Cortes pouco comuns

Considerados como os vinhos mais famosos, os Bordeaux, são elaborados dentro de rígidas regras. Em tese, só podem ser utilizadas 6 tipos de uvas viníferas: Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Petit Verdot, Carménère e Malbec. Cada uma é vinificada separadamente e misturada posteriormente. Esta operação é conhecida como “corte”, “blend” ou “assemblage”.

Na sua grande maioria, Cabernet Sauvignon e Merlot dominam as vinificações nos diversos produtores ao longo do rio Garrone. A primeira casta é a preferida pelos que estão na margem esquerda, enquanto a segunda, é a mais utilizada pelos Châteaux da margem direita. São vinhos clássicos e referências para quaisquer outros vinhateiros. O corte bordalês é sempre uma garantia de que há algo bom naquela garrafa.

Ao decidir por misturar diferentes vinificações para elaborar um vinho, o Enólogo busca melhorar a qualidade de seu produto. Se o vinho não está com a cor desejada, acrescenta-se um pouco de vinho de uma casta “tintureira”. Se os taninos não estão no padrão desejado, acrescenta-se um pouco de vinho de uma casta tânica. Esta é a ideia básica.

Existem outras misturas, digamos, mais complexas, como a do conhecido Châteauneuf-du-Pape, onde até 14 castas diferentes podem ser usadas, inclusive algumas brancas. Da mesma região, outra sigla tem fama e alcance mundial, o corte “GSM”, onde se misturam vinhos elaborados com Grenache, Syrah e Mourvèdre, uvas típicas da região do Rio Ródano.

Todos são considerados como “cortes clássicos” e esta fórmula é copiada por produtores de diversos países. Existem outros tipos de corte, pouco usuais, que produzem bons resultados.

Um deles é o que mistura diferentes safras, seja de uma mesma varietal ou de castas diferentes.

O Champagne, salvo indicação no rótulo, sempre é um corte de diversas safras. Cabe ao Enólogo decidir quais vinhos base vai usar para criar uma das bebidas mais conhecidas e apreciadas.

O Vinho do Porto, a grande joia do comércio de vinhos de Portugal, também é elaborado com diferentes safras, algumas bem antigas. O resultado é espetacular.

No Brasil, já provamos dois ótimos vinhos elaborados com esta técnica, o Inominable, da vinícola Villagio Grando, de Santa Catarina e o Pedro, da vinícola Zanella, do Rio Grande do Sul.

A característica comum a estes vinhos é que são comercializados sem a indicação da safra, ou “não safrados”. Para saber como foram elaborados, é preciso consultar o contrarrótulo ou a ficha técnica.

Um processo, muito antigo, que está voltando a ser empregado com muito sucesso, inclusive pelos produtores que preferem o caminho da “mínima intervenção”, é a “co-fermentação”. Ao contrário dos cortes tradicionais, onde cada uva é fermentada separadamente para, depois, ser misturada, esta outra forma de vinificar, opta por trabalhar todas as uvas, simultaneamente, em um mesmo tanque de fermentação.

Um dos grandes problemas deste tipo de elaboração está no ponto de maturação de cada casta. Se eles são parecidos, fica tudo mais fácil. Caso contrário, Enólogos e Agrônomos precisam conhecer profundamente os seus vinhedos para obterem o melhor resultado desta combinação de diferentes uvas. O resultado não permite correções posteriores.

Para finalizar este tema de cortes diferentes, não podemos deixar de mencionar os “field blends”, comuns em Portugal, Douro, e em alguns outros países: os vinhedos são compostos por diferentes espécies, que são colhidas e vinificadas juntas. Muito semelhante à técnica de co-fermentação, exige profundo conhecimento dos vinhateiros para que o produto, ao final, seja excelente.

Parece que descobrimos um dos segredinhos dos ótimos vinhos portugueses. Será?

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de Evie Fjord na Unsplash

5 Comments

  1. Ana Luiza Gross

    Adorei

  2. Berti

    Muito elucidativo. Se entendi corretamente, temos dois métodos: Um aonde o blend é feito com vinhos de uvas distintas, permitindo o “balanceamento” e outro é a mistura de varias uvas em um processo só. Correto?

    • Tuty Pinheiro

      Berti.
      Correto. Mas na co-fermentação, ainda há a possibilidade de se balancear a quantidade de uvas, de cada casta, que irão fermentar juntas.
      No caso do filed blend, isto é um pouco mais complicado.
      Abs

  3. Roberto

    Olá, Tuty! Estudo com afinco sobre o Mundo dos Vinhos; isso faz com que eu consuma avidamente seus textos. Obrigado
    Se bem entendi, a única diferença entre a co-fermentação e field blends, é que no segundo, as uvas são todas plantadas juntas? Já na co-fermentação, podem vir de diversos vinhedos?
    Esses nossso irmãos lusitanos são mesmo mestres na arte de fazer excelentes cortes!

    • Tuty Pinheiro

      Roberto
      Agradeço o “consumo ávido” dos meus textos. Fico feliz.
      Quanto à diferença entre a co-fermentação e o field blends, você acertou na mosca.
      No 1º caso, o vinhateiro pode decidir a quantidade (carga) de cada casta bem como e origem de cada uma. Ele controla toda a situação.
      No caso do field blend, ele tem que aceitar o que vem do campo e o limite de correções é quase nulo.
      Abs
      Tuty

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