Autor: Tuty (Page 26 of 145)

Descritores do vinho – Mineral

Outro descritor enigmático. Alguns especialistas preferem não o utilizar em suas análises. Afirmam que é um conceito muito sutil e sem um consenso sobre o que vem a ser, exatamente, um vinho mineral.

Levante a mão quem, ainda na infância, não levou um tombo e “comeu terra (e algumas pedrinhas …)”!

O conceito de mineralidade começa neste ponto: aquele gosto terroso, a sensação incômoda do pó de giz da professora riscando o quadro negro, o aroma de terra molhada quando chove, o cheiro curioso da pedra de isqueiro quando acionada e até mesmo a diferente sensação ao se consumir uma ostra.

Mas não fica só nisso. Existem mais referências, por exemplo, num parque de águas minerais: temos águas ferruginosas, outras com diversos sais minerais ou com compostos sulfurosos e até com um pouco de hidrocarbonetos, que produzem o inconfundível aroma de querosene.

Trata-se de um conceito muito amplo e cheio de meandros, trazendo, como um corolário, uma comunicação pouco clara: cada um vai interpretar este “mineral” do seu jeito. Pouco efetivo …

Vinhos com sabores e aromas que nos remetem a estas características são bastante comuns. Entre os vinhos brancos, algumas denominações são a própria definição deste descritor: Chablis, Poiully-Fumé e Riesling.

A mineralidade de um vinho pode ser facilmente associada com o intrigante 5º sabor – Umami: não é doce, salgado, azedo ou amargo. Difícil entender, mas é possível perceber.

Entre os tintos, um bom exemplo são os Malbec argentinos, especialmente os elaborados a partir de vinhedos de grande altitude.

Uma conclusão lógica, mas nem sempre correta, é associar o tipo de solo com esta característica do vinho, nos aproximando da definição do “Terroir”. Não existe uma confirmação desta hipótese. O mais perto que os pesquisadores chegaram mostra um caminho bem interessante: estas especiais características parecem ser o resultado da presença de alguns micróbios (no solo) e de leveduras típicas de cada região.

Ainda há muito que pesquisar e descobrir.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura por Matthew Henry para o Burst

Na vitória e na derrota

Um dos mitos mais conhecidos no universo dos vinhos é uma frase de Napoleão Bonaparte se referindo ao Champagne, bebida que, segundo muitos historiadores, era sempre transportada para as suas batalhas:

“Na vitória eu mereço, na derrota eu preciso!”

Esta é uma de muitas traduções ou adaptações desta máxima, pronunciada em francês, obviamente.

Winston Churchill, famoso Primeiro-ministro inglês durante a Segunda Guerra, também é citado como tendo usado a mesma frase, provavelmente inspirada pelos feitos do conhecido Imperador francês:

“I could not live without Champagne. In victory I deserve it. In defeat I need it.” Winston Churchill, 1946 (Eu não poderia viver sem o Champagne. Na vitória …)

Seguindo nesta mesma linha, Lily Bollinger, uma das famosas “viúvas de Champagne” que comandou a Casa Bollinger por 30 anos, sempre dizia:

“Só bebo Champagne quando estou feliz ou quando estou triste”

Coco Channel, um dos grandes nomes da moda feminina, também tinha sua frase predileta:

“Só bebo Champagne em duas ocasiões: quando estou amando e quando não estou”.

Vinhos espumantes sempre estão associados às celebrações ou, como demonstraram as personalidades citadas, são degustados na alegria e na tristeza, na doença e na saúde, quando o nosso time perde ou ganha.

O monge Dom Perignon, a quem se atribui a descoberta desta deliciosa bebida, não se conteve e gritou para seus companheiros:
“Venham correndo, estou bebendo as estrelas!”

Existem mais curiosidades sobre esta extraordinária bebida do que o espaço desta página. Uma que vale a pena registrar, era a forma como Napoleão abria sua garrafas: com seu sabre, degolando o gargalo e sem sair de seu cavalo.

Churchill, que foi um grande apreciador deste vinho espumante, teria consumido cerca de 42.000 garrafas, segundo seus biógrafos. Até hoje existe a “Cuvée Sir Winston Churchill”, elaborada pela Maison Pol Roger, em sua homenagem.

Napoleão foi derrotado na conhecida batalha de Waterloo, pelo Duque de Wellington. A história relata que as tropas francesas haviam esquecido o Champagne. Foi exilado na ilha de Santa Helena, onde lhe foi permitido manter uma considerável adega. Mas, seu vinho predileto passou a ser o sul africano “Vin de Constance”, um fortificado. Napoleão tomava um cálice diariamente, até sua morte em 1821. Foi um grande consolador da sua derrocada.

Pensando nisto tudo, que tal na próxima vez que fizermos um brinde nos lembrarmos de alguns destes fatos?

Não importa a sua turma: da tubaína, da pinga ou a dos vinhos.

O importante é compreender como outros heróis, do passado, se comportaram em suas vitórias e em sua derrotas. Sempre com elegância e alguma ironia.

Os vinhos, como qualquer outra bebida alcoólica, foram criados pelos humanos. Se consumidos com responsabilidade e no momento certo, vão trazer enorme alegria para os vitoriosos e grandes esperanças para os que não tiveram sucesso.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS

Imagem de abertura por freepic.diller no Freepik

Sabragem: “Sabrage@Preuillac – avant” por epeigne37, licenciada sob CC BY-NC-ND 2.0.

O que significa um vinho Reserva – de volta ao básico

Imaginem a seguinte situação:

Entramos em uma loja e encontramos duas versões e um mesmo vinho. A única diferença é a palavra “Reserva” (ou em outros idiomas) no rótulo de uma delas.

Naturalmente, somos levados a crer que um deles é superior ao outro. A curiosidade fala mais alto e decidimos comprar as duas garrafas para compará-las.

Ao fazer a degustação comparativa, o título de “melhor vinho” acaba ficando para aquela garrafa que não declarou ser um vinho especial…

Surpresos?

Saibam que é mais comum do que se possa imaginar. Vinhos “Reserva” nem sempre seguem regras preestabelecidas. Na maioria das vezes, quem decide é o departamento de Marketing, que pode ter opiniões não muito claras sobre o que é um vinho especial.

Como deveria ser um vinho Reserva?

A ideia é muito simples e direta: um lote de um bom vinho que ficou reservada para o produtor.

Um bom observador logo deduzirá que a quantidade não é grande; a safra foi boa, o mesmo pode ser dito com relação à vinificação e que a decisão foi tomada durante a prova do vinho, digamos, básico. No mínimo esta quantidade reservada passará por um envelhecimento maior.

Caso venha ser comercializada, isto já explicaria o preço maior e algum requinte na embalagem e rotulagem.

Infelizmente não é possível generalizar: poucos países estabeleceram normas que asseguram esta qualidade aos “Reserva”.

Dois deles se destacam e se tornaram referência no setor: Espanha e Itália.

As normas espanholas são as mais famosas. Para poder ostentar este título em seu rótulo, um vinho tinto deve envelhecer por 3 anos, sendo um deles em barricas de carvalho. No caso de brancos ou rosados, o prazo cai para 2 anos, com 6 meses em carvalho.

Na Itália, um Chianti Reserva passa um mínimo de 2 anos envelhecendo antes de ser comercializado. Um Amarone precisa de 4 anos e um Barolo 5 anos, para atender à regra.

Ambos os países são bem rigorosos no cumprimento destas leis.

Portugal, outro grande produtor europeu, tem uma regra bem elástica: basta ter um teor alcoólico 0,5% acima do mínimo legal. Para sermos justos, o termo “reserva” é muito pouco usado por lá. Preferem “Garrafeira” que tem regras mais rígidas.

Nos países produtores do “Novo Mundo” é onde as regras não existem ou são tão genéricas que a palavra “Reserva” passa a não ter nenhum significado: Austrália, Argentina, América do Norte, Nova Zelândia e alguns outros.

O destaque fica para o Chile, que chegou a inventar o (detestável) “Reservado” (para os otários) e para o Brasil que, na tentativa de copiar e adaptar as normas espanholas, criou um monstrengo, sem fundamento, oficializando o tal do “reservado” …

Gente oportunista e inescrupulosa existe em qualquer lugar e em qualquer atividade, inclusive no mundo do vinho.

Agora já sabemos: olho nos vinhos ditos “Reserva”, podemos estar comprando gato por lebre!

Saúde e bons vinhos.

CRÉDITOS:

Imagem de Freepik

Descritores do vinho: “Complexo”

Descrever um vinho nem sempre é uma tarefa fácil e, quase sempre, quem escuta ou lê uma análise feita por um Sommelier ou por especialistas, tem que recorrer a um dicionário para tentar matar a charada.

A grande dificuldade em descrever um vinho está centrada num único ponto: encontrar adjetivos que expliquem o que uma pessoa está sentindo ao degustá-lo. Cada indivíduo tem sensações bem pessoais que dificilmente serão as mesmas do que as de uma pessoa que está ao seu lado.

Alguns destes descritores se tornaram padrões: ácido, tânico, frutado, mineral, equilibrado etc. À medida que vamos naturalmente nos aprofundando neste mundo, aprendemos outros, digamos, menos comuns. Um bom exemplo é “estruturado”, como se o vinho tivesse fundações, pilares, vigas e lajes, usando o jargão da Engenharia Civil.

“Complexo” é outro de difícil compreensão, mas ao mesmo tempo, pode ser usado numa bela frase de efeito quando, na tentativa de descrever múltiplas sensações, algumas naquela categoria do “nunca provei nada igual”, não encontramos nada melhor. A saída é afirmar algo como “este vinho é muito complexo”!

Um bom dicionário traz esta definição: “construção composta de numerosos elementos interligados ou que funcionam como um todo”. Logo, se usarmos a expressão mencionada de forma genérica, não estaríamos errando.

Para profissionais, trata-se de um néctar que apresenta diversas camadas de aromas e sabores, alguns mais evidentes e outros mais sutis. Um vinho poderoso, quase sempre alcoólico, com uma “textura” (outro descritor enigmático) bem particular.

A principal característica para que um vinho possa ser considerado como complexo é o equilíbrio entre os componentes de sua “estrutura”: taninos, ácidos e açúcares – cada um desempenha o seu papel sem se sobrepor aos demais.

Existe uma harmonia que vai dar longevidade a este caldo. Para vinificá-lo, todas as etapas foram cuidadosamente avaliadas: o terroir foi escolhido com precisão, as castas se adaptaram perfeitamente ao ambiente e foram colhidas no ponto de maturação ideal, os processos tiveram mínimas intervenções e a higiene sempre foi a tônica. Nada poderia dar errado.

Não é simples avaliar isto tudo num pequeno gole que passeia pela nossa boca. Não são vinhos óbvios, como os que se dizem frutados ou frescos.

Vinhos complexos são pensados, trabalhados e afinados para atingirem um determinado ponto. Enólogos não estão preocupados com castas emblemáticas ou outras apelações do Marketing. Se um corte for necessário ele é feito. Precisa de outras nuances, deixe envelhecer em barricas de carvalho que podem ser novas, usadas ou uma mistura delas. Tudo será controlado e provado a cada etapa.

Complexidade pode ser criada, adicionada ou manipulada. Mas não é para qualquer “bico”. São vinhos caros por sua própria definição. Nunca estão “prontos” e ter a paciência de esperar a hora certa para degustá-los certamente aumenta sua complexidade.

Resumindo: a expressão “este vinho é complexo” pode ser usada em diversas situações.

1 – Quando não temos nenhum adjetivo em nosso vocabulário para descrever o que estamos experimentando;

2 – Quando Enófilos, Sommeliers e outros profissionais forem surpreendidos, positivamente, com uma qualidade muito acima da esperada;

3 – Quando aquele vinho que compramos despretensiosamente e o guardamos sabe-se lá por que razão, se revela o néctar sempre sonhado.

Neste último caso, apenas, a frase pode ser substituída por um adjetivo único, expressado de forma clara e intensa após uma gole maravilhoso:

Complexo!

Saúde e bons vinhos.

CRÉDITOS:

Foto por jcomp para o Freepik.

Pontuação dos vinhos – de volta ao básico

Vinhos pontuados, premiados ou simplesmente recomendados fazem a cabeça de muita gente. O problema é que não existe uma padronização que permita uma comparação minimente lógica por parte do consumidor interessado em compreender o que significa, realmente, aquela etiqueta com a nota dada por um crítico famoso ou o selo de premiação de um concurso.

Antes de nos aprofundarmos em explicações mais refinadas, é preciso ter em mente que o resultado de uma avaliação crítica ou de um concurso é sempre subjetivo. O gosto pessoal de quem prova um vinho para julgá-lo sempre terá um peso maior, por mais sério que seja, e por mais rígidas que sejam as normas de degustação impostas.

Por esta razão, o corpo de jurados dos grandes concursos internacionais é composto por mais de uma centena de pessoas, de diferentes origens. Os vinhos são avaliados em lotes e passam por várias etapas. Uma boa analogia pode ser feita com uma competição esportiva: eliminatórias, quartas de final, etc.

Com relação aos críticos, cada avaliação é estritamente pessoal. Alguns deles se destacaram por sua imparcialidade e por terem um “gosto” quase universal. Atualmente, poucos ainda trabalham sozinhos. Tornaram-se grandes equipes, com experts em vinhos de diferentes regiões.

Apesar de aposentado, Robert Parker continua sendo a referência. Adotou uma escala de 100 pontos para classificar seus vinhos. Não foi ele quem a inventou, mas foi quem a melhor utilizou e popularizou. Várias revistas especializadas e outros profissionais adotam este sistema, entre elas, a Wine Spectator.

Ninguém questiona um vinho de 100 pontos, algo muito perto da perfeição. Mas os leitores saberiam o significado das notas abaixo da máxima?

Aqui estão elas:

95 a 100 pts – um vinho como deve ser, um clássico;

90 a 94 pts – surpreendente, um vinho de qualidade superior;

85 a 89 pts – muito bom;

80 a 84 pts – bom;

75 a 79 pts – medíocre;

50 a 74 pts – não beba!

Outro tipo de pontuação muito popular é a de 20 pontos. Foi desenvolvida na Universidade de Davis, no final da década de 50, com um propósito bem acadêmico. Até hoje é a preferida pelos cursos de Sommelier, profissionais ou amadores, e a nota é obtida através de uma análise técnica que envolve cor, aromas, sabores e aspectos mais técnicos como acidez, tanicidade, entre outros. Sempre é feita uma ficha onde a pontuação de cada aspecto é anotada.

Cada nota tem um significado:

20 – Um vinho ideal;

19 – Extraordinário;

18 – Um ponto acima;

17 – Superior;

16 – Com personalidade;

15 – Na média;

14 – Sem graça;

13 – Limítrofe;

12 – Com defeitos.

A respeitada crítica Jancis Robinson é defensora desta forma de avaliar.

A última escala que vamos comentar é a de 5 pontos, muito comum em guias de vinhos. Podem ser representadas por algarismos ou simplesmente símbolos como um asterisco ou outro. O mais famoso guia de vinhos italianos, o Gambero Rosso, adota o “bicchiere”, a tacinha de vinho. Outro adepto desta escala é o popular aplicativo Vivino.

Aqui está o significado de cada nota:

5 – O melhor de todos;

4 – Excelente;

3 – Bom, para o dia a dia;

2 – “dá para o gasto” …;

1 – Não presta nem para lavar cachorro.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura obtida em: Vinosophers

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