Ainda no colégio, aprendíamos uma curiosa expressão, CNTP, nas aulas de química. Era uma forma simplificada de Condições Normais de Temperatura e Pressão, para que as reações esperadas ocorressem sem problemas.
Estamos bem longe disso neste segundo ano de epidemia, o que afeta, diretamente, uma das mais simpáticas tradições brasileiras, o almoço do Domingo de Páscoa. Mesa cheia de iguarias, bons vinhos e a garotada feliz em busca dos apreciados ovos de chocolate.
Que saudade!
Foi pensando nisso que pedi ajuda a nossa parceira para assuntos gastronômicos, Vanessa Nakamura (@vanessatnakamura), para criar um cardápio para o almoço dominical. A resposta foi rápida: que tal um arroz de polvo?
A ideia era trazer outras tradições culinárias portuguesas, fugindo do já batido bacalhau.
Adorei a sugestão, principalmente pelas interessantes possibilidades de harmonização, tarefa que me cabe neste latifúndio.
Chegamos a discutir opções para um amuse bouche, antes do prato principal e, claro, uma sobremesa cheia de chocolate, óbvio!
O imaginário rega-bofe começaria com uns espetinhos de tomates cereja que seriam mergulhados em Sake e depois rolados em uma farofinha de sal grosso e ervas da Provence.
Harmonização: Sake, sem dúvida, bem geladinho. Pode servir numa taça de vinho branco. Fica muito chique.
Para os que pretendem se aventurar nessa empreitada, Vanessa nos ensina uma receita do arroz de polvo. Está logo depois do texto principal.
Para a turma que nem chega perto do fogão, só nos resta sugerir que esse prato seja encomendado num bom restaurante, afinal, os serviços de entrega trabalharão intensamente. A dica complementar é: encomende já!
Para harmonizar temos duas opções, branco ou tinto.
Este prato é apreciado em várias culturas, principalmente no Mediterrâneo. A receita varia de local para local, assim como as opções de combinações de vinhos.
A grande oportunidade, que só uns poucos e experimentados gourmets conhecem, é degustar esta delícia com um vinho tinto. A carne do polvo não contrasta com os taninos para dar aquela desagradável sensação metálica. Como não tem sabor pronunciado, um belo tinto, encorpado e bem redondo é a combinação perfeita.
Nossa recomendação vai para um bom Tempranillo, Reserva, se for possível, como o Abadia Retuerta, um excelente corte desta casta e mais Cabernet Sauvignon, Syrah e Merlot.
Não é a única opção. Outra boa escolha é optar por um tinto português elaborado com a casta Tinta Roriz (Douro e Dão) ou Aragonez (Alentejo). Um bom exemplo é o Altano, um ótimo corte com as também portuguesas Touriga Franca e Tinta Barroca.
No capítulo dos brancos, as tradicionais opções do Sauvignon Blanc ou do Chardonnay caem muito bem, inclusive com o bons vinhos elaborados na América do Sul, Brasil inclusive.
Há uma opção mais ousada que, infelizmente, é bem difícil de encontrar em nossa lojas: a casta espanhola Verdejo. Procurem. Encontrando, é sucesso garantido.
Para encerrar este banquete virtual, só nos resta falar de uma tradicionalíssima harmonização: chocolates e Vinho do Porto. Uau!
Não importa se serão deliciosos brigadeiros, trufas, as sempre presentes brownies ou ovos de Páscoa: um Porto LBV cobre todas as possibilidades. Geladinho, por favor.
Que tal dar uma inovada?
Aqui vão mais umas combinações, conforme o tipo de chocolate usado na preparação do doce.
– Chocolate ao leite – escolham um vinho de colheita tardia/late harvest. Há ótimas opções vindas do Chile, Argentina e Uruguai. Deste último, o Licor de Tannat é perfeito até com o popular doce de leite.
– Chocolates amargos e meio amargos – a pedida, nesse caso é um bom Malbec, bem redondo e refrescado na hora de servir. Na falta deste, Cabernet Sauvignon, Merlot e Syrah pode ser bons substitutos. Escolham vinhos já um pouco maduros. Juventude, nessa hora, pode pôr tudo a perder.
Boa Páscoa para todos!
Saúde e bons vinhos.
Receita do Arroz de Polvo
Vanessa Tami Nakamura
Cozinheira e estrategista, formada em Gastronomia pela Anhembi Morumbi e Administração de Empresas pelo Insper. Foi cofundadora da Casa Volver, agência de comunicação de gastronomia, onde trabalhou com diversos chefs, restaurantes e marcas como Brastemp, Natural da Terra e Livraria Cultura. Atua com criação e gestão de marcas, estratégias de comunicação, produção de conteúdo e de eventos.
Polvo é daqueles pratos que as pessoas morrem de medo de errar o ponto. Mas garanto, não tem mistério.
O primeiro passo é escolher um polvo grande com tentáculos carnudos. Depois, é preciso lavar bem suas ventosas, retirando toda a areia e sujeira. Eu gosto de massagear e esfoliar com sal para deixá-lo bem limpinho e relaxado.
Para cozinhar o polvo, primeiro faça um caldo com os aromáticos que tiver à mão: cenoura, cebola, alho, salsão, salsinha, tomilho, cebolinha. Adicione água e leve ao fogo até ferver.
Em seguida, adicione o polvo e cozinhe por cerca de 40 minutos – conte 30min para cada quilo de polvo. Estará no ponto certo quando o garfo entrar sem resistência. Verifique, de tempos em tempos, na parte mais grossa do tentáculo, cuidando para não cozinhar demais e ficar molenga.
Você também pode colocar tudo na panela de pressão e cozinhar por aproximadamente 5 -7 minutos, depois que começar a apitar.
Retire o polvo e reserve o caldo.
Grelhe polvo na brasa ou na frigideira com manteiga, alho e salsinha.
Depois, fatie os tentáculos do polvo.
Pique alho, cebola, tomate (retire as sementes) e salsinha.
Lave o arroz e esquente o caldo.
Separe azeite, manteiga, sal, pimenta do reino, tabasco e batata palha.
Em uma panela, coloque um fio de azeite e refogue o alho e a cebola. Adicione o tomate e refogue mais, até caramelizar levemente. Junte o arroz e envolva bem na mistura. Entre com o caldo, prove, ajuste os temperos e deixe cozinhar, até ficar bem al dente.
Junte o polvo, um naco de manteiga e emulsione a coisa toda. Coloque mais caldo se precisar, para ficar bem cremoso.
Finalize com tabasco e salsinha. Ajuste os temperos, regue com um fio de azeite e sirva. Coloque batata palha feita em casa por cima, para dar um crunch.
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