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Os Vinhos da Anakena, Chile

No dia 16 de outubro, a convite da Winebrands, participamos da apresentação dos vinhos da Viña Anakena. O evento aconteceu no restaurante Mira, anexo à Casa Daros em Botafogo, no Rio de Janeiro.
 
 
A apresentação foi feita pelo Gerente Comercial Nicolás Saelzer e pelo Enólogo Gavin Taylor, de origem sul- africana, radicado no Chile. A vinícola, relativamente jovem, foi fundada por dois amigos de infância, Felipe Ibañes e Jorge Gutiérrez, em Alto Cachapoal, com o objetivo de produzir vinhos de alta qualidade e com uma personalidade que distinguisse esta inovadora empresa.
 
Com uma enorme variedade de terroirs, 145 hectares em Alto Cachapoal, 125 hectares em Leyda, 43 hectares em Peumo e 44 hectares plantados no Vale de Colchagua, tem seus vinhos consumidos em mais de 50 países, recebendo as melhores críticas de seus consumidores.
 
Sua linha de produção está dividida em diferentes filosofias, que começam nos Varietais, vinhos jovens que enfatizam as características das cepas. O próximo degrau, a linha ENCO tem por objetivo oferecer boa relação custo x benefício. Os TAMA buscam representar as características de todos os terroirs da empresa, sendo a linha que oferece o maior número de produtos. Os vinhos da categoria ONA, já considerados como “top”, são inovadores e audaciosos, enquanto os ALWA são únicos, o melhor que se pode obter. O ótimo portfólio se completa com um expressivo Late Harvest.
 
Chama a atenção o cuidado com a apresentação de seus produtos. Os rótulos são elegantes e trazem uma representação icônica das denominações de suas linhas que remetem à história dos povos que habitaram estas regiões antes de existir o Chile com um país.
 
O próprio nome é uma homenagem ao “homem-pássaro” da cultura Rapa Nui, uma bonita lenda:
 
Anakena seria a caverna deste homem pássaro, o Tangata Manu, uma metáfora da gaivota da Ilha de Páscoa, que depositava seu ovo neste local secreto. Todo ano, bravos guerreiros nadavam desde Rapa Nui até a ilhota de Moto Nui em busca do precioso ovo. Aquele que conseguisse trazê-lo intacto era outorgado com o título de Homem-Pássaro, recebendo honrarias e fortuna.
 
 
Foram servidos oito vinhos, numa sequência que crescia dentro da filosofia de produção.
 
O 1º foi o Anakena Varietal Sauvignon Blanc 2012. Jovem, fresco, boa fruta e fácil de degustar. Com um custo muito competitivo, abaixo de R$ 50,00, se torna uma opção para dias de calor. (preços de 2013)
 
 
Subindo um degrau na escala, o próximo vinho degustado foi o Anakena Enco Reserve Chardonnay 2012. Muito bem elaborado, com boa acidez e permanência. Outro bom companheiro para o dia a dia no quente verão do Rio de Janeiro. Preço ligeiramente acima dos R$ 50,00.
 
 
A próxima degustação foi uma boa surpresa: o Anakena Tama Vineyard Selection Pinot Noir 2011 chamou a atenção de todos. Um vinho refinado, muito aromático e que passa por madeira. Boa acidez e perfeitamente balanceado com seus taninos. Ótimo! Custo na faixa de R$ 80,00.
 
 
Seguimos com os tintos. Voltando ao segmento ENCO, provamos o interessante Anakena Enco Reserve Carménerè 2011. Este vinho, obtido com a casta emblemática do país foi elaborado com um cuidado todo especial para fugir a características que enfatizam sabores “verdes” típicos da casta. A colheita foi deliberadamente atrasada obtendo-se uma fruta com qualidade ímpar para a vinificação. O resultado é perfeitamente sentido em aromas e sabores. Delicioso. Na mesma faixa de preço do Sauvignon Blanc. Ótima compra.
 
 
O 5º vinho apresentou uma casta diferente: Anakena Tama Vineyard Slection Carignan 2010. Uma uva algo rara no mercado, mas que tem bons resultados nas mãos do competente Gavin Taylor. Premiado com boas notas de diversos críticos (90 pontos ou mais) é uma bebida equilibrada, com boa acidez, maduro e um quase dulçor muito agradável. Uma alternativa a ser considerada. Seu custo acompanha o de outros produtos da mesma linha.
 
 
Em seguida, até para permitir uma comparação direta, for servido o Anakena Tama Vineyard Selection Cabernet Sauvignon 2010, outro produto premiado. Esta uva tem uma adaptação perfeita em território chileno, produzindo vinhos de classe mundial. Este é um deles. Generoso, intenso, taninos suaves e longa permanência em boca. Companheiro ideal para carnes de sabor marcante. Pela faixa de preço será difícil encontrar concorrentes à altura.
 
 
Os dois últimos vinhos representam o que há de melhor desta empresa. O Anakena Ona Special Reserve Red Blend é um sofisticado corte de cabernet Sauvignon (55%), Carménerè (25%) e Syrah (20%) que passa de 14 a 16 meses em barricas de carvalho. Um vinho sofisticado que combina a potência do Cabernet, a delicadeza da Carménerè e a complexidade da Syrah. Bem estruturado e complexo, chama a atenção por sua cor clara, ao contrário do que se espera. Excelente! No mercado do Rio de Janeiro será vendido na faixa de R$ 90,00. Uma pechincha.
 
 
O Anakena Alwa 2009 é realmente um vinho único, só produzido em safras ideais. Um corte de Cabernet Sauvignon, Carménerè, Syrah, Carignan e a branca Viognier. Premiado nesta safra com Medalha de Ouro no Concurso Nacional do Chile é autêntico, elegante e muito equilibrado entre seus taninos e acidez. Um produto de luxo que não deixa a desejar. Ainda assim, fica numa faixa de preço cara, mas não absurda (R$ 200,00), valendo cada centavo pago.
 
 
Foi uma tarde instrutiva e agradável. Só tenho que agradecer ao amigo Menandro Rodrigues, da Winebrands, pela lembrança do convite.

Dica da Semana: vamos respeitar as tradições chilenas.
 
Anakena Enco Reserve Carménère 2011
 
Vermelho-rubi profundo, com reflexos violetas. No aroma revela notas de frutas negras, chocolate amargo e especiarias. Em boca apresenta médio corpo, frutadas e especiarias bem mescladas e taninos macios.
Harmonização: Ideal para acompanhar carnes guisadas, massas, lasanha e queijos.
 
 
 Winebrands – www.winebrands.com.br

Por que ‘Castas Nobres’?

O uso do adjetivo ‘nobre’ para definir uvas ou vinhos é muito antigo e tem raízes muito interessantes, afinal o que faz uma determinada varietal ser classificada como nobre em detrimento de outras?
 
Uma rápida pesquisa em textos de autores consagrados nos forneceu uma boa definição:
“Uvas nobres são as uvas tradicionalmente associadas com os vinhos da mais alta qualidade”.
Sauvignon Blanc, Riesling, Chardonnay, Pinot Noir, Cabernet Sauvignon e Merlot, são as eternas castas agraciadas com títulos como Rainha disto ou daquilo. Entretanto, alguns críticos, talvez sentindo a exagerada influência francesa nesta lista, substituem a Sauvignon Blanc e a Merlot pela excelente italiana Nebbiolo.
 
Ainda assim, resta uma dúvida: seriam realmente superiores os vinhos produzidos com estas uvas?
 
Posso ir mais longe: e as castas típicas do Novo Mundo, Zinfandel, Carménère, Malbec, etc., ou as ibéricas Tempranillo e Touriga Nacional, não se enquadram?
 
Apesar de apaixonante, este tema exige um pouco mais de informação para ser compreendido. Por trás da “qualidade” está o que é denominado ‘Estrutura’, algo como o esqueleto do vinho. Aqui está a diferença: só será percebida na hora da vinificação, da elaboração.
 
A mais simples demonstração de que realmente há uma diferença pode ser observada nas relações de grandes vinhos publicadas por revistas especializadas ou nos mais variados guias internacionais: desde que a indústria do vinho existe, esta pequena relação de ‘nobres’ domina o cenário. Não é à toa que a fama dos vinhos franceses perdura por séculos. Na relação apresentada, apenas a Riesling (que existe na Alsácia) e a Nebbiolo não são de Bordeaux ou da Bourgogne…
 
A estrutura de um vinho é difícil de ser explicada e entendida. Envolve múltiplos aspectos e o relacionamento entre eles: acidez, taninos, álcool, etc., que em última análise vai determinar sabores, aromas, capacidade de envelhecimento e outras características.
 
Um dos elementos mais importantes é a Textura. Pode parecer uma ideia um pouco tênue se compararmos com outros materiais como tecidos, madeiras ou cerâmicas, mas definitivamente há diferentes texturas na nossa bebida predileta. Esta qualidade está associada àquelas sensações de grande amplitude (de aromas e sabores), permanência no palato e o gole aveludado ou o seu oposto (áspero), entre outras. Novamente, sobressai o conjunto em vez de valores individuais.
 
Este talvez seja o segredo das castas nobres: bem vinificadas, nos presenteiam com uma formidável estrutura e tudo de bom que dela decorre.
 
Um velho e batido jargão faz muito sentido neste momento: “Antiguidade é posto”.
 
Não há mais como ignorar a qualidade dos vinhos produzidos, hoje, no Chile, na Califórnia, na Argentina e em outros países, alguns europeus. Mas, para que um dia suas castas emblemáticas sejam elevadas de categoria, só há um fator a ser considerado: tempo, muito tempo.

Dica da Semana: não precisa esperar séculos, pode ser consumido já!
 
Hardys Nottage Hill Merlot 2011
Um vinho australiano de muita presença em boca, fresco com leve traço de hortelã, sabores de fruta vermelhas maduras, e noz-moscada.
Sua textura de densidade média o torna versátil para acompanhar diversos pratos.

8 Argumentos questionáveis

Quando comecei a escrever sobre vinhos para O Boletim decidi seguir alguns cânones, por exemplo, usar o jargão típico dos enófilos, mesmo sabendo que nem sempre isto faria muito sentindo para os leitores. Alguns e-mails até sugeriram a elaboração de um glossário.
 
Parece que esta linguagem muito específica começou a incomodar alguns pesquisadores que decidiram medir, no mercado inglês que é considerado o maior do mundo, o que realmente valia a pena ou era interessante saber para o consumidor final. O resultado é surpreendente, mostrando do que a força do marketing é capaz: termos restritos à profissão do enólogo acabam na boca do povo que não tem a menor ideia do que estão falando. Mas fica bonito… Eis alguns exemplos.
 
1 – As Notas de Degustação – honestamente, algum leitor já comprou um vinho por que se sentiu atraído por este tipo de informação? Saber que o que está na garrafa tem “Cor púrpura com reflexos violáceos” é fundamental na hora de comprar um vinho?
 
O estudo inglês mostrou que não, mais de 55% das respostas foram negativas, muitas apontando que esta descrição nem sempre era clara. Apenas 9% dos entrevistados afirmou que escolheu um rótulo baseado numa descrição do produto.
 
O resultado desta pesquisa pode ser usado em qualquer mercado sem grandes alterações.
 
2 – A Madeira dos Barris de Carvalho – saber de qual bosque veio a madeira usada numa barrica se tornou ponto de honra. Se vier de Alliers ou Tronçais tanto melhor, algo como ‘está é “a” barrica’…
 
Bobagem!
 
Só os muito ingênuos acham que vão notar alguma diferença se usarem esta ou aquela madeira. Um ponto é fundamental: o carvalho americano e o francês são diferentes acrescentando aromas e sabores distintos ao vinho que neles permaneceu. Mas quem decide o resultado final é o enólogo, que vai dosar o produto até atingir sua meta. Honestamente, é quase impossível saber ao degustar um vinho qual a origem das barricas.
 
Mais um ponto para pensar: o “carvalho francês” também existe em florestas que por muitos anos ficaram inacessíveis por trás da Cortina de Ferro. Hoje em dia já é possível falar em carvalho esloveno ou romeno. Do ponto de vista científico são exatamente iguais ao francês. Quem se arrisca a identificar um ou outro? Mais uma informação pouco relevante. Mas quanto prestígio…
 
3 – Vinhedo ou Parcela Únicos – esta frase está na moda e aumenta significativamente o preço dos vinhos que a trazem em seus rótulos. Se for realmente verdade que uma determinada vinícola faz regularmente vinhos somente com frutos obtidos de uma região específica de seu vinhedo, vamos ter que acreditar que o clima, naquela região, é imutável.
 
Não é bem assim. Ninguém dúvida que as melhores uvas vão para os melhores vinhos. Também é seguro afirmar que esta ou aquela micro região produz frutos de melhor qualidade. A dúvida fica por conta de o volume de uvas ser suficiente para elaborar uma quantidade de vinho que possa ser comercializada.
 
Este tipo de informação deveria ficar restrita aos Agrônomos e Enólogos, só a eles interessa. Mas vende o produto. O próximo passo vai ser algo como “Parreiras Selecionadas Individualmente”…
 
Vocês acreditam? Papai Noel existe?
 
4 – O Melhor Sistema de Fechar a Garrafa – Rolhas de cortiça versus o resto do mundo, uma batalha num ringue internacional: neste corner… e o juiz será o consumidor final.
 
Há muito para ser dito neste tema. O mais importante é: tampa de rosca vai ser o padrão em pouco tempo. A cortiça está cada vez mais cara, é produzida por um cartel, e para determinadas regiões do mundo é quase inacessível, por exemplo, a Nova Zelândia: mesmo seus vinhos top usam tampas de rosca.
 
Óbvio que vinhos icônicos e famosos vão continuar com o mesmo sistema que usam há séculos. Sempre funcionou e vai continuar funcionando. Trocar o sistema de fechamento de um vinho destes pode causar estranheza e desconfiança. A chave neste caso é que o preço da rolha não vai alterar em nada o custo final.
 
Mas o que dizer de um vinho do dia a dia? Para uma garrafa que custe 50 reais num supermercado não importa como ela foi fechada: quanto menor o custo melhor, desde que o sistema empregado cumpra sua função de vedação protegendo a bebida, melhor.
 
Deixem esta preocupação para os enólogos e aceitem sua decisão. Sempre será a melhor escolha para aquele produto.
 
5 – Dia e Hora da Colheita – este dado é de um preciosismo e de uma inutilidade assombrosos. Levante a mão o consumidor que for capaz de perceber esta nuance ao consumir um vinho. Nem o famoso Parker, aposto!
 
Pode parecer inverídico, mas já encontrei, num contra rótulo, um minucioso texto informando que as uvas teriam sido colhidas num dia do mês de Abril, à tarde. Em outro vinho, as uvas foram colhidas numa amena noite de março. Para quem isto é relevante afinal? Acho que a turma do Marketing pegou pesado aqui.
 
6 – Proporções de um Corte – apesar de ser uma informação relevante, estão levando isto ao extremo. É óbvio que fica frustrante ler um rótulo para descobrir que é um vinho obtido a partir de “uvas viníferas europeias”. Mas também não me adianta nada saber que um corte foi obtido a partir de 11,5% Cabernet, 15,7% de Carmenére, 13,87% de Malbec, 2,34% de Syrah e mais uma infinidade de uvas. Não precisamos nem desta, nem da outra informação; não ajudam em nada, confundem.
 
A grande maioria dos vinhos ditos varietais, ao contrário do que imaginamos, pode receber uma quantidade pequena de outras uvas que permitem um melhor acabamento do produto: pode melhorar a cor, aroma, tanino etc. Esta adição é legal, não precisa ser declarada e não muda a característica principal da casta, ou seja, um Cabernet com 10% de Merlot continua sendo um Cabernet.
 
Por outro lado, se um vinho for um corte em que as diferentes castas tiverem pesos semelhantes, está é uma informação válida que deve ser divulgada claramente. Fora disto, deixe para os ‘enochatos’.
 
7 – Teor Alcoólico – o que se discute aqui é se a quantidade de álcool num vinho tem realmente a importância que se atribui a este dado, que consta dos rótulos por obrigação legal. Países produtores que têm seus vinhedos em regiões de muito sol produzem vinhos mais alcoólicos, os frutos terão maior teor de açúcar para ser convertido. Mas este fator sozinho não torna um vinho melhor ou pior para ser consumido. Se realmente isto for um ponto de discussão válido é melhor esquecer o vinho e beber suco de uva: teor zero!
 
8 – A Cuba de Fermentação – a mais recente invencionice dos marqueteiros que resolveram distinguir os vinhos pelos recipientes em que são fermentados. Desta forma seriam sensivelmente diferentes vinhos que foram elaborados em tanques de inox, em barricas de madeira, piscinas de concreto (com ou sem epóxi) e até na última novidade um recipiente de forma oval construído em concreto.
 
Isto faz diferença? Creio que só para o enólogo ou algum especialista do assunto. Em todos os casos o resultado é vinho. Só de curiosidade, acho que seria mais útil saber qual a levedura utilizada, assim poderia esperar pela presença, ou não, de determinados aromas e sabores. O resto é subjetivo e fica a critério do leitor.

Dica da Semana: um excelente Syrah do Chile com uma característica que serve de exemplo para tudo que foi dito acima.
 
Polkura Syrah 2008
 
Composição: 94% Syrah, 2% Malbec, 1,5% Tempranillo, 5% Grenache Noir, 1% Viognier
Colheita: 22 de abril – 2 de maio 2007
Álcool: 14,6%; Açúcar: 2,6 g/l; Acidez: 5,9 g/l; PH: 3,62
Cor violáceo profundo. Aromas de pimenta branca e negra, acompanhado de frutas negras, ervas e aniz. Vinho de grande corpo, elegante, com taninos muito intensos, porém suaves. Acidez natural e doçura de álcool bem equilibradas. O vinho é muito complexo, integrando os diversos sabores que emergem no paladar. Final longo.
 
Precisa disto tudo ou bastaria dizer: Ótimo vinho!
 

Em Petit Comité

Era pequeno mesmo e bem que o título de hoje poderia ser substituído por “A Dois”. Éramos eu e minha esposa, só. Temos esta cumplicidade e o gosto por bons vinhos e boa gastronomia. Sempre que viajamos ficamos atentos às novidades em ambos os campos.
 
Uma das viagens de maior expectativa e que resultou num programa totalmente diferente do que pretendíamos foi uma viagem ao Chile. Havíamos comprado as passagens com alguma antecedência, só não podíamos prever o grande terremoto de 2010. Pegou-nos de surpresa!
 
Viajamos no limite de validade de nossos bilhetes, alguns meses depois da catástrofe. Infelizmente as vinícolas estavam todas fechadas para reformas, algumas foram muito danificadas. Houve uma única exceção, a Vinícola Santa Rita próxima à capital Santiago. Fomos muito bem recebidos e degustamos um bom almoço no restaurante improvisado numa tenda, regado com o excelente Medalla Real.
 
Com a falta do principal objetivo de visitar as principais produtoras de vinhos, optamos por fazer um programa bem turístico, compras, excursões, city tour, museus, como qualquer outro viajante comum.
 
Descobrimos coisas bem interessantes e outras bem frustrantes, por exemplo: o chileno não tem o hábito de beber vinhos. Por esta razão, as maiorias das lojas de vinhos de Santiago são para turistas, com um catálogo de produtos mais que convencional e conservador. Chegava a ser decepcionante. Lindas lojas que ofereciam do manjadíssimo Casillero del Diablo ao caro Don Melchor, tudo muito convencional, zero de novidades.
 
Como bom ‘Aquariano’, não era isto que queria. Naquela época começou a surgir o movimento dos vinhos de garagem, MOVI (Movimiento de Viñateros Independientes), com alguns rótulos já lançados no mercado. Mas não estávamos seguros do que comprar…
 
A busca continuou por alguns supermercados, shoppings e lojas de rua, mas o quadro se repetia. Não me recordo da razão, acho que foi um pouco pela distância, deixamos para visitar o Shopping Alto las Condes já na véspera de retornamos.
 
Situado no mais elegante bairro da capital, é conhecido como um local para pessoas de maior poder aquisitivo, ao contrário do Parque Arauco que é mais popular. Havia uma loja de vinhos a omnipresente ‘El Mundo del Vino’ e um clube, La CAV ou ‘Club de Amantes del Vino’. Esta era novidade, entramos e fomos recebidos em português por uma simpática brasileira que ali trabalhava. Ponto positivo, mas ficamos intrigados com a rapidez da identificação, será que estávamos tão óbvios assim? A explicação veio em seguida, ela havia nos escutado ao decidirmos visitar a loja.
 
 
Muito interessante, começando pela organização das prateleiras, arrumadas pela qualidade seguindo um ranking próprio a partir das preferências dos clientes em degustações promovidas regularmente. Havia vinhos de diversos países, inclusive do Chile. Esta democracia enológica nos encantou. Fomos convidados para uma degustação. Não era vinho comum, só top de linha!
 
Perfeito, finalmente encontramos o que queríamos!
 
Uma das compras foi o melhor vinho provado, o Coyam, produzido com uvas de cultivo orgânico e considerado um ícone internacional. Ficamos com um 2007 que foi degustado ‘a dois’ nesta semana que passou. Os 6 anos de repouso lhe fizeram bem, o vinho estava delicioso. Um daqueles que ao ser consumido não deixa dúvida que é um grande vinho, até mesmo para um leigo.
 
 
O corte, naquela safra, foi elaborado com 38% Syrah, 21% Cabernet Sauvignon, 21% Carménère, 17% Merlot, 2% Petit Verdot e 1% Mourvedre. Uma verdadeira alquimia. Uma vinificação cheia de cuidados como a tripla seleção manual dos grãos, fermentação com leveduras naturais, longo de tempo de maturação com as casacas e 13 meses de amadurecimento em barris de carvalho de 1º uso, 80% franceses e 20% americanos.
 
Esta delícia tinha uma cor violeta bem marcante e aromas de frutas negras maduras, frutas vermelhas, groselha e frutos do bosque, em sintonia com as notas de baunilha da madeira, furtivas notas minerais, caramelo e chocolate. Excelente equilíbrio no palato, ótimo corpo, arredondado, taninos presentes e suaves. Um final interminável. Um vinho que pode ser guardado por 14 ou 15 anos. Tem estrutura para tal.
 
Na gastronomia é um vinho complexo que pede pratos bem elaborados como carnes de 1ª linha grelhadas, gado Wagyu, Angus ou carneiro, acompanhado de batatas gratinadas, arroz e molhos condimentados.
 
Não é para qualquer um, mas não tem preço exorbitante, por isto mesmo é a nossa…

Dica da Semana: um belo vinho do chileno, ótimo companheiro para estes dias mais frios.
 
Coyam 2010
Castas: 34% Syrah, 31% Merlot, 17% Carmenére,12% Cabernet Sauvignon, 3% Malbec e 2% Mourvedre
Um excelente investimento para o futuro
90 Pontos – Robert Parker (Safra 2009), 90 Pontos – WineSpectator (Safra 2009)
 
 

Degustando Vinhos Icônicos

A coluna desta semana tem como pano de fundo os e-mails de alguns leitores sobre a experiência descrita na postagem anterior.
 
Basicamente, notei certa austeridade com relação ao tipo de vinho consumido, uma incredulidade com relação às massas e o tal negócio do ‘tem que’.
 
Vamos quebrar algumas regras, não se espantem. A primeira que vou jogar no lixo é o ‘tem que’:
 
Nenhum vinho tem que harmonizar com nada!
 
As tradicionais regras de harmonização, constantemente citadas aqui e em outras publicações vinícolas, têm, por objetivo, fornecer sugestões – nada mais que isto – para tornar a nossa experiência ao degustar um vinho em algo melhor. Mas certamente podemos beber qualquer vinho apenas pensando na vida ou com um pão fresquinho e manteiga. Garanto que vai combinar.
 
No momento que algum enófilo botou na cabeça que este ou aquele caldo tem que ser consumido ‘exatamente’ de uma maneira, estragou tudo! Degustar um bom vinho é uma forma de quebrar regras, romper com tabus, sonhar, experimentar. Se der errado, ótimo! Já sabemos o que não fazer na próxima oportunidade.
 
 
O segundo tema que vou abordar, de modo resumido, é este respeito exagerado por um vinho de sonho. Eu não consigo imaginar comprar ou ganhar uma daquelas garrafas que existem na nossa imaginação e ficar o resto da vida olhando para ela. Vou bebê-la mais cedo ou mais tarde. Pode até ser que eu espere uma ocasião especial, mas o destino será o mesmo de uma garrafa comprada no supermercado por uns poucos trocados.
 
Então onde está a diferença?
 
Não há uma resposta simples. Cada um vai ter uma experiência diferente com os vinhos que provar. Gosto muito de citar a minha mulher. Ela resume nos 5 dedos de uma mão tudo o que precisamos saber: tinto, branco, rosé, gosto e não gosto.
 
 
Muitas vezes é difícil se apreciar um vinho se o nosso olfato e paladar não foi devidamente treinado. Para isto, só com algum tempo de estrada. Somente então seremos capazes de diferenciar (e apreciar) um Brunello de um Chianti, um Bordeaux de um corte Bordalês qualquer, ou mesmo um bom vinho de boa relação custo x benefício de uma caríssima garrafa que não tem um bom conteúdo.
 
Leva tempo, mas vale a pena. É a partir deste ponto que valorizamos (alguns) vinhos icônicos e ficamos muito satisfeitos quando conseguimos comprá-los ou ganhá-los. Mas isto não pode virar um problema na hora de degustar.
 
Eis uma pequena aventura para solidificar estas ideias:
 
Numa outra ocasião, a vítima era o Don Melchor, um ícone chileno. Um espetacular Cabernet elaborado com uvas de diferentes vinhedos. Um amigo ganhou a garrafa e aquilo quase virou uma batata quente. No barato custa R$ 400,00, mas não precisa de pompa e circunstância para prová-lo. Respeito, e muito, quem o presenteou.
 
Combinamos um almoço com mais um na mesa, três pessoas. Escolhemos um restaurante de comida internacional. Como sempre, abrimos com um espumante, pães do tipo italiano, presunto cru e burrata, tudo regado com bom azeite.
 
Uma explicação: isto tudo tem a finalidade de preparar o palato para um tipo de vinho com uma casta sabidamente tânica.
 
Tendo isto em mente escolhemos os pratos:
Eu optei por uma Paleta de Cordeiro;
O outro convidado encarou um Osso Buco;
O dono da garrafa arriscou optando por um elaborado espaguete com frutos do mar.
 
 
Os leitores já devem estar especulando quem acertou e quem errou. Eu posso falar com segurança da minha parte: estava perfeito. Posso pressupor que o outro prato de carne também foi uma boa harmonização. Mas só quem o consumiu pode avaliar. Restou a massa e o dono da garrafa: pela expressão dele estava muito satisfeito e ficou feliz com toda a experiência.
 
Mas o vinho teve uma parte importante neste ‘causo’. Estava muito bom, com os taninos perfeitamente arredondados, era muito frutado o que encobria a tal secura na boca. Um senhor vinho como poucos que provei até hoje. Confesso que fiquei tentado para deixar um pouco na taça e provar com uma mousse de chocolate na sobremesa. Tenho certeza que ficaria ótimo.
 
Por fim o capítulo “Massas”.
 
Macarrão é um alimento neutro, sem gosto marcante. Por esta razão é tão versátil. Mesmo os do tipo recheados como Canelones, Raviólis, etc., nunca são intensos no seu conteúdo, para permitir aos Chefs, profissionais ou domésticos, criarem os mais sofisticados molhos. Acaba sendo um desafio para quem pretenda harmonizar. Mais regrinhas a serem quebradas:
 
Não é obrigatório um tinto italiano para acompanhar massas;
 
Tintos não são a única opção.
 
Alguns exemplos de massas que derrubam esta ‘ditadura’:
 
Massa com frutos do mar;
 
Ravióli de pera com molho de Brie (eu usaria um branco demi-sec);
 
Massas com recheio ou molho de abóbora.
 
Um conselho final: experimente!
 
Dica da Semana: um ícone!
 
Coyam Orgânico
Vinho produzido por Vinhedos Emiliana, Chile, com: 41% Syrah, 29% Carménère, 20% Merlot, 7% Cabernet Sauvignon, Mourvedre 2%, 1% Petit Verdot
Um vinho de intensa coloração violeta, lembrando ameixa vermelha. Nariz que expressa aromas de frutos vermelhos maduros, ameixas, amoras e frutas negras que fundem elegantemente com notas de especiarias, terra, e um toque de baunilha doce. Bem equilibrado e grande corpo no palato, com boa estrutura e taninos macios, redondos.
Harmonização: deve ser acompanhado por uma grande amplitude de pratos e sabores como: lombo com batatas gratinadas, costelas de cabrito assado ao forno, entre outros.
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