Não se pode negar que o ato de servir um vinho, num restaurante, é cercado de pompa e circunstância. Muitas vezes são apenas atos cênicos que criam uma atmosfera agradável.
Tudo muda de figura quando estamos em casa apenas degustando um bom vinho ou numa reunião com alguns amigos. Nada de muitos requintes, claro, mas há certos aspectos que não podem ser esquecidos.
O conjunto de regras da etiqueta dos vinhos é bem abrangente. Começa na abertura de uma garrafa e seu serviço, passa pelas taças e as maneiras de empunhá-las, o rito básico da degustação – observar, sentir aromas e provar – que tem detalhes diferentes para quem está servindo, chegando até situações mais delicadas, por exemplo, se um vinho trazido por um convidado deve ou não ser servido.
Vamos revisitar alguns destes pontos.
Sendo o Anfitrião
Cabe a ele decidir o que será servido, escolher as taças, abrir a garrafa e fazer o serviço do vinho. Para que tudo funcione sem problemas, um pouco de planejamento ajuda bastante:
– Tenha todos os acessórios ao alcance da mão – saca rolhas, decantador ou aerador, taças de acordo com o que será servido, panos de prato, bico corta gota e até uma pequena lixeira. Tudo imaculadamente limpo;
– A temperatura de cada vinho deve estar dentro do esperado. Um balde de gelo é sempre útil. Não sendo possível, use uma capa térmica ou guarde os vinhos, entre as rodadas, numa geladeira, devidamente tampados. Se os tintos estiverem meio quentes, pode refrescá-los também.
– A cápsula deverá ser cortada abaixo do ressalto do gargalo ou removida completamente. Limpe qualquer resíduo;
– Retirar a rolha deve ser um ato natural, nada de exibições de habilidades. Examine-a procurando por pontos mofados ou aromas desagradáveis, cheirando o corpo e não a ponta;
– Coloque um pouco de vinho na sua taça e faça a análise preliminar. Somente depois de sua aprovação sirva os demais. Se notar algo ruim, descarte a garrafa e abra outra. Tenha sempre um plano “B”;
– Para servir, segure a garrafa pela sua base, nunca pelo gargalo. Para evitar respingos, pode usar um pano cobrindo parte do gargalo, mas nunca o rótulo;
– Procure distribuir quantidades iguais para todos, lembrando que você sempre será o último a ser servido, mesmo na segunda rodada. Os convidados estão sempre em primeiro lugar, entre eles, as damas têm preferência;
– Um detalhe importante, mas pouco valorizado, é saber o que está sendo servido. Tenha pronta uma explicação ou mesmo uma “colinha” para esclarecer as dúvidas: casta, região, safra e a razão da escolha.
Sendo o convidado
– Empunhe sua taça da maneira correta, evitando segurar o bojo;
– Siga, sempre que possível, os passos básicos: observe a cor, sinta os primeiros aromas, gire a taça com delicadeza para aerar, procure por novos aromas e prove. Um gole pequeno, deixe o vinho passear pela boca e depois, sinta o retrogosto;
– Notando algum defeito, converse com quem está ao seu lado para confirmar ou não – pode ser apenas uma falsa impressão sua.
– Confirmado? Falem com o anfitrião, discretamente;
– O ritmo deve ser lento. Desfrutem cada momento e saboreiem ao máximo cada gole. As damas devem procurar degustar sempre na mesma posição da taça, evitando “marcas de batom”, se o usarem, é claro;
– Brindar é sempre divertido e o som das taças se encontrando faz parte do rito de degustar para muitos Enófilos. Até isso exige uma técnica. Segurem a taça pela haste e encostem o bulbo, nunca as bordas. Suavemente, por favor.
A garrafa presenteada
Esta é uma situação que pode passar de uma ótima surpresa até uma tremenda “saia justa”. A regra básica a ser seguida é: nunca espere que o seu vinho seja aberto.
Há exceções!
A principal razão para aceitar a regra mencionada é que o anfitrião já teria tudo planejado e o vinho presenteado pode não se adequar neste plano.
Uma maneira simples e elegante de contornar este impasse é combinar antes. Ofereça para levar um rótulo que harmonize com o que será servido.
Caberá, ao anfitrião, deixar o convidado tranquilo e demonstrar que apreciou o mimo. Dentre as opções possíveis, pode-se apresentar o vinho a todos e perguntar se desejam prová-lo. A decisão final cabe ao dono da casa, entretanto, que deverá estar bem fundamentado quanto à escolha de seus vinhos.
O que pode dar errado
Até mesmo o mais experiente enófilo pode passar por problemas inesperados. Uma rolha quebrada é o mais comum e descobrir que o vinho está passado, o pior.
Alguns conselhos:
– “C’est la vie”, diriam os franceses. Leve tudo na “esportiva”, sempre haverá uma forma de resolver;
– Bons saca rolhas tendem a preservá-las. Se souber que a rolha pode estar muito seca e quebradiça, use um abridor de lâminas paralelas;
– Taças quebradas também são frequentes. Tenha sempre algumas de reserva. Não se preocupem muito com formatos específicos. Existem taças universais, um tamanho entre as de tinto e branco, que servem para qualquer tipo de vinho, inclusive espumantes. É um bom investimento;
– A pior situação é um vinho passado. Já mencionamos o plano “B”. Outra boa opção é abrir algumas garrafas antes dos convidados chegarem. A única restrição é a quantidade que será consumida. Se for pouca, a solução será recolocar as rolhas nas que não foram aproveitadas.
Os vinhos mais antigos, portanto sujeitos a problemas, devem ser abertos com antecedência e decantados. Algumas vezes, 24 horas antes…
Saúde e bons vinhos!
Imagem de abertura: “Flor” vetor criado por upklyak – Freepik
Eu cumpro pouco mais da metade dessas indicações. Todas, não. Sou um enófilo amador. Mss dou a maior atenção ao que V. Mercê escreve. Muito bem, aliás. Grato sempre.