Esquisitices do mundo do vinho

Quem chamou a atenção para este tema foi um amigo e eventual colaborador, Pedro Arthur Sant’Anna: enviou um destes vídeos que correm na internet, mostrando como sacar a rolha de uma garrafa esquentando o gargalo.

Do ponto de vista da física, tudo deveria funcionar: o ar é aquecido, expande e expulsa a rolha.

Mas há limites, o que torna esta prática um tanto arriscada. Muita coisa pode dar errada, por exemplo, quebrar a garrafa ou mesmo esquentar demais o vinho e estragá-lo. Agora imaginem fazer isto num vinho de 1ª linha.

Existem outras técnicas incomuns para se conseguir o mesmo objetivo, coisas como usar parafusos e chaves de fenda, empurrar a rolha para dentro ou, acreditem, bater com o fundo da garrafa numa parede, apoiado no calcanhar de um sapato, até que o “vinho” empurre a rolha para fora. Será que o que ficou na garrafa ainda pode ser bebido depois de tanta agitação?

O mais seguro é ter um saca rolha sempre à mão!

Enófilos muito chiques e hábeis, amantes de bons espumantes, gostam de se exibir degolando a garrafa com um sabre ou algo semelhante. Novamente, ou estamos bastante treinados nesta arte ou o improvável vai se fazer presente. Por favor, não tentem isto em casa…

Existe uma outra técnica, igualmente arriscada, muito usada nas caves de Vinho do Porto, para degolar garrafas muito antigas. Neste caso, qualquer tentativa de tirar uma rolha centenária poderia ser um desastre ainda maior.

Uma tenaz específica para este fim é aquecida em brasa e, em seguida, aplicada no gargalo. O vidro trinca, liberando o preciosos líquido.

Há mais coisas pitorescas no mundo do vinho que podemos incluir nesta lista, entre elas, a “hiper decantação” ou se preferirem, a “hiper aeração”: consiste em bater o vinho num liquidificador, por uns poucos segundos. Esta curiosa ideia surgiu no livro “Modernist Cuisine” de Nathan Myhrvold, um antigo chefe de tecnologia da Microsoft que abandonou tudo pela arte de cozinhar…

Aqui só cabe um comentário: não se deve misturar alta tecnologia com vinho. Simplifiquem!

Outra novidade que pode parecer estranha, mas tem uma certa lógica, são os vinhos que envelhecem submersos, isto mesmo, embaixo d’água, seja em lagos, rios ou nos oceanos. Existe uma certa tendência aqui. Tudo começa com a descoberta do naufrágio de um antigo cargueiro com milhares de garrafas de, até onde se sabe, um ótimo vinho. Estavam naufragadas por um par de décadas, pelo menos. Quem provou achou tudo maravilhoso. Por alguma razão o vinho não teria sido contaminado com água salgada.

Pronto, foi a senha para vários vinhateiros tentarem a sorte com algo semelhante, afinal, uma boa cave de amadurecimento fica no subsolo e a baixa temperatura. Tudo a ver. Parece mais um bom marketing do que técnica de elaboração.

Os barris de carvalho, onde vinhos são produzidos ou envelhecidos é a mais nova fonte destas incomuns experiências. Após terminarem seu ciclo útil nas vinícolas, são disputadíssimos por fabricantes de destilados para “acrescentar mais uma camada de sabor” aos seus produtos. Até produtores de café estão usando barricas antigas para dar novos aromas e sabores para uma das bebidas mais populares do mundo.

Existem destilados que sempre usaram barris de carvalho, o Whisky e o Bourbon são dois deles. Alguns produtores de vinhos resolveram inverter o ciclo: já que usam os nosso tonéis, por que não usar os deles?

Surge o vinho envelhecido em tonel de Bourbon, de Rum…

Tem empresas do porte da californiana Robert Mondavi apostando nesta novidade.

Seguindo nesta linha, não é exatamente uma novidade voltar a usar recipientes de barro, as ânforas, para produzir ou amadurecer vinhos. Para muita gente parece algo estranho, um passo para trás.

Estas técnicas ficaram esquecidas, substituídas por modernas tecnologias que permitem um total controle na vinificação. Felizmente sempre tem algum abnegado disposto a reviver antigas metodologias. Neste caso foi surpreendente, diversos produtores tradicionais voltaram a empregar este método com muito sucesso. Novos e velhos ceramistas estão reaprendendo a fazer ânforas, “qvevris” e assemelhados. Parece que veio para ficar.

Os poucos vinhos que já provamos, dentro deste estilo, eram bem diferentes do que estamos habituados.

O emprego de madeira na elaboração de um vinho, para diversos fins, sempre despertou alguma curiosidade. Vão desde tanques de fermentação, armazenamento, envelhecimento e transporte. Muito versátil.

O vinho é uma bebida milenar e vem sendo produzida, basicamente, da mesma forma desde então. Nunca lembramos, por outro lado, de um pequeno detalhe: onde produzir, em que recipientes?

Estudos arqueológicos têm mostrado que lagares de pedra e os potes de barro, não cozidos, sempre foram usados para este fim. Em Portugal e na Geórgia ainda vinificam assim. O uso de madeira é quase tão antigo. Não só era capaz de produzir um tonel razoavelmente impermeável, como era um isolante térmico o que ajudava a conservar o vinho em seu transporte. Na Grécia há um estilo de vinho, muito apreciado até hoje, que combina sabores de madeira e da resina de pinho que era usada para selar as barricas. Chama-se “Retsina”.

Usar só Carvalho veio com o tempo. Antes dele, outras madeiras foram empregadas. Ainda hoje buscam-se alternativas, afinal, não existem florestas de carvalho “infinitas”. Aqui no Brasil, uma vinícola artesanal já produz vinho em barricas que misturam madeiras brasileiras, emprestando um pouco da filosofia de trabalho dos alambiques nacionais que envelhecem suas pingas em amburana, bálsamo, jequitibá rosa, entre outras.

Devem existir mais coisas que soam estranhas no mundo dos vinhos. Um velho provérbio diz: “a diversidade é o tempero da vida”. Degustar bons vinhos vai ao encontro deste adágio.

Há tantos caminhos a seguir que pode tornar nossas escolhas meio complicadas, às vezes. Então, se o vinho não lhe agradou, use-o para temperar a carne ou a salada e abra outra garrafa.

Meio que “se lhe deram limões, faça uma limonada”!

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura por Maksim Goncharenok

Sacando a rolha, obtida no “The Telegraph

Sabragem, obtida no site “Wine News

Tenaz, obtida no “Mercado Livre

Links para alguns dos métodos mencionados:

Uso da tenaz

Sacando a rolha 1

Sacando a rolha 2

Hiper decantação

Sabrando um espumante

2 Comments

  1. Berti

    Ótima matéria sobre as”esquisitices” do mundo do vinho!!! Parabéns por nos proporcionar momentos de leitura e aprendizado.

  2. Ednaldo P Oliveira

    Após ler os meios mais esquisitos de abertura de uma garrafa, fico com o clássico saca rolhas e mantendo seus cuidados .

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

© 2024 O Boletim do Vinho

Theme by Anders NorenUp ↑