Numa troca de mensagens recente, o meu interlocutor perguntou como ele poderia me descrever: você é um “influenciador”?, termo da moda entre os que vivem de postagem nas redes sociais, remunerados ou não.
De certa forma sou, mas quando tenho que me qualificar profissionalmente neste mundo do vinho, a opção onde me encaixo melhor seria a de “formador de opinião”. Na língua inglesa eu seria chamado de “wine writer”. Numa tradução ao pé da letra seria escritor de/sobre vinhos ou enoescritor, se é que este termo existe.
Me considero mais um cronista dos costumes deste encantador mundo dos vinhos, o que me permite uma boa latitude de assuntos para abordar. Posso, até mesmo, me transformar num crítico de vinhos o que não é bem a minha seara.
Explico:
Um bom crítico tem que se dedicar quase que totalmente a essa tarefa. Embora ainda existam profissionais bem ecléticos, a cada nova safra os enófilos preferem buscar as orientações dos críticos especializados nessa ou naquela região produtora.
E há gente especializada em uma casta apenas!
Estes desdobramentos têm alguns efeitos colaterais muito importantes: não é possível fazer uma honesta crítica de um vinho sem que alguns fatores sejam comparados com os de outras origens, por exemplo, teor alcoólico, presença ou não de madeira, métodos de elaboração, entre alguns outros.
Resumindo numa única palavra, o estilo do vinho.
Comentá-los só faz sentido se o comparamos com o caráter de outros vinhos. A aceitação deste ou daquele estilo, pelo mercado, é o que chamamos de tendência. Com poucas exceções, quase todas as vinícolas se dobram ao que os consumidores querem degustar.
E essas tendências mudam. Não de forma muito rápida, mas parecem ser reguladas pelas novas levas de consumidores que passam a apreciar um “bom” vinho.
Embora não goste de criticar vinhos, há pouco tempo participei da apresentação de uma nova vinícola, com vinhos orientados para consumidores do mais alto poder aquisitivo. Eram alcoólicos, pesados, encorpados e com muita, muita madeira mesmo. Os donos da vinícola pediram a seu enólogo que os vinhos fossem assim. Esse era o estilo que eles apreciavam.
Eu não gostei dos vinhos apresentados e comentei, reservadamente, que aquele estilo estava ultrapassado. Lembrava os primeiros Malbec argentinos, ainda pela mão de Michel Rolland, que alguns críticos, maldosamente, chamavam de “suco de carvalho”.
São vinhos difíceis e caros.
Já apreciei este tipo de vinho, mas ele cansa o paladar em pouco tempo, sem falar que para o clima brasileiro é quase um contrassenso degustá-los: dia frio e ar condicionado no limite!
Olhando para o que as principais regiões produtoras estão elaborando e vendendo vamos perceber que houve uma guinada para outra direção.
Como um bom vinho começa no vinhedo, ali está a primeira transformação, a mudança para cultivos mais orgânicos, o que gera frutos com outras características, obrigando ao time da enologia a rever e adaptar seus processos.
Novas práticas são introduzidas, principalmente na fase de maceração, onde as principais características de um vinho são obtidas. Algumas técnicas muito antigas são revividas, com grande sucesso e aceitação do mercado. Um bom exemplo são as talhas ou ânforas.
O elegante e tradicional amadurecimento em madeira é meio que deixado de lado em favor de ovos de concreto, resultando em vinhos que apresentam sabores originais, sem o acréscimo de aditivos. E que delícia de vinhos!
Castas que eram só coadjuvantes viram protagonistas a ponto de gerar ciúmes em alguns países. Imaginem que a França já está propondo que os nomes de suas principais castas sejam protegidos, como já fazem com o Champagne e o queijo Roquefort. A cada menção de Cabernet, Merlot, Syrah e mais algumas, por qualquer produtor fora da França, implicaria no pagamento de royalties…
Nos brancos, reparem a ascensão dos vinhos macerados com as cascas, denominados “laranja” ou “amarelo”. Sabores que eram desconhecidos por uma ou duas gerações.
Uma outra tendência, que veio para ficar, são os rosados, que já foram taxados de tudo, até de não serem vinhos, se comparados aos “senhores tintos madeirados”. O que me faz lembrar um dos “causos” mais simpáticos que conheço.
Um amigo, da minha juventude, um pouco mais velho, querendo impressionar sua namorada da época, com a qual veio a se casar anos mais tarde, levou-a para um fim de semana em Paris e, claro, para um jantar no que era, naquela época, o melhor restaurante do mundo, o Maxim’s.
Escolhidos os pratos, ele foi abordado pelo Sommelier que lhe entrega uma enigmática, para ele, Carta de Vinhos, seguido pela clássica pergunta:
“Monsieur, le vin”?
A graça fica por conta da completa ignorância dele sobre vinhos. Passa os olhos rapidamente por algumas páginas e decreta:
“Un rosé, si vous plait”.
“Trés bien, monsieur, parfait”!
Segundo o Sommelier, era a escolha perfeita…
Quer ficar dentro do que é considerado atual em termos de estilos de vinhos?
Anote:
– menor teor alcoólico, em torno de 12%;
– pouca madeira ou vinhos elaborados em talhas e recipientes fechados de concreto;
– vinhos de corpo mais leve, elaborado com uvas mais jovens, mais frutados e aromáticos;
– brancos de regiões mais frias;
– castas pouco globalizadas e regiões que ficaram esquecidas, como os Crus de Beaujolais (Morgon, Fleurie, Moulin a Vent, etc.).
Saúde e bons vinhos.
Foto de abertura por Markus Spiske para StockSnap
Tuty,
Muito bom! Eu gosto de vinhos nessa linha, leves, com boa acidez, pouca ou nenhuma madeira. Uma uva que me agrada muito é a gamay, dos beaujolais. São vinhos para o nosso clima, pena que não há muito oferta. No zona sul há algumas opções de beaujolais que valem a pena.
Um abraço
Marcio.
Temos gostos parecidos.
Obrigado pelo comentário.
Abs