Categoria: Peru

Machupicchu e os vinhos que não bebi – Final

 5º e 6º dias Cusco novamente
 
Depois de uma modorrenta manhã e uma divertida viagem de trem até a estação de Ollanta, seguido de 1:30h de van, retornamos ao nosso simpático hotel em Cusco, já bem aclimatados com o ar rarefeito de lá. Nosso principal objetivo tinha sido plenamente alcançado e estávamos com um dia e meio livres para desfrutar da gastronomia “cusqueña” e nos prepararmos para a celebração do ano novo.
 
Após um breve descanso partimos para jantar num dos mais badalados restaurantes, o Limo, que serve uma culinária peruana com forte sotaque japonês. Interessantíssimo. Nas fotos a seguir uma montagem dos pratos e sobremesas. É para deixar com água na boca mesmo!
 
Para começar os aperitivos: algumas variantes do Pisco Sauer, cervejinha e uma prosaica limonada com especiarias locais. O “amuse bouche” era composto de algumas pastinhas moderadamente picantes e batatinhas assadas no lugar do pão, para mergulhar.
 
 
Os pratos:
 
 
O forte são os pescados, seguido das aves. Carne vermelha, embora boa, é escassa. Assim como no México, o abacate é presença constante nas saladas ou como acompanhamento. A grande novidade ficou por conta do prato mostrado na primeira foto à esquerda: Cuy.
 
Trata-se do nosso “Porquinho da Índia”, uma fonte de proteínas desde os tempos dos Incas. Há, inclusive, pequenos quiosques no Vale Sagrado que os vendem como os nossos espetinhos de carne, “Cuy al Palo”. São muito apreciados e quem provou achou saboroso. É uma carne de porco!
 
Para harmonizar, um belo Finca Las Moras Sauvignon Blanc que estava delicioso. Até que enfim um bom vinho!
 
Um curioso detalhe na hora de servir o vinho foi a pergunta: “local o helado?” Os peruanos não têm o hábito de beber nada com gelo ou muito gelado, tudo é na temperatura ambiente. Nesta noite fazia cerca de 10º na rua e um pouco mais quente no restaurante. Pedimos que gelassem o vinho, só então o balde com gelo e água foi trazido. Voltamos para o hotel em alegre caminhada pela principal via de Cusco, a Avenida del Sol.
 
No dia seguinte, último do ano, após uma manhã de museus, passeio em ônibus aberto e comprinhas, fomos almoçar em outro restaurante badalado, o Cicciolina, com um cardápio de influências italianas. De interessante um diferente presunto cru de pato, servido em delgadas lâminas sobre cubos de polenta. Pensando na ceia de ano novo optamos por pratos mais leves e deixamos os vinhos para mais tarde.
 
 
Bela refeição, embora a nossa preferida tenha sido a da noite anterior. Um vinho perfeito para acompanhar seria o Orvieto DOCG da Piccini, leve e aromático.
 
 
A ceia de Réveillon foi outro capítulo formidável. Compramos, com a devida antecedência, um pacote no Inka Grill, prestigiado restaurante bem localizado na Praça de Armas, epicentro das comemorações. A ilustração a seguir mostra o cardápio oferecido.
 
 
Começamos com uma rodada do onipresente Pisco Sauer. Eu tive que derrubar mais um, que seria do Rubens, o mais novo apreciador da Inca Cola. O problema é que os efeitos do álcool são mais intensos por aqui. Se não moderar a festa acaba mais cedo. Estávamos com uma grande expectativa para saber qual vinho nos serviriam. Podíamos optar por tinto ou branco, apenas.
 
Vieram as entradas e logo depois os pratos principais (fotos).
 
 
Ofereceram-nos um tinto chileno, o Santa Helena Varietal Carmenére. Confesso que tenho certa reserva com vinhos que trazem nomes de Santas ou Santos em seus rótulos, nunca me acertei com eles. Para não bancar o enochato aceitei. Não me arrependi, estava correto e foi boa opção de harmonização. Após as sobremesas foi servido um cava Freixenet Cordon Negro, que é uma aposta certeira apesar de produzido em larga escala.
 
 
Um pouco antes da meia-noite deixamos o restaurante e fomos assistir e participar da comemoração na Praça de Armas, bem diferente do espetáculo pirotécnico do Rio e de outras capitais do mundo. A grande farra em Cusco é correr em volta da praça. Os jovens gastam energia nisto e são muito animados. Contagiante!
 
Fogos de artifício não são bem vistos por lá: colocam em risco o importante patrimônio cultural da cidade (mas tem sempre alguém que solta um rojão…).
 
 
Alegres e satisfeitos voltamos para o hotel. Nosso avião para Lima partiria no final da manhã do dia 1º.
 
6º e 7º dias Lima
 
O primeiro dia do ano na capital peruana é meio morto. Chegamos ao hotel por volta das 15h e logo saímos para passear. Fomos conhecer o Shopping Larcomar, construído sobre uma das muitas falésias locais. Ficamos passando o tempo e fotografando a linda vista para o Pacífico até a hora de jantar.
 
O grupo se dividiu.
 
Cecília e Rubens foram para o turístico restaurante Rosa Náutica (foto), um complexo situado sobre o mar e acessado por um longo píer cheio de lojinhas. Claudia e eu fomos procurar algo mais autêntico, mas não havia muitas opções, tudo estava fechado por conta do feriado. Repetimos o Alfresco e, novamente, foi uma boa pedida.
 
 
Nosso último dia no Peru foi movimentado. O avião que nos traria de volta decolaria às 21:45h, hora local, nos deixando com o dia livre para conhecer melhor a capital do país. Depois de umas compras num supermercado próximo, partimos para conhecer o Centro Histórico e o Museu Larco de arte pré-colombiana, muito recomendado.
 
Este museu é imperdível. Uma instituição particular fundada em 1926, por Rafael Larco Hoyle, aos 26 anos de idade, com ajuda de seu pai. Conta com cerca de 45.000 peças e é um espetáculo à parte.
 
No início de sua coleção se deu conta da falta informações arqueológicas que permitissem classificar adequadamente o material que adquiria. Enveredou-se pelos caminhos da arqueologia, fazendo inúmeras pesquisas e suas próprias escavações. Criou-se o sistema de ordenação cronológica, adotado até hoje, além de ter revelado diversas culturas até então desconhecidas, como a Moche.
 
 
Almoçamos, sem vinho, no simpático restaurante do museu e nos despedimos deste impressionante país, esperando voltar um dia para conhecer outras atrações como as Linhas de Nasca e o Lago Titicaca.
 
O outro lado da moeda
 
A propósito dos comentários feitos na coluna da semana passada, recebi este interessante e-mail do leitor Maurcio Steinberg, que residiu em Lima. Acho importante conhecer os aspectos que não são mostrados aos turistas:
 
“Tuty.
 
Morei e trabalhei em Lima por 1 ano e meio. Lecionei matemática na Federal de Lima como parte de meu doutorado em matemática. No início eu pensei como você que os nativos eram educados e nos tratavam bem, mas conforme a convivência ia aumentando víamos que a educação não é o mais forte deles. Apenas aquelas profissões ou funções que têm integração com o turismo são vigiadas de perto e se houver qualquer tipo de reclamação, o funcionário está fora. O governo trata com mão de ferro quem cuida e atende aos turistas, mas não cuida daqueles que dão educação a seu povo, tal como o daqui, não interessa ter um povo aculturado.
 
Todos os serviços que têm por finalidade o atendimento ao turista são duramente treinados e se não servirem são descartados.
 
Durante os 18 meses que fiquei por lá, bebi alguns bons vinhos, caros, mas bons.
 
Não é comum você ir a jantares em casas de nativos porque eles não recebem bem os estrangeiros que trabalham por lá. Eles acham que você está tirando uma vaga deles e o desemprego por lá é grande.
 
O Peru que você viu, não é o Peru real, o do dia a dia. O que você viu é o Peru para turista.
 
Não estou criticando sua coluna, por favor não me entenda mal, apenas estou colocando minha experiência sobre viver em Lima. Acredite, foi gratificante, mas pesada.
 
Abraços
 
Maurcio-Natal”
 Dica da Semana:  para encerrar esta viagem, uma verdadeira volta ao passado, um clássico.
 
Albert Bichot Petit Chablis 2011
Cor amarela claro com reflexos esverdeados. Apresenta notas de maçã, limão e um belo toque de mineralidade. Na boca é redondo e com boa persistência.
 
Este vinho é muito adequado para servir como aperitivo ou com pratos acompanhados com frutos do mar.
 

Machupicchu e os vinhos que não bebi – III

4º dia: Machupicchu
 
Se vocês estão pensando que o Peru é uma espécie de Brasil subdesenvolvido estão redondamente enganados. Tudo aqui funciona na hora certa e o turista é prestigiado o tempo todo. Não se negam informações e nem mesmo nos lembramos de ter escutado a frase “no lo entiendo”, tão comum na Argentina quando tentamos um “portunhol”. No máximo eles pedem para que falemos pausadamente. Entendem tudo, acham graça, e nos respondem com eficiência e simpatia. Ponto para eles, turismo de 1º mundo.
 
 
Obviamente o nosso trenzinho partiu da estação Ollanta exatamente no horário previsto, 6:30. Optamos pelo serviço Vistadome da operadora Perurail, que nos colocou num vagão com teto panorâmico. Viagem deslumbrante, o trem acompanha o leito do rio Vilcanota/Urubamba pela meia-encosta, atravessando alguns túneis que mal davam para o vagão passar. Pessoas nervosas não ficariam incólumes. Para distrair há um simpático serviço de bordo e venda de camisetas, bonés e coletes, mas cuidado com os preços…
 
Depois de 1:30 chega-se ao Pueblo de Machupicchu/Águas Calientes de onde parte o micro-ônibus morro acima. Se vocês procuram fortes emoções indico esta subida. Uma estradinha muito sinuosa e íngreme por onde trafegam uma quantidade substancial destes pequenos ônibus. Andam de “pé em baixo”, subindo ou descendo e quando há um cruzamento deles simplesmente não cabem os dois na largura. Um tem que ceder. São cerca de 15 minutos de respiração suspensa. (foto)
 
 
Há uma série de restrições para entrar nesta cidade, considerada uma das maravilhas do mundo atual e patrimônio da humanidade:
 
– não se permite comidas;
 
– não podem ser usadas garrafas ou copos descartáveis (tudo deve ser levado de volta);
 
– nem pensar em jogar lixo no chão;
 
– mochilas e similares são limitadas a um volume de 20 litros;
 
– bastões de caminhada só os aprovados pela autoridade local (ponta chata que não deixa marcas no solo);
 
– proibidíssimo fumar;
 
– não se pode tocar em quase nada, somente nos muros. (pichadores que se cuidem);
 
– não danificar a flora ou fauna local;
 
– não criar novas trilhas, utilizar as que já estão abertas.
 
Atento a estas recomendações, desisti da minha ideia de levar uma garrafa de vinho e taças para degustar lá em cima. Imaginava um bom vinho de corte, talvez um Susana Balbo Brioso, tomado ao cair do sol.
 
 
Mesmo sem o vinho, Machupicchu é indescritível, nenhuma foto de cartão postal chega perto da realidade. Após saltar do ônibus e atravessar a burocrática portaria do parque, chega-se ao muro e ao portal de acesso original da cidade perdida. Honestamente, ninguém está preparado para o que se vê ao atravessar o umbral que nos separa da realidade para a magia desta cidadela. É de perder o fôlego!
 
 
Nossa guia, Srta. Silu, valorizou cada etapa deste tour com suas explicações teatralizadas, sempre arrematadas pelo bordão “e así és”, autenticando a veracidade de suas afirmações e das muitas lendas e suposições relatadas. Foram 2 horas de encantamento. Muitas caminhadas, sol intenso (recomenda-se chapéu/boné além de protetor solar) e temperatura elevada porem agradável. Superou qualquer expectativa.
 
Ao final, nossa guia se despediu e nos deixou com tempo livre para exploramos a cidade, com a recomendação de subir até o patamar onde se encontra a casa original do guardião, cujo telhado foi recomposto para mostrar como era aos visitantes e “sacar la foto para el postal!”. Já um pouco cansados, preferimos continuar na parte baixa, nos dirigindo lentamente até a saída e embarcar no transporte de volta até Pueblo de Machupicchu/Águas Calientes.
 
 
O que falar sobre este pequeno povoado nos pés da montanha? Conhecem Pirapora de Bom Jesus do Mato Dentro? Ganha fácil!
 
Apesar de termos almoçado num bom restaurante com saboroso buffet de um dos melhores hotéis do local, não havia muito mais para fazer por aqui. Na rua principal, Calle Pachacutec, há uma série interminável de pequenos albergues e restaurantes, todos com absolutamente o mesmo cardápio e preços, voltados para um público muito específico como os aventureiros ou mochileiros. Para eles aqui deve ser o paraíso. Outra opção era o banho nas águas termais, mas fomos avisados por um brasileiro que passava pelo local de que “a água é meio suja e provavelmente aquecida artificialmente”…
 
 
Nosso trem de volta só sairia no dia seguinte às 13:30h, o que nos levou a ficar procurando opções para passar o tempo: pizza no jantar, fotos diversas, comprinhas no mercado de artesanato e até mesmo “massagem Inca”, seja lá o que isto for.
 
Vinho? Nem pensar, no máximo uma cervejinha. É um chavão antigo, mas verdadeiro: não havia clima, nem para celebrar a beleza de Machupicchu.
 
Em todo o caso, o que vem a seguir seria apropriado…

Dica da Semana:  este seria o vinho perfeito para nos lembrarmos do que foi uma viagem perfeita.
 

Ken Forrester Petit Chenin Blanc
Um Chenin Blanc sul africano típico, em versão leve e sem carvalho. É super-refrescante e bastante cítrico: indispensável em dias de calor. Amadurecido em tanques de aço inox, exala aromas de frutas cítricas, marmelo, pera e flores. Na boca confirma seu frescor, lembrando sabores de maçã verde e grapefruit, tem bom corpo e um final “picante”.

 

Machupicchu e os vinhos que não bebi – II

3º dia: Vale Sagrado
 
Precisamente às 8h lá estava o nosso ônibus da excursão contratada para nos levar ao Vale Sagrado do Incas, onde pernoitaríamos, para, na manhã seguinte, embarcar no trenzinho com destino a Machupicchu. De malinha em punho partimos em nova etapa de nosso passeio.
 
O Vale Sagrado, se estende por mais de 120 quilômetros tendo em seus extremos as cidades de Pisac e Machupicchu e a Cordilheira dos Andes pelos dois lados. Esta estreita planície está situada a 2800 metros acima do nível do mar, bem mais baixo que Cusco. Tem um clima muito agradável com 18º C de temperatura média anual, rica flora e fauna, terra fértil e inúmeros riachos descendo das cordilheiras nevadas e alimentando o Rio Vilcanota, velho conhecido nosso por ser um dos formadores do Rio Amazonas.
 
Tudo gira em torno deste caudaloso rio, que em determinado trecho é mais conhecido por Urubamba, nome de um dos muitos vilarejos que atravessa. As atrações são múltiplas começando com as plantações de milho e batata. São diversas variedades de um e de outro, algumas muito exóticas como o milho roxo, que só é usado para fazer sucos ou o delicioso milho gigante, servido como acompanhamento para qualquer tipo de refeição. Com relação às batatas, existem cerca de 3800 espécies catalogadas.
 
A visita começa com uma paradinha num dos vários mirantes da estrada, para termos uma visão geral do local. (foto)
 
 
Há monumentos, sítios arqueológicos e ruínas por todos os lados, demonstrando que este vale nunca deixou de ser ocupado, desde tempos imemoriais. A próxima parada foi em Pisac, uma interessante cidade dupla, com a parte Inca em cima do morro e a arquitetura espanhola ao pé da montanha, com sua praça central e casas de adobo.
 
Incrível! Tudo em perfeito estado de conservação. Hoje em dia a praça central de Pisac é o ponto de reunião, aos domingos, de todos os grupos indígenas que habitam esta região. Promovem uma grande feira para vender seus produtos e ao mesmo tempo fazerem uma socialização onde os jovens, vestidos de acordo com as regras de cada grupo, procuram suas futuras esposas, igualmente identificadas pelas vestes como comprometidas ou solteiras.
 
 
Na montagem acima estão as duas cidades. Dali seguimos para o almoço, um buffet de comídas típicas, que nos prepararia para a impressionante visita da tarde: Ollantaytambo.
 
Esta outra cidade Inca talvez seja a única que nunca deixou de ser ocupda desde sua criação. A moderna arqueologia afirma que esta região foi um complexo militar, religioso, administrativo e agrícola, alem de palco de uma das poucas derrotas impostas aos espanhóis.
 
Como em tudo por aqui, há uma bela lenda que explica o seu nome. Ollanta era um chefe militar que se apaixona pela filha do Imperador Pachacutec. Decide “raptá-la” (foi consensual) gerando um conflito de mais de 10 anos nas tentativas, do pai, para recuperar sua filha. Somente após a morte de Pachacutec foi que seu filho, o novo Imperador, concede a mão de sua irmã, Cusi, transformando o chefe Ollanta em seu mais fiel oficial.
 
Visitar Ollantaytambo requer um bom preparo físico, são 236 degraus a serem galgados até seu topo para descortinar uma das mais belas e intrigantes paisagens do vale.
 
Quem do nosso grupo se habilitou?
 
Somente eu!
 
 
A foto acima dá uma idéia do percurso. A “escada” está à esquerda junto à encosta. A subida é gradativa, com pausas para recuperar o fôlego a cada 4 ou 5 patamares. Mas valeu cada momento. Ao chegar ao topo minha adrenalina estava no máximo. Para comemorar o meu feito brindaria com um delicioso espumante, um Cave Geisse Brut Nature seria perfeito!
 
Lá em cima pudemos observar esta imagem (foto) de uma face esculpida na montanha:
 
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Este seria o rosto dos Deus das Sementes.
 
Comparem com as fotos seguintes. A primeira foi tirada de uma ilustração que representa esta divindade no livro que o nosso guia levava, a segunda é de uma das muitas ilustrações de Francisco Pizarro, o Conquistador Espanhol:
 
 
Há uma notável semelhança!
 
O resto da história fica por conta de cada um, mas imaginem Pizzaro chegando em seu cavalo, animal desconhecido paras os Incas, a este povoado: no mínimo acharam que era a encarnação do Deus esculpido na montanha.
 
Os meus companheiros de viagem ficaram num barzinho ao pé da montanha, enquanto eu enfrentava um retorno nada fácil. Vejam na foto da direita: a trilha de descida fica do lado oposto ao da subida sendo bastante íngreme e sinuosa.
 
 
Ao final do dia fomos deixados em nosso hotel no Vale onde jantaríamos. Todo animado e com o sério intuito de me recompensar pela subida de Ollantaytambo, pedi a carta de vinhos do pequeno restaurante. Quase uma decepção: só havia um único vinho, peruano e totalmente desconhecido para mim. Mais por curiosidade do que por qualquer outro motivo, pedi uma tacinha. (foto)
 
 
Não era de todo ruim, ingênuo talvez, lembrando muito os vinhos nacionais quando ainda eram nada mais que uma tentativa de fazer um bom vinho. Claudia detestou, Cecília disse que “dava para tomar”, Rubens não bebe álcool preferindo uma “deliciosa” Inca Cola. Consultamos um famoso guia de vinhos internacionais que trouxe o seguinte comentário: “melhor não beber”…
 
Depois desta ducha de água fria só restava um merecido descanso. Às 6h o trem para Machupicchu partiria. 

Dica da Semana:  mais uma boa opção para enfrentar o calor sem deixar de apreciar a nossa bebida predileta. 

 

MAIA VARIETAL COLLECTION TORRONTÉS

De cor amarelo palha, este vinho apresenta aromas florais, com toques de frutas cítricas e brancas como melão e maçã. Acidez correta garantindo o frescor e realçando os aromas se realcem. Boa untuosidade e persistência.
Ideal para o inclemente verão de 2014.

 

 
 

Machupicchu e os vinhos que não bebi – I

Ao contrário do que sempre fazemos, eu e Claudia decidimos que não passaríamos o Reveillon de 2014 no Rio. Trocamos a agitada festa carioca por uma viagem que sonhávamos há muito tempo, conhecer o Peru e visitar a famosa cidade perdida dos Incas, Machupicchu. Mas, não tínhamos ideia do que nos esperava!
 
Éramos 2 casais, Cecília e Rubens nos acompanhariam nesta deliciosa aventura, uma maratona de 7 dias, praticamente cada noite em uma cidade diferente.
 
Procuramos nos organizar o melhor possível para enfrentar esta maravilhosa jornada que começou no dia 26/12 quando embarcamos para Lima, via TACA uma boa, mas confusa empresa aérea peruana: os embarques, quase sempre, eram inexplicavelmente complicados…
 
1º dia: Lima
 
Com um fuso horário de -3 horas (em relação ao Rio de Janeiro) e após 5 horas de voo, chegamos à capital do Peru por volta das 9:30h (hora local) apesar do termos acordado às 4h (Rio) para dar tempo de chegarmos ao aeroporto, check-in etc.
 
Não chove nesta cidade e o tempo é sempre nublado devido aos efeitos da gelada Corrente de Humboldt, no Oceano Pacífico. A temperatura amena era um convite para conhecermos os arredores do bairro de Miraflores, onde ficava nosso hotel.
 
Começaram as surpresas: o nosso simpático guia, Jayson, fez várias recomendações para minimizar o “Soroche”, conhecido mal da altitude que nos esperava em Cusco, nosso próximo destino no dia seguinte: muito descanso, comidas leves e zero de álcool, tudo para não desperdiçarmos as energias que seriam necessárias nos 3.400 m de altitude da antiga capital do Império Inca.
 
Havíamos imaginado fazer um belo almoço no prestigiado restaurante Astrid e Gaston, mas não conseguimos mesa. Optamos por outro bom estabelecimento, o Alfresco, onde fomos muito bem recebidos e comemos divinamente. As fotos dão ideia do que é a sofisticada gastronomia peruana.
 
 
Escolhi um apimentado Ceviche de frutos do mar (1ª foto à direita) acompanhado de milho gigante cozido e de Camote, uma espécie de batata doce que só existe no Peru, sempre servida com os pratos mais picantes para ajudar a amenizar o impacto. Na impossibilidade de pedir um bom Sauvignon Blanc, como o chileno Morandé Pionero, não deixei passar em branco: pelo menos um tradicionalíssimo Pisco Sauer foi degustado, apesar dos protestos dos demais comensais, mais preocupados com o que poderia ocorrer em Cusco do que eu.
 
 
Após um merecido descanso fomos visitar o Parque das Fontes, atração muito interessante de Lima, com 13 gigantescas fontes de água, cada uma de um formato e vazão impressionantes. Em duas delas a garotada se deliciava com banhos de diferentes jatos de água, isto a uma temperatura de 19º. Noutra passamos por dentro de um túnel de água sem nos molharmos. Às 19h um show de luz e som projetava bonitas imagens numa cortina de água.
 
 
Ao final do dia um lanchinho leve no Punto Azul, ao lado de nosso hotel e cama, pois, no dia seguinte às 8h, embarcaríamos para Cusco.
 
2º dia: Cusco
 
Depois de um rápido voo, chegamos à bela cidade de Cusco que parece ter parado no tempo. Se alguém ainda se lembra dos filmetes do Zorro que passavam na TV de antigamente, o cenário é o mesmo. Belíssimo por sinal. Mas para fazer qualquer esforço nestas alturas paga-se um preço alto. O cansaço é instantâneo.
 
O simples ato de retirar a mala da esteira do aeroporto já nos deixava ofegantes. O nosso grupo se dividiu na maneira de lidar com esta dificuldade, que é passageira:
 
– 3 tomaram uma medicação preventiva para ajudar na adaptação;
 
– o valente autor destas mal traçadas linhas, orientado por seu personal trainer, optou por se tornar uma “tartaruga”, fazer tudo em “marcha lenta” e dedicar todo e qualquer tempo livre para relaxar, descansar e respirar pausada e regularmente.
 
Na verdade, todos nós sentimos os efeitos, uns mais, outro menos, se é que me faço entender…
 
 
Já as 13h haveria um City Tour de 4 horas. Tratamos de descansar no hotel e fazer um rápido almoço. Novamente o que nos foi servido estava apetitoso, bem que merecia um belo Rosé. Montes Cherub seria a pedida ideal para acompanhar os pratos a base de pescados e a carne pedida pelo Rubens.
 
O City Tour foi tipo “puxado”. Começamos pela Catedral que fica na Praça de Armas que corresponde ao centro da cidade. É a 2ª maior da América Latina (a 1ª fica no México, em Puebla) e seguimos, a pé, para visitar o Koricancha ou Templo do Sol, interessante exemplo de adaptação da arquitetura Inca transformada em convento pelos conquistadores espanhóis. Show!
 
Nossos companheiros de viagem, esgotados, abandonaram o Tour. Eu e Claudia voltamos para a van e continuamos o longo passeio pelas ruínas aldeãs de Sacsayhuamán, Kenko, Puca-Pucara e Tambomachay.
 
Destes, o mais impressionante foi o 1º da lista. Não dá para acreditar que sem uma escrita e meios mecânicos tenham conseguido transportar e colocar estas gigantescas pedras com precisão milimétrica. Tudo na base do “man power”.
 
Na foto abaixo, mostro uma rocha de 9 metros de altura (há mais 3 metros enterrados) que foi esculpida, polida, trazida até o local e erguida por cerca de 15.000 homens, com cordas feitas a partir de couro ou fibra vegetal trançada, planos inclinados e troncos de madeira para servir de roletes, armados como se fossem um trilho de trem. Espetacular! Eu, como engenheiro, fiquei fascinado.
 
 
Neste momento um belo Pinot Noir seria perfeito. Sentar em um local com sombra e meditar muito. Minha escolha seria um vinho da Califórnia, o Belle Gloss, para celebrar um povo genial que foi destruído pelos conquistadores europeus.
 
 
Fico pensando até onde eles poderiam ter chegado com sua Tahuantinsuyu (o seu império), sua precisão e visão holística do mundo: o Condor, o Puma e a Serpente, cada um representando uma parte da vida: o mundo de cima ou dos espíritos, o do meio ou dos homens e o do mundo de baixo ou dos mortos.
 
A vida seria controlada pela visão do Condor que nos remeteria ao mundo do meio como se fossemos um Puma a percorrer a Mãe-Terra ou Pacha Mama, a referência mais importante para eles. Sempre conscientes e corajosos, preocupados com os seus “rastros”, como uma Serpente, a guardiã do mundo de baixo, para então, um dia sermos levados para cima pelo “voo sagrado do condor”, ampliando a visão destes 3 mundos.
 
Impossível não traçar um paralelo entre esta brilhante civilização e outras como a dos Egípcios. Aliás, sem nenhuma dúvida, o Peru é o Egito das Américas.
 
 
Infelizmente não conseguimos alcançar o Templo das Águas ou Tambomachay, o cansaço chegara ao nosso limite e decidimos não encarar uma subida de mais 200m.
 
Voltamos para a van e descansamos até o hotel.
 
Depois de um bom período de repouso, saímos, nós dois, para um passeio noturno até a Praça de Armas e jantar algo leve. O outro casal não tinha forças para nos acompanhar, ficando no hotel.
 
Jantamos leve no simpático Calle del Meio, com uma linda vista para a praça. Eu ainda arrisquei uma Cusqueña, saborosa cerveja local, sob os olhares censurantes da esposa.
 
 
Era a hora de fazer a malinha para os próximos dois dias, pois o transporte que nos levaria até o Vale Sagrado e depois o trem que nos deixaria em Águas Calientes, também conhecida como Pueblo de Machupicchu tem espaços restritos para bagagem. A recomendação era levar o mínimo necessário. Mas esta parte da história fica para semana que vem.

Dica da Semana: mais um vinho que não tomei e muito agradável neste verão de sensações térmicas de 50º, no Rio de Janeiro.
 
Terrazas de Los Andes Reserva Torrontes
Vinho elegante, sem excesso de aromas, não passa por madeira, ótimo frescor, agradável. Frescor decorrente dos vinhedos de altitude de 1880 metros em Cafayate. Seus aromas puxam levemente para uma relva fresca lembravam algo de Sauvignon blanc. Vinho é fino, fresco, floral, equilibrado, versátil e muito agradável para o verão.
 

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