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Mais uma coluna da série “Como funciona”…

Acreditem: um Chardonnay brasileiro, do Vale dos Vinhedos, ficou em 4º lugar na 22ª edição (2015) do prestigiado concurso “Chardonnay du Monde”, uma competição entre os melhores Chardonnay do mundo. Além deste, outros 5 vinhos ficaram muito bem classificados. Totalizamos três medalhas de ouro e outras três de prata. Nada mal.
 
Antes de sair em louca corrida atrás destes vinhos, vamos analisar um pouco mais os fatos, o que não traz nenhum demérito ao bom vinho nacional, mas precisamos conhecer um pouco mais sobre como é realizado este julgamento, quais são os participantes e sua relevância no cenário vinícola.
 
A versão de 2015 foi realizada na Borgonha, no Château des Ravatys, a propriedade vinícola do Instituto Pasteur em Saint-Lager. O corpo de jurados foi composto por 300 membros dos quais 150 eram franceses. Participaram da competição 794 amostras oriundas de 41 países. Impressionante.
 
Eis os 10 melhores classificados (devido às pontuações idênticas estão relacionados 13 vinhos):
 

Esta é a hora do “não entendi”, afinal de contas o primeiro lugar coube a um vinho sul-africano, seguido de um australiano, um suíço e o brasileiro. O primeiro vinho francês a aparecer está na quinta posição, e é um Champagne. 

 
Pode?
 
Onde estão os famosos Chablis, Meursault, Puligny-Montrachet, entre outras delicias de lá. E os famosos vinhos da Califórnia que impuseram uma importante derrota aos franceses no famoso Julgamento de Paris. Nenhum chileno ou argentino que já adquiriram status de grandes Chardonnay.
 
Alguma coisa está fora de lugar!
 
Vamos explicar como funcionam estes concursos.
 
O primeiro ponto a ser considerado envolve as grandes vinícolas: excetuando-se ocasiões muito especiais, nenhum dos consagrados grandes vinhos do mundo vai submeter amostras para um concurso.
 
Não precisam mais, já conseguiram seu destaque neste competitivo mundo dos vinhos e a grande preocupação é manter-se lá em cima. Para isto, contam com a opinião de críticos como Parker, Robinson ou Johnson e a boa aceitação no mercado.
 
Este fato não invalida nenhum concurso, o que nos leva ao segundo ponto de nossa explicação: eles são muito importantes para os produtores que ainda não ficaram conhecidos. Muitos deles, como no caso da brasileira Valduga, precisam conquistar a confiança de compradores internacionais. Qualidade não lhes falta. Fazer bonito num concurso como este é uma grande vitória.
 
Vamos conhecer os participantes do Brasil e seus prêmios:
 
4ª lugar: Casa Valduga Leopoldina Gran Chardonnay – D.O. Vale dos Vinhedos – 2013
 
Medalha de Ouro:
 
Aurora Reserva Chardonnay – 2014
 
Cerro da Cruz Chardonnay – 2012
 
Medalha de Prata:
 
Aurora Pinto Bandeira Chardonnay – 2012
 
Santa Colina Estilo Chardonnay – 2013
 
Aurora Varietal Chardonnay – 2014
 
275 vinhos de trinta e cinco países receberam medalhas, o que valoriza o resultado obtido por nossas vinícolas. Destacam-se:
 
França com 30 medalhas de ouro, 103 de prata e 8 de bronze;
 
Itália com 4 de ouro e 5 de prata;
 
África do Sul com 2 de ouro e 13 de prata;
 
Chile com 3 ouro, 4 de prata e 1 de bronze.
 
A relação completa está aqui:
 
 
DICA DA SEMANA: só podia ser este.
 
Casa Valduga Leopoldina Gran Chardonnay – 2013
Apresenta coloração amarelo palha com reflexos dourados, límpido e brilhante. A passagem por barricas francesas e romenas proporciona complexidade aromática com notas de baunilha e chocolate branco, aliados aos aromas de abacaxi e pêssego em calda. No palato é untuoso, de acidez moderada, com retrogosto marcante.
Harmonização: Massas, carnes brancas, fondues, queijos médios e fortes.
Outras premiações: Melhor Vinho Branco do Brasil de 2014 (safra 2012): Revista Adega; Melhor Nacional de 2013 (safra 2012): Revista Gosto; Medalha de Ouro (safra 2008) Challenge International du Vin; Gran Menzione (safra 2008): 17º Concurso Enológico Internacional (Vinitaly 2009); Medalha de Prata (safra 2008) 16ª edição do Concurso Chardonnay du Monde.

Hoje, 17/04, é o Dia do Malbec!

Foi nesta data em 1853, que o Presidente da Argentina, Domingo Faustino Sarmiento, encarregou o agrônomo francês Michel Aimé Pouget com a tarefa de trazer uvas da França e aclimatá-las em solo argentino. Era o início da indústria vinícola no país. Entre as espécies estava a Cot, que já existia no vizinho Chile desde 1840.
 
Mas esta história começa muito atrás no tempo, antes mesmo dos vinhos de Bordeaux se tornarem famosos. Na idade média, o principal vinho exportado, principalmente para a Inglaterra, era conhecido como “vinho negro”, elaborado na região de Cahors, sudoeste de França, com uma pequena uva denominada Cot. Esta era a época dos Cavaleiros Templários, que inspirou autores como Alexandre Dumas e seus Três Mosqueteiros: Porthos, Athos e Aramis bebiam este vinho!
 
Esta mesma casta também era plantada em Bordeaux, sendo uma das 6 uvas do corte original que, junto com a Carménère, acabou esquecida por produzir vinhos muito ásperos, duros, a ponto de ganhar o apelido de “Mal Bouche” (boca ruim). Levada para o Chile, foi rebatizada como Malbec, talvez uma corruptela do pejorativo apelido francês.
 
Embora 1853 seja o ano creditado como o que a Malbec chegou à Argentina vinda do Chile pelas mãos de Pouget, já existiam algumas experiências de cultivo de uvas bordalesas, entre elas uma denominada “uva francesa” que seria a mesma Malbec. Curiosamente, para os agricultores daquela época esta cepa parecia nativa, tal a perfeição de sua adaptação ao solo desértico da região de Mendoza.
 
Muita coisa aconteceu desde então até o Malbec ser a força que é hoje. Existe uma tipicidade única neste varietal argentino que o faz um dos vinhos mais importantes do cenário da vitivinícola internacional. Alguns autores chegam a comparar a região de Mendoza com suas contrapartes francesas: Bordeaux e Borgonha, principalmente pela qualidade e originalidade do que é produzido.
 
Apesar de não ser uma casta exclusiva, hoje está plantada na Califórnia; África do Sul; Chile; França e Brasil, foi no país vizinho que ela alcançou os melhores resultados, a tal ponto que muitos enólogos de última geração ainda não sabem qual o potencial máximo desta cepa, seja como varietal, seja num dos belíssimos cortes produzidos por lá.
 
A Malbec percorreu um longo caminho até hoje e seu incontestável sucesso se deve a várias pessoas que começam pela dupla Nicolas Catena e Paul Hobbs, sem dúvida os pioneiros do moderno vinho elaborado com esta uva.
 
Outros importantes especialistas estrangeiros têm influenciado, positivamente, os rumos do vinho argentino: Michel Roland, Roberto Cipresso e Alberto Antonini. Suas ideias e interpretações das possibilidades desta cepa formaram gerações de excelentes enólogos argentinos que já se destacam no cenário internacional: Roberto de la Mota (Mendel), Alejandro Vigil (Catena), Pepe Galante (Salentein), Daniel Py (Trapiche), Marcelo Pelleriti (Monteviejo), Mariano di Paola (Rutini), Walter Bressia (Bressia), Jorge Riccitelli (Norton), Sebastián Zuccardi (Zuccardi), Alejandro Sejanovich (Manos Negras e Tinto Negro), Matías Riccitelli (Fabre Montmayou e sua própria vinícola), David Bonomi (Norton), Edy del Popolo (Per Se) e os irmãos Michelini (Zorzal e Passionate).
 
Há muito que celebrar. Além de Mendoza, outras regiões se destacam como a Patagônia e Salta, além de novas experiências que estão sendo realizadas, com muito sucesso, em Neuquen (Familia Schroeder), La Rioja (Collovati) e La Pampa (Bodega Del Desierto), esta conduzida por ninguém menos que Hobbs.
 
Parabéns!
 
Dica da Semana:  são 3 vinhos, um para cada bolso. Não deixem de comemorar com um deles.
 
Alamos Malbec
Sem dúvida um dos melhores achados em vinhos de extraordinária relação qualidade x preço, o Alamos Malbec é uma verdadeira unanimidade.
Ele tem um estilo elegante e sofisticado, bem francês para Jancis Robinson, é sempre um Best Value para a Wine Spectator e é considerado um excellent value por Parker, que o descreve como expressivo, fresco, com adorável amplitude, textura sedosa e um final de boca estruturado e cheio de taninos.
Harmoniza com carnes vermelhas, churrasco, hamburger, massas.

Pulenta Estate Malbec
Excelente Malbec da renomada vinícola Argentina Pulenta Estate. Aromas concentrados de frutas vermelhas com belíssimas notas de baunilha.
Na boca, frutas negras como mirtillo, ameixa e amoras silvestres. Final de boca intenso e persistente.
Harmoniza com Picanha invertida recheada com linguiça.

 

Cobos Malbec 2009
De cor bordô profunda e intensa, exala aromas de groselha e frutas vermelhas maduras.
Estruturado e volumoso, com taninos muito redondos e elegância na boca.
Harmoniza com espaguete a bolonhesa, pizza marguerita e pratos à base de molhos vermelhos.
Recebeu 96 pontos de Parker

Onde você se encaixa?

Quando falamos de vinhos sempre aparece alguma forma de classificação. A primeira e mais intuitiva é mencionar a cor: tinto, branco ou rosé. Outras classes podem ser menos intuitivas, como Velho x Novo Mundo, ou vinhos de cada país produtor e mais uma interminável série que inclui até mesmo o “gosto ou não gosto”, que seria, provavelmente, o primeiro ponto de cruzamento de informações entre apreciadores e sua bebida predileta.
 
O próximo passo é começar a classificar os enófilos. Não são tantas as possibilidades, mas uma delas faz uma interessante divisão: os que apreciam um bom vinho pelo prazer que isto proporciona e os que degustam o vinho em busca de uma “experiência” única. São dois patamares bem distantes um do outro apesar de uma superposição inevitável, em ambos os casos há a busca pela satisfação.
 
As diferenças começam na compra dos vinhos. No primeiro caso, não há uma preocupação com rótulos, no sentido mais objetivo da palavra. A meta é encontrar uma boa relação custo x benefício. A graça toda está em descobrir algo delicioso e quase desconhecido. Os que se enquadram neste grupo são considerados como aventureiros, desbravadores, que nem sempre encontram o pote de ouro no final do arco íris. Mas a “busca” sempre vale a pena, algo como fazer o Caminho de Santiago de Compostela.
 
O segundo grupo pode ser chamado dos que “escolhem com sabedoria”. O principal objetivo é degustar aquela garrafa icônica, rara e cara. Para isto dar certo é preciso que o lastro financeiro seja grande, pois pode sair muito caro. A compra destes vinhos é feita de maneira bem diversa da forma como o outro grupo opera. 
 
Estamos falando de leilões, visitas às grandes vinícolas do mundo e até mesmo em compras consorciadas. Para tudo dar certo, um bom conhecimento do terreno onde se vai caminhar é muito importante e um trabalho de pesquisa e informação deve ser elaborado com muita atenção antes da compra final. É nesta área que proliferam as mais diversas falsificações que vão desde um rótulo famoso retirado de uma garrafa original e colado num vinho qualquer até elaboradas preparações com um envelhecimento artificial de envases, rótulos e rolhas capazes de ludibriar o melhor dos especialistas.
 
Uma das bíblias de cabeceira dos enófilos deste grupo é um interessante guia de bolso organizado por Hugh Johnson, o mais popular crítico e autor inglês sobre vinhos, com diversos livros publicados em todo o mundo. Este guia, atualizado anualmente, tem como objetivo principal informar ao leitor quando um vinho está pronto para ser degustado. Em segundo plano, informa o quanto ele agradou ao autor através de um simples sistemas de “*”, com um máximo de 4.
 
 
O livro é organizado por países produtores e dentro de cada divisão, estão as sub-regiões, os produtores e os vinhos, separados por safras. Na edição de 2015 são contemplados cerca de 6.000 vinhos. Uma série de informações acompanham as avaliações o que transforma este livrinho numa relevante fonte de consulta. Vale a pena manusear o compêndio e apreciar como ele se utiliza das safras, muito desmitificadas em uma de nossas colunas semanais. Aqui o bom uso desta informação é a alma do negócio.
 
Numa recente comemoração, o amigo M.A.R. nos convidou para um jantar acompanhado de dois excelentes vinhos, escolhidos criteriosamente no guia de Hugh Johnson, com as 4 estrelinhas na cor vermelha, símbolo de que o vinho foi particularmente apreciado pelo autor.
 
O branco foi o Dönnhoff Felsenberg 2010, um Riesling alemão da região do Nahe classificado como um “fora de série”.
 
O tinto selecionado foi o Montille Volnay Les Champans 2006, um maravilhoso Pinot da Borgonha da região de Cote d’Or, que não ficou devendo nada ao 1º vinho. Uma experiência quase transcendental, emoldurada pela excelente cozinha de um dos bons restaurantes cariocas.
 
 
Vinhos escolhidos com sabedoria e conhecimento e degustados com um máximo de prazer.
 
Onde vocês se encaixam?
 
Dica da Semana:  para não deixar ninguém com água na boca. Embora seja 1 ano mais novo, recebeu o mesmo OK! de Hugh Johnson.
 
Hermann Dönnhoff Riesling Fruchtige QbA 2011
 
Palha cristalino de média intensidade.
O nariz mostra sensuais notas de cítricos confitados e mel emergindo de uma afirmativa base mineral.
Em boca mostra um delicioso balanço entre os açúcares residuais e a gulosa acidez.
Camarões ao molho cremoso de curry e gengibre; Peixes de rio grelhados, servidos com gratin de batatas; Sashimi de salmão defumado.
 

Páscoa significa chocolate!

Uma das mais complexas harmonizações no mundo do vinho. Tradicionalmente o Vinho do Porto é o mais recomendado, mas não é a única opção. Vamos conhecer algumas regrinhas para aproveitar as duas delícias desta época, vinhos e chocolate.
 
1 – A regra básica desta harmonização é equiparar a doçura do vinho com a do chocolate. Um truque muito simples pode ajudar na escolha de um ou outro:
 
– faça uma provinha; se achar que o vinho ficou amargo significa que ele é menos doce do deveria ser.
 
2 – escolha produtos de qualidade. Existem 3 tipos básicos: branco, ao leite e amargo. Cada um exigirá um vinho diferente. Esqueça os chocolates comuns preferindo os de procedência conhecida que declarem o teor de cacau em sua composição.
 
3 – a outra regra importante relaciona o teor de cacau com o corpo do vinho: quanto mais escuro o chocolate, mais encorpado o vinho. Prefira os tintos com taninos muito redondos e suaves. Esta sensação de maciez ajuda na harmonização.
 
4 – vinhos brancos podem ser usados eventualmente, principalmente com misturas que combinem dois ou mais tipos de chocolate além de frutas, nozes, etc. Procure por vinhos frutados e intensos.
 
 
Uma ideia saborosa e divertida é organizar uma degustação com tipos variados.
 
Comece pelos chocolates brancos seguindo até os mais escuros. Os vinhos serão servidos nesta mesma lógica: do mais leve até o mais encorpado.
 
As sugestões a seguir são pontos de partida bem seguros, para começar. O segredo é experimentar muito, sem medo de errar.
 
Chocolates brancos: Jerez; vinhos tipo Moscatel; Chardonnay frutado; Moscato D’Asti. Para os mais corajosos, uma boa pedida pode ser um tinto mais tânico – vai ajudar a compensar o gordura deste tipo de chocolate.
 
Chocolate ao leite: um tinto mais robusto é o ideal. Experimente com Cabernet Sauvignon, Zinfandel ou Pinot Noir. Um bom Chianti pode dar certo com chocolates que contenham 65% de cacau, pelo menos.
 
Chocolates amargos (70% a 100%): este é o preferido dos especialistas e o vinho não pode ficar atrás. Boas indicações incluem vinhos de Bordeaux, Beaujolais Cru, Syrah ou Shiraz, Vinho do Porto, Malbec e Zinfandel 1ª linha.
 
Espumantes e outros vinhos fortificados costumam harmonizar com vários tipos de chocolates, não deixe de experimentar uma destas combinações.
 
Boa Páscoa!
 
Dica da Semana:  um excelente Malbec para harmonizar com carnes e com chocolate 100% de cacau.
 
Luca Malbec 2012
 
Elaborado pela talentosa Laura Catena, este Malbec poderoso e cheio de personalidade é sem dúvida um dos grandes vinhos da Argentina.
Mostra muita classe, elegância e fantástica pureza, tendo recebido nada menos do que 92 pontos de Robert Parker, premiado com 93 pontos pela Wine Spectator na safra 2012 e escolhido como um dos “100 Melhores Vinhos do Mundo em 2014”.
Um vinho profundo e com muita alma, que enche a boca com camadas e mais camadas de fruta madura e finos taninos.

O melhor, o mais antigo, o mais mais e etc…

Algumas das últimas colunas provocaram uma saudável relação de perguntas dos leitores, todas respondidas por e-mail. Mas ficamos sempre com impressão que faltou alguma explicação. Ter dúvidas sobre determinados temas não só é absolutamente normal como desejável. Entretanto, algumas questões propostas são de difícil resposta, por exemplo, quando recebemos indagações deste calibre:
 
Há algum vinho de corte que esteja colocado entre os melhores do mundo?
 
Qual o vinho de safra mais antiga que você conhece que certamente pode ser consumido ainda com qualidade?
 
Com quantos anos podemos considerar um vinho impossível de beber?
 
A esta relação poderíamos acrescentar sem nenhum problema as eternas questões como “Qual o Melhor?” ou “Qual o mais caro?” e outras no gênero.
 
Para sermos completamente corretos, nenhuma destas perguntas tem uma única resposta. Pior, as diversas opiniões sobre cada uma podem ser até mesmo conflitantes.
 
Existe uma razão: nenhum vinho é igual a outro, nem dentro de uma mesma vinícola. A cada nova colheita as uvas terão diferentes níveis de açúcar o que vai implicar, no mínimo, em quantidades de levedura e/ou tempo de fermentação e maceração diferentes. Só isso já define vinhos de características distintas, embora oriundos do mesmo vinhedo.
 
Produzir um vinho não é um ato mecânico e repetitivo, como fabricar uma peça de metal ou plástico, aos milhares, numa máquina especialmente projetada para tal. Na enologia, cada partida de uvas é um caso único e deve ser tratado desta forma, não pode haver padronização. Nem nos vinhos de entrada que são produzidos em grandes volumes para atender à demanda das principais redes de mercados. Um mínimo de cuidados específicos é necessário, caso contrário o produto final não será aceito por ninguém.
 
Com isto em mente, imaginem como é difícil responder a uma questão como “Qual o melhor Cabernet?”.
 
Se colocarmos esta dúvida dentro de uma vinícola, o enólogo é capaz de responder que o seu melhor vinho é este ou aquele, respeitada uma condição como faixa de preço ou volume produzido. Mesmo assim entra nesta equação um fator muito subjetivo: o gosto pessoal dele. O nosso pode ser outro…
 
Caso mudemos a escala e tentarmos entender qual o melhor vinho de um país produtor, por exemplo, “Qual o melhor Cabernet do Chile?”, dificilmente vamos obter uma resposta objetiva.
 
Teríamos primeiro que selecionar, com todas as dificuldades mencionadas no parágrafo acima, quais os melhores de cada sub-região: Maipu, Puente Alto, Vale Central, etc. (e isto envolve todas as vinícolas). Depois, decidir qual o melhor entre estas escolhas.
 
Mas quais os critérios que vamos adotar para fazer esta seleção?
 
A palavra de cada enólogo?
 
As notas dos grandes críticos?
 
O nosso gosto pessoal?
 
Todas as acima?
 
Tarefa hercúlea!
 
Imaginem tentar saber qual o melhor do mundo…
 
Só mais uma lembrança: para muitos enófilos já é difícil determinar qual é o melhor vinho de sua adega!
 
 
Quando se trata de saber qual o mais antigo vinho ainda em condições de ser consumido, o nível de complicações se multiplica exponencialmente. Para respondermos esta pergunta, com alguma objetividade, teríamos que conhecer todas as adegas do planeta e ter o seu conteúdo devidamente catalogado. Mas há uma curiosa pegadinha: no momento que identificarmos este vinho e o abrimos, ele automaticamente deixa de ser “o mais antigo”…
 
Honestamente, nem as grande vinícolas sabem o quê ainda tem em estoque e se aquelas raridades são viáveis para consumo. Uma simples destampada de um barril ou garrafa para tirar uma amostra pode ser o fim de todo o resto.
 
Um exemplo bem atual vem de Portugal. Em 2008, um dos enólogos da Taylor’s localizou, na vila de Prezegueda, duas barricas de vinho do Porto produzido antes da Filoxera, com mais de 150 anos, pertencentes a uma família de vinhateiros. Um tesouro passado de geração para geração.
 
Em 2009 o último descendente decidiu vendê-las. Levadas para as caves de Vila Nova de Gaia, o vinho se mostrou em perfeitas condições e simplesmente maravilhoso. A Taylor’s optou por comercializá-lo com o nome de Scion: poucas garrafas e um custo perto do absurdo. (não existe mais nenhuma à venda…)
 
 
Este fato gerou um verdadeiro frenesi entre os outros produtores e uma busca insana por estas raridades foi iniciada. Vinhos do Porto ou Madeira com mais de 100 anos estão na moda. O que mais vão encontrar?
 
Dois outros vinhos, muito antigos, ficaram mundialmente conhecidos por fatores “extracampo”. O primeiro foi um lote de míticas garrafas de Chateau Lafite 1787, que teriam pertencido ao Presidente Thomas Jefferson, e que estariam, ainda, em perfeitas condições de consumo.
 
Um grupo de quatro delas foi leiloado em 2008, pela respeitada casa Christie, e arrematado por cerca de US$ 500,000.00 (quinhentos mil dólares). Mais tarde descobriram que era uma falsificação o que gerou um longo e milionário processo, investigações policiais altamente sofisticadas, culminando com a prisão e desmascaramento do hábil falsificador, além de artigos, livros e provavelmente um filme.
 
Outra raridade conhecida é uma garrafa de Chateau d’Yquem, o mais famoso dos Sauternes, datada de 1811 e arrematada em 2011 por astronômicos 120.000 dólares, provavelmente o mais caro vinho até então. Não será aberto, apenas ficará exposto em uma vitrine no restaurante de seu proprietário em Honk Kong.
 
 
Mitos à parte, nem mesmo uma simples reposta sobre o mais caro vinho pode ser respondida sem ressalvas: quando, onde, como?
 
Um dos sites mais utilizados por quem vive o mundo do vinho é o Wine Searcher (http://www.wine-searcher.com/), em inglês, que localiza vinhos nos mais importantes mercados. As lojas especializadas, vinícolas e casas de leilão se encarregam de fornecer as informações. É gigantesco! Uma pesquisa pode gerar diversas páginas de resultados, muitas vezes cansativos de ler. Mas nelas é que podemos descobrir algum tesouro enterrado. Periodicamente publicam pesquisas bem objetivas, curtas e muito interessantes.
 
Uma delas, que vamos reproduzir a seguir, procurou por vinhos que receberam, em qualquer época, as notas máximas atribuídas pelos seguintes críticos ou publicações: Jancis Robinson, Robert Parker, Jamie Good, Stephen Tanzer, Jeannie Cho Lee, Michel Bettane e as revistas Wine Spectator, Cellar Tracker, Falstaff (Áustria) e Revue du Vin de France. Um time de muito respeito.
 
Foi calculada uma média simples de todas as notas, por vinho, e elaborada a lista apenas com aqueles que conquistaram, neste resultado final, 99 ou 100 pontos. Somente 7 (sete) vinhos passaram nesta peneira.
 
Seriam eles os maiores de todos os tempos?
 
1 – Château d’Yquem, 1811
Um Sauternes elaborado a partir de uvas botritizadas. Talvez o mais famoso vinho doce do mundo.
 
2 – E. Guigal Côte Rôtie La Mouline, Rhône, 1978
Um vinho da região mais premiada com 100 pontos Parker, o vale do rio Ródano. Um corte da tinta Syrah com a branca Viognier.
 
3 – Château Lafleur, Pomerol, 1950 (Bordeaux)
Corte Bordalês, margem direita, predominância de Merlot.
 
4 – Paul Jaboulet Ainé Hermitage La Chapelle, Rhône, 1961
Um varietal, 100% Syrah, com as parreiras plantadas como se fossem arbustos (Globet). Região do rio Ródano, novamente.
 
5 – Quinta do Noval Nacional Vintage Port, 1963
Vinho do Porto.
 
6 – Krug Clos du Mesnil Blanc de Blancs Brut, Champagne, 1979
Quem não aprecia um bom Champagne?
 
7 – Domaine Jean-Louis Chave Ermitage Cuvée Cathelin, Rhône, 2003
Outro vinho do Ródano e novamente 100% Syrah. Notem a safra.
 
Analisar esta lista em profundidade nos forneceria assunto para várias semanas. Faríamos novos amigos e certamente ganharíamos outros inimigos: nunca haverá uma unanimidade sobre este resultado.
 
Chamamos a atenção para alguns detalhes:
 
– A França domina a lista com 6 vinhos. A exceção é um vinho de Portugal;
 
– 5 tintos e 2 brancos: um doce e o outro espumante;
 
– um único Bordeaux… (baseado em Merlot)
 
– 3 vinhos da região do Rhone, todos com Syrah, que nem mesmo entra numa relação de castas nobres…
 
– entre os tintos, 3 (três) vinhos de corte e 2 (dois) varietais.
 
Resumindo tudo isto numa única frase:
 
“Não existem verdades absolutas no mundo do vinho”.
 
Entenderam como funciona?
 
Dica da Semana:  em homenagem aos vinhos de Portugal que ontem, hoje e sempre estão entre os melhores.
 
Vadio Bairrada DOC Tinto 2007
Seguindo na linha desta semana, este vinho é um varietal, coisa rara entre os tintos portugueses, elaborado com a casta Baga (100%). Proveniente da Bairrada, ótima região produtora ainda sem o reconhecimento como o Douro ou o Alentejo.
Um vinho potente, estruturado, com taninos marcantes a altamente gastronômico.
Imperdível!
 
 
 
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