Autor: Tuty (Page 27 of 145)

Tirando a poeira! – os eventos de vinho estão de volta!

Demorou, foram mais de dois anos de saudades, mas valeu a pena!

No mês de setembro, em Bento Gonçalves, aconteceu a Wine South America, a maior feira de vinhos da América. No início de outubro foi a vez da Pro Wine, em São Paulo, outra espetacular feira. Infelizmente, o preço proibitivo das passagens aéreas nos impediu de participar de ambos os eventos.

Mas o Rio não ficou de fora deste circuito. Duas ótimas degustações aconteceram no espaço de uma semana.

A primeira foi a 10ª edição do Vinhos & Sabores de Portugal. Foram 34 vinícolas que apresentaram seus vinhos no espaço Jardins do Citta Office Mall.

Além dos vinhos, havia queijos e azeites portugueses, um bom buffet livre e uma música, ao vivo, deixando tudo num clima muito simpático e amigável.

Desde a compra do ingresso, pela Sympla, (excelente, ao contrário de outras que deveriam se chamar “ingresso errado”) o acesso, a recepção e a qualidade dos vinhos, estavam irretocáveis, merecendo o nosso aplauso.

Como era impossível provar todos os mais de 350 rótulos, representando as regiões do Tejo, Vinhos Verdes, Beira Interior, Douro, Lisboa e Trás-os-Montes, fizemos uma seleção buscando produtores que não nos eram familiares. Como de hábito, a primeira passada foi só com brancos e rosados.  Na segunda, entraram os tintos.

Três produtores nos agradaram muito, não só pela qualidade dos vinhos como pela ousadia de alguns deles.

Quinta da Ribeirinha – Tejo – ofereceu um delicioso “line up” com vinhos das castas tradicionais de lá e outros com uvas que são raras em Portugal: Riesling, Gewürztraminer, Viognier, Pinot Noir, Sauvignon Blanc (diferente de tudo que já provamos), Pet-Nat, Blanc de Noirs e vinho laranja.

O Vale de Lobos, branco de Fernão Pires, estava excelente.

A Quinta da Falua, outra produtora do Tejo, também deixou boa impressão com a variedade e qualidade de seus vinhos. A linha “Sommelier Edition” foi a mais apreciada e tem ótima relação custo-benefício.

A terceira vinícola que entrou para a nossa lista “top” é a Quinta do Cardo (o site está em construção), da Beira Interior. Entre tintos, brancos e rosados, provamos, apenas, o seu único branco, obtido a partir da casta Síria, uma uva muito pouco conhecida por aqui.

Esta Quinta estava um pouco esquecida por seus donos originais. Foi arrematada por um grupo que a reativou e colocou ordem na casa. Esta é uma região vinícola muito interessante de Portugal. Os vinhedos estão situados num planalto a cerca de 750 metros acima do mar e a produção é orgânica.

O branco reserva é de degustar “rezando”.

O segundo evento que participamos foi o “Vinhos Verdes no Brasil”: Master Class e degustação livre. Este foi um encontro voltado para profissionais.

Na Master Class foram degustados doze vinhos, entre brancos e rosados, em diversos “flights”.

No primeiro, provamos as castas Azal, Loureiro e Avesso. No segundo foram três Alvarinho. A terceira sequência trouxe cortes variados incluindo as uvas Trajadura e Arinto. Para finalizar, dois rosados da casta Espadeiro, um tranquilo e um espumante.

Os destaques vão para todos os vinhos provados, inclusive o único tinto presente na degustação livre, elaborado com Vinhão, apresentado pela Adega Cooperativa Ponte da Barca.

Vinhos Verdes são perfeitos para o clima brasileiros. Muito refrescantes, com um extenso bouquet de aromas e sabores, harmonizando corretamente com a nossa culinária de frutos do mar, aves e suínos.

Mais que degustar bons vinhos, estes dois encontros foram uma grande oportunidade para rever antigos parceiros que andavam sumidos por conta da pandemia. No meu caso, trouxe boas lembranças da última viagem a Portugal, quando voltei a provar alguns dos vinhos da Quinta de Lixa e da Campelo, que havia degustado por lá.

Nesta aventura contei com a colaboração de José Paulo Gils e Pedro Arthur Sant’Anna.

Saúde e bons vinhos!

Maturação e envelhecimento

Parecem sinônimos, mas não são, principalmente quando o assunto for vinho. Há uma sutil diferença, muitas vezes não percebida até por enófilos experientes.

Tecnicamente o vinho é o resultado de uma reação química, a fermentação, quando os açúcares que existem naturalmente no mosto são convertidos em álcool. Neste processo, começam a surgir aromas e sabores que vão deliciar o nosso olfato e paladar. Mas tudo isto só será verdadeiro se dermos “tempo ao tempo”. Recém-saído da fermentação, é uma caldo intragável, selvagem, que tem enorme potencial, mas ainda não desenvolveu, plenamente, todas as suas características organolépticas.

Esta é a fase da “afinação”, como num instrumento musical. O vinho é deixado em repouso durante um bom período, a critério do produtor, em grandes recipientes inertes que podem ser de aço, concreto ou algum material sintético.

Madeira também é usada, com um critério maior, pois pode influenciar no resultado, acrescentando novas características. Tudo dependerá do tamanho do recipiente: quanto maior for, menor sua influência. O Carvalho é a madeira mais comum, mas ainda são usadas, para as grandes dornas, o Castanheiro e a Cerejeira.

Este repouso é a fase inicial da maturação de um vinho e dura até o momento de seu engarrafamento. No caso dos grandes vinhos, a vinícola pode decidir não engarrafar o vinho “afinado” e deixá-lo maturando mais um período, desta vez nas barricas de carvalho, menores, com o propósito de receber novas camadas de aromas e sabores, decorrentes do contato direto com a madeira de origem europeia ou americana.

Muitos especialistas preferem usar o termo “envelhecimento” para definir o que acontece a partir deste ponto. É como se fosse uma nova etapa, após a conclusão do processo produtivo. Mesmo engarrafado, um vinho continua sua maturação ou como preferem os “experts”, evoluindo. O gráfico a seguir mostra as fases da vida de um vinho.

Existe um ponto onde o vinho atinge seu máximo potencial, representado no topo da figura do “sino”. Para cada tipo de vinificação, o que inclui as diferentes castas, este ponto será num momento diferente. Não pensem que é fácil acertar na primeira tentativa. Degustadores experientes adotam um critério de tentativa e erro: compram algumas garrafas da mesma safra de um vinho. Após degustarem a primeira, decidem por quanto tempo vão guardar as outras (ou não …)

Durante sua vida, um vinho harmoniza suas características: os taninos suavizam, a acidez se equilibra, a bebida ganha corpo e desenvolve o seu “bouquet”.

Um dos melhores marcadores para avaliar a idade de um vinho é sua cor na taça, principalmente a suave variação da coloração na borda de contato. Deve ser observada num ambiente claro, contra um fundo branco, inclinando-se levemente a taça.

Nos brancos, vamos encontrara variações entre o quase incolor, para um vinho jovem, até um dourado, indicando um vinho já bem maduro. Para os tintos, a escala começa no violeta, rubi, passa por um marrom avermelhado, terminando numa cor de tijolo, indicativo que o vinho passou de seu tempo.

Degustar um vinho no seu ponto ideal é uma experiência inesquecível. Comprar um vinho, deixá-lo envelhecendo na sua adega e acertar o momento de prová-lo, não tem preço.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura:  Ion Ceban – @ionelceban no Pexels

A importância dos rótulos – de volta ao básico

Compreender a importância dos rótulos é algo muito fácil: basta imaginar como a nossa vida seria difícil sem eles!

Segundo consta nos livros sobre a história dos vinhos, teriam sido os egípcios os primeiros a marcar suas ânforas com dados sobre o que estariam nelas: o ano de produção, o local de origem, o nome do produtor e o tipo do vinho. Tudo gravado na cerâmica, ainda fresca ou em processo de secagem.

Era um produto muito apreciado. Na tumba do Rei Tut (Tutancamon) foram encontradas cerca de 30 ânforas de diferentes vinhos, para que ele pudesse desfrutá-los na eternidade.

Há um longo caminho desde o Egito dos tempos de Faraós e pirâmides até os modernos rótulos impressos que decoram as garrafas de hoje.

Cada país produtor tem suas regras para a rotulagem dos vinhos. Algumas informações são comuns, quase obrigatórias, por exemplo, graduação alcoólica, origem, nome do produtor. Outros dados podem aparecer no contrarrótulo, como os selos de regiões controladas, importadores e demais minúcias burocráticas.

As grandes vinícolas se esmeram em rótulos muito elaborados, com grandes nomes do design por trás de cada um, afinal, este primeiro contato visual é que vai estimular a nossa curiosidade e, eventualmente, comprar a garrafa.

Seguindo por este caminho, estaríamos fazendo uma compra por puro impulso, nada sabendo sobre o conteúdo. Talvez uma pequena pista sugerida pelo formato e cor do vasilhame, e só.

Fica clara a função do rótulo: informar!

A primeira coisa que devemos buscar é o ano de produção, a safra, que deve estar bem destacada. Algumas vezes o autor do rótulo prefere mover esta importante informação para o contrarrótulo, mas ela deve estar sempre presente. Existem vinhos não safrados, os mais comuns deles são os espumantes. Alguns vinhos de corte também podem não apresentar esta data, mas deve haver alguma indicação clara sobe isto. Geralmente são obtidos por “blends” de duas ou mais safras.

A segunda informação é a origem do vinho, principalmente se vier de alguma região de origem controlada ou indicação geográfica. Significa que seguiu normas de produção mais restritas o que, indiretamente, implica numa melhor qualidade e preço mais alto. Mas não é uma garantia.

O terceiro ponto a se buscar no rótulo é o nome do produtor. Alguns se tornaram maiores que seus produtos e, esta menção, pode ser mais destacada que o próprio nome do vinho. Há um eficiente marketing numa decisão destas: muitos apreciadores preferem comprar um Antinori, um Chapoutier, um Rolland…

Por fim, o rótulo deve apresentar a composição do vinho, seja ele um varietal ou um corte, e o teor alcoólico. Infelizmente, as múltiplas regras em vigor nem sempre impõem estas dados. Muito comum em vinhos chamados “de entrada” que conste apenas, no rótulo traseiro, algo como “uvas viníferas europeias”.

Existem complicadores nestas regrinhas básicas. Os mais famosos são os rótulos de origem francesas. Em vez de enfatizarem as castas utilizadas, destacam a região. Além disto, os nomes de cada vinho podem estar associados ao das vinícolas. Os vinhos de Bordeaux são denominados pelos “Chateaux” (há exceções). Já os da Borgonha são mais conhecidos por seus “Domaine” (idem).

O comprador precisa ter alguma cultura para saber que um Sancerre é um Sauvignon Blanc e um Chablis é um Chardonnay. Mas isto já é quase uma lugar comum e acaba virando motivo de bons papos quando se descobre algum inocente neste assunto.

Rótulos também podem se transformar em obras de arte. O famoso Chateau Mouton Rothschild contrata um artista internacional para desenhar sua etiquetas a cada safra. O do milênio se tornou um dos mais conhecidos.

Notem que mesmo num projeto de concepção artística, tudo o que importa está ali: a safra (2000), o nome/local do vinho (Bordeaux) e a região demarcada (AOC Pauillac).

Saúde e bons vinhos!

Créditos:

Foto de abertura obtida do site Wine and Cork no Pinterest

Foto da garrafa obtida no site da vinícola, onde existe uma coleção de todos os seus rótulos: Chateau Mouton Rothschield

Fugindo da mesmice

Estamos vivendo tempos estranhos, mesmo desde antes da pandemia. Há uma grande radicalização que abrange todas as facetas da sociedade moderna. São muitos os exemplos, algo como “ou você é isto ou é aquilo”. Ninguém se lembra mais do purgatório, agora, é céu ou inferno e ponto.

Tudo e todos recebem rótulos que, em tese, refletem nossas opiniões individuais, baseados na mais conhecida das pseudociências, a “Achologia”, amplamente difundida nas denominadas “redes sociais”.

Neste mundo “fake” onde só existe o preto e o branco, a esquerda e a direita etc., repleto de gente que consegue seus 15 minutos de fama, preconizados por Warhol lá em 1968, ninguém se lembra mais do “inconformismo”, uma atitude que explica o comportamento de determinados indivíduos ou grupos que estão cansados do “status quo”, da mesmice, simplesmente.

Exemplos não faltam, sejam nas artes plásticas, na música, na filosofia, na culinária e em muitas outras coisas. Dois eventos marcaram a memória de muitos: o movimento hippie e o festival de Woodstock. Foram taxados de tudo, podem escolher os mais pesados adjetivos. Poucos se deram conta do real motivo: a necessidade de efetuar algumas mudanças ou, para ser mais realista, permitir que elas acontecessem…

“Let the sun shine”, deixe o sol brilhar era o mote na Califórnia. “Lucy in the Sky with Diamonds”, cantariam os Beatles, no que os críticos afirmavam ser uma apologia a um alucinógeno.

Não importa. Os inconformistas continuam no nosso meio e devemos a eles uma grande quantidade de novidades que, atualmente, já estão entranhadas no nosso tecido social.

E se vocês acham que não conhecem nenhum tipo como este, permitam me apresentar: eu sou um deles, no mundo dos vinhos.

Por que beber Cabernet se posso provar um Mencia. Que tal trocar Chardonnay e Sauvignon Blanc por Verdejo ou Arinto?

Ah! Vocês não conhecem ou nunca ouviram falar de outras uvas que não as “nobres” …

Seguem as opções: vinhos rosé, laranja, naturais/orgânicos, frisantes, Pet-Nat, enfim, poderíamos listar mais sugestões.

A verdade é que somos inclementemente bombardeados por campanhas publicitárias que nos deixam cheios de dúvidas sobre o que degustar. Se colocarmos na ponta do lápis, todos são “os melhores”.

Meu pai adorava contar uma anedota, baseada em fatos, sobre um velho pelicano que seguia com seu dever de alimentar os filhotes: na falta de um bom alimento, arrancava parte de suas entranhas e lhes dava o que comer (sei vero). Um dia, já sem forças para voar e com pouquíssimas chances de encontrar algo melhor, repete o trágico ritual. Uma vozinha do ninho se manifesta: “tripa todo dia também não!”

A ideia de escrever este texto veio de um pequeno comentário no último almoço de uma das confrarias a que pertenço. O restaurante era calcado em coisas do mar e as minhas opções de vinho estavam um pouco fora deste contexto. Lembrei de uma garrafa que havia comprado numa inesperada oferta de uma das melhores lojas deste ramo.

Era um Vermentino elaborado por Michel Chapoutier. Uma casta italiana nas mãos de produtor francês. As garrafas estavam meio escondidas, num canto da loja e só as descobri quando resolvi passear pelas prateleiras em busca de vinhos fora do lugar comum. Quando perguntei o preço fiquei surpreso, era ridículo. Levei as garrafas que estavam no estoque.

No nosso almoço, todos elogiaram o vinho. A safra era 2015 e a tampa de rosca. Estava ótimo, aos 7 anos de idade, que para um branco é uma eternidade.

Honestamente, algum leitor arriscaria uma compra semelhante?

Esta é a vantagem de ser um “inconformista”. Somei a reputação da loja, muitas vezes considerada como a melhor do país, o talento do vinhateiro, o inusitado de encontrar um Vermentino francês e um preço “imperdível”.

Como esta, tenho em minha adega outras garrafas fora do que se conhece como “main stream”. Cada uma é a certeza de que terei uma ótima experiência para dividir com os amigos.

Que tal saírem da mesmice?

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura por Tormius para Unsplash

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