Escrever uma coluna semanal sobre vinhos, mesmo para um apaixonado como este autor, pode ser um castigo. Algumas vezes não se consegue um tema interessante para apresentar aos leitores. Resta a opção de comentar este ou aquele produto, o que pode não ser do interesse de todos. Um dos caminhos para contornar estas crises de criatividade é ler muito sobre o tema e assuntos correlatos, quase sempre aparece alguma boa história.
 
Na carona daquelas pesquisas sobre as origens das videiras, descobriram que vinhos eram consumidos há muito mais tempo do que se imaginava. O interessante ficou por conta dos motivos de tal consumo: a água, naquela época, era contaminada, beber vinho era mais seguro e saudável! Mas imaginem o seguinte, o vinho não continha nenhum conservante e nem existia nenhuma forma de refrigeração, ou seja, em 2 ou 3 dias já teria se transformado em vinagre. Bebiam assim mesmo…
 
Outra pesquisa recente foi realizada em conjunto pelas Universidades de Harvard e a de Minnesota em Mineápolis. Os pesquisadores conseguiram demonstrar que determinados ritos que cumprimos antes de consumir este ou aquele alimento os tornam mais saborosos!
 
Do que estão falando?
 
De pequenos hábitos ou manias que estão tão enraizados no nosso dia a dia que se tornaram ritos. Por exemplo: para comer um daqueles biscoitos recheados, que lembram um pequeno sanduíche, o rito padrão é separar as metades, comer o recheio primeiro e depois os dois biscoitinhos. Não conheço ninguém que nunca fez isto.
 
 
Outro exemplo é como consumir uma bela fatia de pizza? Com as mãos, dobrando-a para evitar cair gotas de gordura sobre a roupa ou num prato, usando talheres? (garanto de da primeira forma fica muito melhor!).
 
 
Não podemos esquecer a turma do café da manhã, um fumegante café com leite, pão francês coberto com manteiga e aquela mergulhada na xícara antes de comer. Até o dia fica melhor!
 
 
Um dos experimentos realizados no estudo envolvia uma barra de chocolate. Os voluntários foram divididos em grupos, o primeiro recebeu instruções específicas, algo como dividir a barra ao meio, escolher uma metade, remover o papel laminado e degustar.Ao outro grupo foi sugerido que simplesmente desembrulhassem a barra e a consumissem.
 
Analisadas as impressões descritas, ficou claro que o grupo que cumpriu o ritual de dividir, desembrulhar e comer teve um grau de satisfação muito maior que o outro grupo.
 
Não sou um chocólatra, mas quando ganho uma boa barra de chocolate belga ou suíço me dou o trabalho de dividi-la naqueles quadradinhos e como um por um. Delícia!
 
A pesquisa chegou aos ritos do vinho também, mas deixou a desejar. Formaram dois grupos, um removia a cápsula e sacava a rolha enquanto o outro grupo observava.
 
O resultado foi um pouco decepcionante, apenas o 1º grupo notou alguma satisfação maior. Acho que faltou envolverem pessoas mais ligadas a este universo. Não há ritualística maior do que escolher, abrir e degustar uma boa garrafa. Vamos aos fatos.
 
Escolher o vinho é o primeiro rito. Seja através de um catálogo em que se perdem horas analisando descrição por descrição, ou numa loja especializada onde rótulos são comparados, garrafas são manuseadas e discutidas de forma intensa e prazerosa com os vendedores. Uma boa crítica em revistas pode ser fonte para uma ritualística caçada em busca da ‘presa’ almejada.
 
O segundo passo é múltiplo: armazenar e decidir quando e onde consumir. As possibilidades são inúmeras, tantas quanto as desculpas para adiar a data e continuar curtindo a ideia. (já aconteceu de perder um vinho por conta desta busca da perfeição…).
 
Decidido o dia, a hora, o local e a companhia, chega a vez de escolher as taças. Garanto que os leitores estão achando graça, mas um bom enófilo é capaz de ter formatos de taça e qualidade de cristais específicos para cada tipo de vinho. A loucura não para por aqui, as taças devem estar imaculadamente limpas, o que envolve água quente, álcool e panos que não soltam fiapos…
 
 
Vamos abrir a garrafa. Parece simples não? É só pegar o saca-rolhas e – alto lá! Não é qualquer saca-rolhas não, no mínimo um modelo Sommelier ou um Rabbit, senão estraga a rolha, pode deixar resíduos indesejáveis, etc. Se for uma garrafa de mais idade, deve ser utilizado um de lâminas duplas. Decantar ou não, aerar ou não, harmonizar e finalmente degustar.
 
 
Com todo este cerimonial, não há vinho que não fique ótimo!
 
Quais os seus ritos? Conte para agente, pode ser um bom assunto para as próximas colunas. Até lá fiquem com a…

Dica da Semana: um vinho para beber sem frescura. 
 
Urban Uco Tempranillo 

Elaborado na Argentina com a casta espanhola mais emblemática, o Urban Uco Tempranillo é macio e repleto de notas de fruta madura.

A safra de 2008 arrematou 89 pontos de Robert Parker que se seduziu pelo “cativante bouquet” do vinho e seu “belo apelo varietal”.
Uma das mais saborosas pechinchas da região do Uco, com a prestigiosa assinatura de O.Fournier.