela, mais subprodutos de origem animal podem ser usados: sangue, medula óssea, gelatina, cola e óleo de peixe, quitosana e caseína.

Todos estes produtos citados cumprem a mesma função: auxiliar na filtração e clarificação do vinho. A escolha fica a critério do produtor.

Existem alternativas que se enquadram nas regras do vegetarianismo e veganismo. A primeira e quase óbvia, é não filtrar o vinho, optando por deixá-lo em repouso por um longo tempo, decantando e sedimentando. Produtores de vinhos naturais seguem esta linha. A aparência pode não ser a mais comercial, mas o vinho está com tudo que lhe pertence dentro da garrafa.

Outra técnica emprega produtos de origem mineral como bentonita, sílica gel, caulim, calcário e de origem vegetal como algas e caseína obtida a partir de plantas. Algumas destas técnicas tem influência direta no preço final do vinho.

Para o grupo que segue a filosofia vegana, ainda há mais pontos a serem considerados. Algumas rolhas de cortiça são produzidas a partir de resíduos aglomerados com uma cola de origem animal. O encapsulamento das garrafas, se feito com cera de abelhas, é mais um item a ser observado. Os que seguem este regime de forma mais restrita se preocupam, também, com o manejo do vinhedo: nada de fertilizantes de origem animal.

Na legislação brasileira não há nenhuma obrigatoriedade de mencionar se um vinho é vegetariano ou vegano. Entretanto, muitos produtores, que já perceberam um bom potencial neste mercado, incluem estas informações em seus vinhos, seja no rótulo ou contrarrótulo.

A Sociedade Vegetariana Brasileira criou, em 2013, o “Certificado Produto Vegano SVB”, um programa de reconhecimento já adotado por boas vinícolas nacionais, que exibem o selo (foto) em seus produtos.

Lojas on line costumam colocar um marcador, ao lado da foto de cada produto, indicando se é adequado para consumo por quem segue uma destas dietas. Nas lojas presenciais, o melhor caminho é perguntar ao vendedor.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto por Lisa Davies no StockSnap

Aromas e Sabores

Apesar de ser bem comum, abrir uma garrafa de vinho, servir uma taça cumprindo o ritual de examinar a cor, sentir os aromas, provar um pequeno gole e, em seguida, descrever algo como “aromas de morango, amoras e framboesas, taninos equilibrados e boa acidez”, sempre impressiona.

Tudo ganha um ar de mistério quando fazemos o mesmo e o máximo que nos aproximamos da descrição é uma vaga lembrança aromática de “frutas vermelhas”. O resto, passa batido.

A verdade é que nem todo mundo está preparado ou treinado para fazer este tipo de análise, ainda mais, agora, depois desta epidemia que roubou a capacidade de degustar de quem acabou contaminado.

Existem exercícios para treinar ou recuperar o olfato e o paladar perdidos.

Para tirar bom proveito destas técnicas que serão sugeridas é preciso entender que há uma enorme distância entre provar uma fruta e tentar encontrar estas mesmas notas num vinho.

Tomemos um exemplo bem simples: morango. Seu aroma e sabor são bem característicos e ninguém vai ter dúvidas do tipo “pode não ser um morango” ao saboreá-lo. Mas não tem morangos na elaboração dos vinhos. O que acontece é que alguns compostos químicos decorrentes dos processos de vinificação induzem, na nossa memória olfativa e gustativa, sensações que lembram aquelas que obtivemos com a fruta in natura.

Este é um bom ponto para começar a treinar olfato e paladar. Vamos listar algumas frutas que, quase sempre, estão presentes nos vinhos mais conhecidos de todos. O exercício consiste em provar, uma de cada vez e em ocasiões distintas. Isso fará uma novo registro sensorial. Procurem por características que possam não deixar dúvidas sobre o que está sendo degustado. Evitem criar associações com outros sabores.

A segunda parte do treino será tentar identificar em que vinho estas frutas podem aparecer. Não provem a fruta junto com o vinho, apenas imaginem. Tentem lembrar de algum vinho já degustado. A confirmação de sucesso ou fracasso virá quando decidirem fazer uma prova real, degustando um dos possíveis vinhos identificados.

A relação básica das frutas: Amora, Framboesa, Ameixa, Cereja preta ou, se preferirem, uma compota de frutas vermelhas é um bom substituto. Além destas temos: Maçã Verde, Lichia, Pêssego e Melão.

Reparem que são frutas de sabores pouco marcantes. Propositadamente não incluímos nenhuma fruta cítrica nesta relação.

Para os que preferirem saber os tipos de vinhos mais associados a estas frutas é só pedir as respostas por e-mail (tuty@oboletimdovinho.com.br) ou nos comentários.

Taninos, acidez, doçura e teor alcoólico são mais complicados para se treinar, exigindo alguma preparação. Será necessário um pouco de vinho tinto, da sua preferência (brancos não são tânicos), um álcool neutro como Vodca, de boa qualidade, sem aromas e sabores, chá preto em saquinho, limão e açúcar. Necessário também tempo, paciência e disposição.

O que se busca num exercício como este é acentuar, fortemente, cada uma destas características para, novamente, criar ou recriar novos registros sensoriais.

Os quatro exercícios são análogos e sugerimos que sejam feitos separadamente. A técnica é simplesmente fazer a mistura e provar. Quanto menos o olfato for envolvido, melhor.

Tenha sempre uma taça do vinho sem as misturas para servir de referência.

Tanino – dissolva um saquinho de chá preto numa taça de vinho por cerca de 8 a 10 minutos. Prove, deixando a mistura passear por toda a boca. Deve ficar adstringente e amargo.

Acidez – desta vez acrescente um pouco de suco de limão a uma nova dose de vinho. Neste exercício recomenda-se fechar o nariz antes de provar. Procure por novas sensações na cavidade bucal, comparando com as do experimento anterior.

Álcool – vamos acrescentar uma dose de boa Vodca numa taça de vinho e observar o que muda na hora de degustar. Procure não sentir aromas para enfatizar o paladar. Uma das reações mais comuns é sentir um pouco mais de doçura em relação ao vinho de referência.

Doçura – o último experimento é o mais simples, acrescente uma colherada de açúcar numa taça de vinho. Neste treino, libere o olfato e busque por aromas frutados, comparando com o vinho sem misturas.

Em qualquer um deles, faça comparações diretas com o vinho de referência, observando alterações no corpo, picância, sensações de volume e calor. Há muito que observar e aprender.

Estes exercícios foram adaptados de publicações diversas, entre elas o excelente site Wine Folly.

Divirtam-se e apurem olfato e paladar.

Saúde e bons vinhos!

Foto de Julia Volk no Pexels

A culpa não é dos sulfitos!

Uma das virtudes mais apregoadas pela turma que produz vinhos naturais, sobre a ausência de sulfitos na sua composição impedir as famosas dores de cabeça, está caindo por terra. Segundo contam os mais recentes estudos, mais uma lenda está prestes a ser desmistificada.

Vocês já ouviram falar de Aminas Biogênicas?

Elas formam um grupo bastante conhecido, por exemplo, Histamina, Dopamina e Serotonina, entre outras. São consideradas tóxicas e indesejáveis, principalmente em alimentos e bebidas, vinhos inclusive.

A novidade do momento é que a ausência dos sulfitos na produção dos vinhos, um composto conservante, permite que estas aminas estejam presentes no produto final.

E, sim, são elas que causam a dor de cabeça ou a popular ressaca…

Desta forma, os vinhos “sem sulfitos” causam mais problemas do que os vinhos de produção tradicional. E muita gente se converteu a este estilo por esta razão.

O embate entre os dois “trends” anda bem animado. Não se sabe, ao certo, onde teve início a implicância com os compostos sulfurados. Estatisticamente, apenas 1% da população é sensível a eles, o que nem seria um problema para os apreciadores de um bom vinho, natural ou não.

Mas os naturalistas se apegaram a este fato com todas as forças, é quase um mantra. Não é difícil compreender seus motivos, a filosofia por trás desta linha é a da mínima intervenção – tudo que é necessário já está ali: a uva, as leveduras, nada de agrotóxicos, nada mecanizado. Quase que é só colher e deixar fermentar, sozinho…

Não sabemos se por opção ou por desconhecimento, omitem que, mesmo assim, alguns compostos sulfurados surgem durante o processo de fermentação. Quem segue está linha apenas não acrescenta mais nenhum. Por esta razão, os vinhos naturais, principalmente os brancos, não tem uma vida muito longa.

A discussão pode chegar bem mais longe. Um dos pontos mais polêmicos traz de volta, com outra roupagem, o “representar o terroir”. Os naturalistas afirmam que só os seus vinhos têm esta propriedade e que os demais seriam o resultado de uma grande química.

Nem tanto ao mar e nem tanto à terra!

Contrariar a ciência é complicado, ainda mais quando se usa alguma forma de negacionismo como ferramenta de marketing. Já vimos outras disputas como esta, por exemplo, velho mundo contra novo mundo; a “parkerização” dos vinhos; com madeira e sem madeira. Poderíamos fazer um longo texto somente com estas eternas discussões. Mas não chegaríamos a lugar nenhum, há espaços para todos.

Apenas lembrem-se: não julguem um vinho em função de uma possível dor de cabeça no dia seguinte.

Fiquem atentos:

– menos sulfitos implicam em mais aminas e uma chance maior de problemas, principalmente nos brancos;

– relaxe com preocupações como “terroir bem representado”. Tem que ser muito “bico fino” para entender e perceber o que é isso. Entre os apreciadores de vinho, mundo afora, a taxa de pessoas capazes de compreender este aspecto é ainda menor do que os que sofrem por alergia a sulfitos;

– um bom vinho não é definido apenas pelos aditivos que contém ou não. Há muito mais coisas envolvidas. As generalizações são sempre perigosas. Um dos maiores vinhos do mundo, o Romanée-Conti, não permite nenhuma mecanização em seus vinhedos. Cavalos são utilizados até hoje. E nem por isso se vende como “natural”;

– vinho é um produto comercializado da mesma forma que muitos outros que usamos de forma rotineira. Na maioria das vezes, algumas destas verdades mercadológicas não passam de belas embalagens que, quando abertas, estão vazias;

– vocês podem até não gostar, mas um vinho de 100 pontos é de se tirar o chapéu, seja tradicional, natural, esotérico ou do metaverso;

– e não dá dor de cabeça…

Saúde e bons vinhos!

Foto de abertura: Pixabay

O vinho pode combater a COVID?

É quase inacreditável que, ao mesmo tempo em que estamos num período da história onde a alta tecnologia é a grande estrela, tenhamos nos tornados reféns da desinformação.

A situação é tão grave que já há pesquisadores que cunharam a frase “era da desinformação” para que os futuros historiadores classifiquem e comparem com outros períodos da vida humana, como os da era Mesozoica: Triássico, Jurássico e Cretáceo. Qualquer semelhança não é mera coincidência.

A tecnologia tem sua parcela de culpa nisso tudo, afinal, a busca por uma maior facilidade e velocidade para resolver as tarefas do dia a dia foi a grande impulsionadora das chamadas “redes sociais”, um tipo de mal necessário que acabou com o nosso bom senso e a capacidade fazermos uma análise crítica do que nos é oferecido ali.

Há pessoas que acreditam, piamente, que só nestes ambientes é que se encontra a verdade, como um certo Dignitário, lá no Planalto Central: o resto é lixo!

Por ser considerado um especialista quando o assunto é vinho, fui bombardeado com mais de uma centena de cópias, de uma mesma mensagem, junto com as mais curiosas manifestações de aprovação: a de que “consumir vinhos combateria a epidemia de COVID”.

Tudo bem que este “oba oba” certamente proporcionou alguns instantes de pura felicidade para esses leitores. Só que nenhum deles passou da manchete sensacionalista. Ninguém se preocupou em buscar uma fonte original para, pelo menos, ter uma ideia do que se estava falando.

Pior, não deram importância para uma conjugação do verbo poder, na 3ª pessoa do singular do presente do indicativo: PODE.

Copiado de um dicionário da nossa língua:” Ação de poder, de ter capacidade, direito ou autoridade para conseguir ou para realizar alguma coisa”.

Perfeito! Creio que ficou claro, para nossos leitores, que PODE não significa que VAI, não é uma CERTEZA: tem a capacidade, mas outras condições são necessárias.

Esta pesquisa, que começou em 2003, quando da epidemia de SARS, descobriu que, em laboratório, o ácido tânico tinha capacidade para inibir duas enzimas importantes do coronavírus da SARS.

A epidemia passou e a pesquisa foi abandonada.

Recentemente, pesquisadores de um centro médico em Taiwan retomaram esses estudos e confirmaram que o ácido, em questão, agia igualmente no coronavírus da COVID, nas condições obtidas em laboratório.

Aqui começa a confusão que tentarei esclarecer:

– O ácido tânico e taninos não são a mesma coisa;

– Taninos são polifenóis, um composto de origem vegetal que pode ser encontrado em diversos alimentos como nas cascas da banana, caqui, maçã, uva, em sementes como nozes e castanhas e em algumas bebidas como chá e o vinho;

– Taninos contêm quantidades variáveis de ácido tânico e nem todos os taninos são iguais. No caso do vinho, tudo dependerá da casta vinificada, da forma de elaboração, principalmente do tipo e tempo de maceração empregada e, até mesmo, do famoso terroir;

– Inferir que os taninos do vinho PODEM combater a COVID é uma afirmativa, no mínimo, imprecisa;

– Em tese, sabendo que há um pouco de ácido tânico nos vinhos, seria viável supor que um consumo controlado da nossa bebida favorita teria algum efeito terapêutico.

Mas…

1 – Segundo alguns pesquisadores que tentaram responder a essa questão, a quantidade mínima de vinho, altamente tânico, que uma pessoa, com boa taxa de absorção de taninos (varia muito), deveria consumir para obter algum efeito terapêutico seria 1 litro por dia!

Se optarem por esse caminho, aconselho ter, sempre à mão, o endereço da reunião do AA mais próxima de suas residências.

2 – Isso tudo só faria sentido se você estivesse CONTAMINADO – o que não é desejado em nenhuma hipótese. A pesquisa afirma, categoricamente, que “não existe efeito preventivo no consumo desta substância”.

Resumindo: se você desenvolver os temidos e mortais sintomas vai degustar, na veia, uma grande coquetel de medicamentos, mas vinho não será um deles…

Como diz aquele velho jargão, “Melhor prevenir do que remediar”!

Aqui vão os conselhos de sempre:

– Protejam-se – usem máscaras, mantenham um saudável distanciamento, higienizem mãos e objetos que precisem manusear;

– Escolham outras desculpas para degustar vinhos, há uma infinidade delas: tristeza, alegria, boa comida, comida ruim, boas companhias (devidamente distantes) e até mesmo péssimas companhias – troque-as por uma boa taça!

Opções não faltam. Combater o vírus não é uma delas.

Saúde e bons vinhos!

Imagem de abertura: “Ácido Tânico” por Michał Sobkowski sob licença CC BY-SA 4.0

Vinhos não se contaminam com o Covid-19

Foto de Maksym Kaharlytskyi para Unsplash

Em tempos de quarentena e isolamento voluntário, todo o cuidado é pouco. Temos que prestar muita atenção aos detalhes, coisas pequenas que nos passam despercebidas nas atividades diárias, mas que podem se tornar um ponto de contaminação.

Para quem mora num edifício de apartamentos, o simples apertar do botão do elevador já pode complicar as coisas.

E no mercado, será que é seguro manusear frutas, legumes, enlatados e outras embalagens?

A nossa garrafa de vinho entra nesta relação e o seu conteúdo também.

Pensando nisto, a Federação Espanhola de Enologia divulgou uma importante nota sobre a possibilidade da contaminação do vinho, dos envases e quais as limitações de seus efeitos sobre ação do vírus COVID-19.

O resultado obtido depois de um debate entre entidades médicas e associações de enólogos, resguardando que se trata de um novo vírus, salientou os seguintes pontos:

1 – A sobrevivência deste vírus no vinho é improvável dada as características físico-químicas do líquido (ambiente hipotônico), presença de álcool e de polifenóis que impedem a sobrevivência ou a multiplicação do vírus;

2 – A contaminação das embalagens também foi considerada como pouco provável, não constituindo um ambiente propício para a hospedar um vírus. Sua vida seria muito curta;

3 – O consumo, moderado e responsável, de vinho contribui muito para uma melhor higiene da cavidade bucal e da faringe, a principal “porta de entrada” deste vírus, diminuindo a possibilidade de infecções.

Ótima notícia!

Mas isto não significa que devemos, literalmente, “enfiar o pé na jaca”.

Mesmo com este aviso em mente, não podemos de deixar de observar alguns detalhes:

1 – Higienize qualquer garrafa antes de abri-la. Já fazíamos isto com o gargalo, após a retirada da cápsula e rolha. Um pouco de álcool no pano de serviço é suficiente para deixar a garrafa tinindo;

2 – Isto mesmo pode ser feito com as taças. Lave, seque e de um brilho com uma flanela e álcool;

3 – Mãos cirurgicamente limpas, sempre. Por favor.

Saúde bons vinhos e poucos vírus!

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