A história do Chianti começa lá no século XIII, como um vinho branco! Percorreu um longo e atribulado caminho até se tornar o vinho da Toscana mais conhecido internacionalmente. As principais mudanças passaram por alterações nas regiões demarcadas e no tipo de vinho que muda para tinto. Não podemos esquecer que estamos na Itália, obviamente, apaixonadas disputas políticas entre as cidades de Florença e Siena sublinharam isto tudo.
Na idade média, as províncias de Gaiole, Castellina e Radda, fundaram a “Liga do Chianti”, demarcando uma área de produção considerada, até os dias de hoje, como o coração da produção deste vinho. Com a crescente popularização, outras comunas começam a fazer pressão para que seus vinhos também pudessem ser rotulados como Chianti, gerando, durante alguns séculos, uma expansão sem muito controle e a consequente vulgarização do produto: qualquer coisa em uma garrafa de palha era vendida como Chianti…
A composição do vinho também passou por mudanças importantes passando, gradualmente, de brancos para tintos. Coube ao Barão Bettino Ricasoli (ilustração a seguir), em 1782, estabelecer uma “receita” para a elaboração: recomendava um corte de 70% Sangiovese, 15% Canaiolo e 15% Malvasia branca. Este corte, considerado clássico, foi endossado pelo governo em 1967 quando regulamentou a DOC Chianti, impondo a “Fórmula Ricasoli”, um blend com as uvas Sangiovese (até 90%) e Malvasia e Trebbiano (de 10% a 30%).
Mas esta aventura não termina aqui. Alguns produtores iniciaram um movimento para modificar a “fórmula”. Dois caminhos foram trilhados: a produção de vinhos com 100% de Sangiovese; a introdução das chamadas castas nobres no corte. Como estes vinhos não podiam ser classificados, pela lei, como Chianti, passariam a ser vendidos como “Vino da Tavola (vinho de mesa)” ou IGT. São vinhos simplesmente maravilhosos e tinham um preço de venda muitas vezes superior aos DOC, criando um paradoxo. Estes “super-Chiantis” se tornariam conhecidos como Super-Toscanos (anos 80). O sucesso foi enorme e acabou por dobrar as rígidas regras: alguns destes excepcionais vinhos já podem ser rotulados como Chianti.
Atualmente são consideradas duas regiões produtoras, a do Chianti Clássico DOCG e as demais que rotulam apenas como Chianti. O mapa a seguir é autoexplicativo.
Para serem enquadrados na DOCG Chianti Clássico, os vinhos devem ter em sua composição pelo menos 80% da Sangiovese e 20% de outras varietais. A partir de 2006, não são mais permitidas uvas brancas no corte. Para os Reserva, são exigidos 24 meses de amadurecimento em carvalho e 3 meses em garrafa.
Nas demais regiões, a regra é mais flexível: mínimo de 75 a 90% de Sangiovese, 5 a 10% de Canaiolo Nero, 5 a10% de Trebbiano Toscano, Malvasia Branca e até 10% de outras varietais.
Curiosidades
O nome deriva da pequena cadeia de montanhas que se distribui entre Florença e Siena. Durante a ocupação pelos Etruscos, a região era conhecida como “Clante” ou “Clanis” o que pode ter evoluído para a atual denominação.
Há um nítido paralelo entre este vinho e os de Bordeaux e isto teria influenciado a fórmula Ricasoli. A Sangiovese, muito aromática, tem os seus taninos suavizados pelo frutado proporcionado pela Canaiolo da mesma forma que a Cabernet Sauvignon é suavizada pelo corte com a Merlot. Alguns críticos consideram o Chianti como o Bordeaux italiano.
Desde 1980 foi criado o “Consorzio Chianti Classico” com o objetivo de aprimorar a qualidade do vinho, aumentar sua divulgação e impedir fraudes. Os produtores associados, todos da região do Chianti Clássico, colocam em seus rótulos a imagem do Galo Nero, que simbolizou a paz entre as cidades de Florença e Siena após anos de disputadas batalhas para delimitar fronteiras. A disputa final seria entre dois cavaleiros que partiriam de suas cidades, um ao encontro do outro. O cantar de um galo ao raiar do dia iniciava a corrida. O ponto de encontro seria o limite da cada território.
Os moradores de Siena criaram um galo branco que foi tratado com todo o carinho e respeito, tornando-se um belo e vistoso animal, enquanto os florentinos optaram por um galo preto que foi deixado à mingua. Como resultado prático, o “Galo Nero”, por estar faminto, cantou muito mais cedo permitindo ao cavaleiro de Florença ir muito mais longe e “encampar” toda a região do Chianti…
O primeiro “Super-Toscano”, o Tiganello, foi produzido por Marchese Piero Antinori em 1978 como um delicioso corte de Sangiovese e Cabernet Sauvignon. Foi uma revolução e permitiu a produção de outros vinhos fabulosos. Alguns, como o Sassicaia, já existiam desde 1944 como um vinho do patrão, só sendo comercializado após 1971, mas não era um estilo Chianti predominando a Cabernet.
Alguns vinhos icônicos
Há uma série de grandes produtores que se equivalem em seriedade e qualidade. O que os diferenciam é apenas um marketing melhor ou uma boa assessoria de imprensa. Somente alguns super toscanos atingiram os 100 pontos de Parker, mas o grande guia italiano, Gambero Rosso, já premiou com seus “tre bicchieri” diversos produtores. Eis alguns deles:
Isole e Olena, Castello di Fonterutoli, Fontodi, Marchesi Antinori, Fattoria di Felsina, Fattoria La Massa, Castello di Ama, Ruffino, Badia a Coltibuono, entre outros.
Castello di Ama– Um dos melhores Chianti Classico, merecedor dos “tre bicchieri” do Gambero Rosso. Provavelmente o mais conceituado produtor desta denominação. Robert Parker: 93 pontos (safra 2007)
Chianti Classico Rancia Riserva – Este cultuado Chianti é, para muitos, o melhor Chianti da atualidade – “uma das melhores compras entre os vinhos de grande qualidade” para Robert Parker, que classificou a safra de 2007 com impressionantes 96 pontos! Uma das mais grandiosas expressões de Chianti clássico.
Chianti Classico Riserva Badia a Coltibuono – Descrito como “incrivelmente expressivo, com notável profundidade” pelo Gambero Rosso e classificado como “outstanding” por Robert Parker, o Chianti Classico Riserva da Badia a Coltibuono é um dos maiores embaixadores da região, ostentando grande classe e imensa capacidade de envelhecimento. De fato, ele ganha em elegância e complexidade por mais de 20 anos! É um dos poucos vinhos orgânicos da região de Chianti Classico, sendo muito equilibrado – uma bela expressão da uva Sangiovese!
Semana que vem vamos abordar o famoso Brunello di Montalcino.
Dica da Semana: existem ótimos Chianti nas regiões fora do clássico. A denominação Rufina é das melhores. Não é barato, mas vale o investimento.
Chianti Rufina DOCG Nipozzano Riserva
Produtor: Marchesi de Frescobaldi
País: Itália/Toscana
Uva: 90% Sangiovese e 10% uvas complementares.
Vermelho púrpuro brilhante. Aroma expressivo de frutas silvestres como amora, mirtilo, framboesa e cereja escura que se mescla a notas de alecrim, baunilha e canela. Palato: Harmonia entre álcool, taninos, acidez e fruta. Final elegante e marcante. Acompanha carne assada, guisados e queijos maturados.
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