O mundo do vinho tem vários temas que geram discussões infindáveis, por exemplo: vinhos do Velho Mundo e do Novo Mundo, algo como comparar austeros senhores que fumam charutos e jogam Bridge, com uma garotada que vai à praia e ao show de Rock and Roll. Mais questionável ainda é a discussão sobre decantar ou não vinhos e as modernas variantes como aerar e até mesmo agitar com um mixer.
A necessidade de decantar um vinho surge quando se vai servir um vinho como um ótimo Bordeaux que foi guardado por 10 ou mais anos. Há um depósito de resíduos na garrafa, a borra, que deve ser evitada ao verter o vinho em uma taça. O melhor truque é usar um decantador, seguindo um bonito ritual em que o Sommelier verte cuidadosamente o líquido no jarro e, com o auxílio de uma vela estrategicamente colocada sob o gargalo da garrafa consegue interromper a operação ao aparecer o primeiro vestígio do resíduo.
Após esta explicação, parece totalmente sem sentido decantar um vinho jovem, como os produzidos no Novo Mundo. Posso assegurar que estamos entrando num campo cheio de armadilhas com defensores ferrenhos do ‘Sim, devemos!’ e do ‘Não devemos!’. Para complicar, há razões de sobra para apoiar qualquer dos lados.
A alegação mais comum dos que defendem a decantação do vinho jovem é que a oxigenação obtida com este processo começa a domá-lo e alegra o nosso paladar. Ponto para eles, mas esta não é a única maneira de aerar um vinho, jovem ou maduro: existe uma grande variedade de acessórios para esta finalidade, o mais famoso talvez seja o Vinturi. Mas não separa sedimentos.
O que realmente acontece quando decantamos um vinho?
A ciência tem explicações interessantes. Um estudo feito pela Escola de Farmácia de Shenyang demonstrou que este procedimento efetivamente altera a composição química do vinho, diminuindo a concentração dos ácidos orgânicos que são importantes agentes na formação dos sabores azedos. A presença de polifenóis, tanino entre eles, também diminui, tornando o vinho mais agradável.
Uma descoberta que surpreendeu os especialistas foi a influência da temperatura ambiente e da intensidade luminosa: aumentando significativamente estes dois fatores, o vinho reage rapidamente e pode ser consumido antes do tempo padrão de espera, que gira em torno de 1 hora. Mas nada de exageros, procure o lugar mais quente da sala e acenda todas as luzes…
No lado negativo, este mesmo estudo mostrou que se há um ganho no paladar, em contrapartida ocorre uma perda significativa dos famosos antioxidantes que trariam benefícios à saúde de todos. Só por isto já não seria recomendado decantar.
Nem mesmo o estudo da Escola de Farmácia fica impune: outra corrente de estudiosos da química afirma que a quantidade de oxigênio incorporada ao vinho pela decantação não seria suficiente para permitir as alterações alegadas. Em lugar de 1 hora seriam necessárias 12 horas ou mais para permitir que todas as reações se completem de modo satisfatório. Isto não é prático…
Pode parecer, neste ponto, que apreciadores de um bom vinho estão perdendo a razão. Uma nova corrente, liderada por Nathan Myhrvold, uma polêmica figura que mistura tecnologia com alta gastronomia – ele já foi o Chefe de Tecnologia da Microsoft – introduziu a “hiperdecantação”, um processo radical:
– esqueçam delicadezas ou sutilezas, verte-se o vinho num copo cilíndrico e com o auxílio de um mixer de cozinha agita-se vigorosamente por 30 a 60 segundos. Pode-se usar um liquidificador, como alternativa. Aguarda-se a espuma baixar para degustar.
Segundo este autor de ‘Modernist Cusine’, o mesmo efeito pode ser obtido fechando a garrafa com uma tampa temporária e submetendo-a a uma agitação intensa. Coisa impensável segundo os cânones do vinho.
Resumo da ópera: obviamente testamos este inovador processo. Os resultados foram desanimadores, mas ainda não desistimos totalmente de fazer uma nova experiência. O nosso sistema preferido é usar um bom aerador. Vinturi e Vinoair são os preferidos.
Como sugestão final, aconselhamos que experimentem estas técnicas radicais e tirem suas conclusões. Mas não estraguem um bom vinho!
Dica da Semana: para decantar com todo o requinte!
Vinho de cor rubi intensa e profundida. Aroma de frutas, com notas de café e doce tabaco. Este é um vinho suave e rico, com sabores de frutas vermelhas, cerejas e toques de frutas secas. É apoiado por um denso e complexo meio, com taninos suficientes para equilibrar os enormes sabores, terminando em um incrivelmente rico e acetinado final.
Harmonização: Acompanha carne vermelha grelhada, caça e massas com molhos intensos.
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