Não é fácil, mesmo para um grande vinho, se destacar entre os milhares de rótulos que são disponibilizados nos supermercados e lojas especializadas.

Escritórios de design são contratados para projetar etiquetas que atraiam o olhar do consumidor no meio das intermináveis filas de garrafas justapostas. Até os nomes são pensados como ferramentas de marketing.

Assim como as bulas de medicamentos, os contrarrótulos também são elaborados e redigidos por especialistas em passar, ao consumidor, uma ideia sobre o que ele vai degustar.

Esta é uma técnica de convencimento muito conhecida dos profissionais de publicidade, em geral. Faça com que o cliente pense num tema, sugerindo justamente o oposto, por exemplo: “nem pense nisso!”.

Pronto, está feita a armadilha. Nosso cérebro vai ficar constantemente preocupado com a razão do “não pense nisso”, não dando espaço para outras coisas.

É isto que acontece com o consumidor quando lê uma descrição do tipo “aromas de frutas silvestres, notas cítricas, paladar cremoso e retrogosto marcante. Harmoniza com tais alimentos”.

Uma vez induzida a ideia, fica difícil fugir da tentação de procurar estas características, em detrimento das outras que nos seriam mais óbvias. Há muito que aprender num momento como este.

Degustar um vinho pode ser cheio de rituais ou apenas uma coisa simples. Tudo depende da importância que cada um vai dar a este momento.

Aqueles que bebem vinho apenas para passar uma imagem, não sendo verdadeiros apreciadores, são sempre os mais vulneráveis a este tipo de influência. Enófilos experimentados têm uma atitude bem diferente, preferindo confrontar suas próprias observações com as do elaborado contrarrótulo.

Leva tempo para chegar lá, mas não é uma impossibilidade. Encontrar, ou não, descritores do vinho não deve ser visto como uma obrigação, mas como um prazer, algo que vai nos enriquecer naquele momento.

Alguns nunca vão conseguir, mesmo treinando olfato e paladar, outros parecem que nasceram com um dom e, se não tomarem cuidado, acabam se tornando uns enochatos, por excesso.

Para dominar esta técnica e não se deixar influenciar, é necessário calma e paciência antes de qualquer coisa. Nunca se percebe tudo que um vinho está nos apresentando, num primeiro encontro. Muitas vezes temos que “procurar” por aromas e sabores, estimulando o vinho a entregá-los, seja agitando o líquido ou mudando, levemente, a sua temperatura.

Um segundo fator, muito importante, é a limitação de nossa memória olfativa/degustativa: não tentem encontrar sabor de alcaçuz se vocês nunca provaram esta especiaria. Não tomem como uma limitação. Se aquele marcante aroma/sabor lhes sugere um outro nome, é este que deve ser usado, talvez seja uma experiência única e valiosa!

Não existem regras universais para o que cada indivíduo percebe no olfato e no paladar.

Criem suas próprias observações e habituem-se a discuti-las com os amigos. Todos vão ganhar e, aos poucos, a sensação de segurança sobre o que está sendo provado vai aumentando.

Começa a ficar óbvio o que deve ser consumido com este ou aquele vinho, fica mais fácil presentear os queridos amigos com base no gosto de cada um e muito mais.

Um dia, voltem a ler os tais contrarrótulos descritivos e vejam se “conferem”.

Vai ser uma tremenda experiência.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Imagem de Kerstin Riemer por Pixabay