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Organizando uma reunião com vinhos

Com o fim do verão já podemos imaginar um clima mais ameno e propício a beber aqueles vinhos que estão na adega aguardando uma ocasião adequada. Mas vocês sabem organizar uma reunião de amigos para apreciar a nossa bebida favorita?
 
A maioria já deve estar imaginando o tradicionalíssimo “Queijos e Vinhos”, que é uma espécie de porto seguro e simples de organizar. Mas a coluna desta semana quer ir além, que tal dar uma incrementada nesta reunião de modo a torná-la inesquecível?
 
Existem diversos caminhos para serem explorados e as sugestões que serão apresentadas podem ser aproveitadas em qualquer destes caminhos.
 
Para evitar surpresas de última hora, precisamos estar minimamente equipados:
 
– taças de espumante e vinhos (branco e tinto) em número suficiente para todos os convidados;
 
– saca-rolhas, decantador ou aerador, termômetro, entre outros acessórios;
 
– tomem por base uma quantidade de aproximadamente 1/2 garrafa de vinho por participante. Por exemplo: para um grupo de 8 pessoas o ideal seriam 5 garrafas de vinho;
 
– observe a seguinte ordem para servir os vinhos:
 
. Espumantes
 
. Vinhos Brancos leves (Sauvignon Blanc, Alvarinho)
 
. Vinhos Brancos encorpados (Chardonnay, madeirados)
 
. Rosados
 
. Tintos leves (Gamay, Pinot Noir)
 
. Tintos encorpados ou alcoólicos (Cabernet, Syrah)
 
. Vinhos de Sobremesa ou Fortificados
 
Simplificações podem ser feitas. Hoje é bastante comum usar um único tipo de taça para todos os vinhos. Escolha um tamanho entre a clássica para vinhos brancos e as maiores para vinhos tintos. Prefira as de cristal ou meio-cristal, perfeitamente transparentes. Pode parecer uma mania boba, mas bordas “finas” são fundamentais.
 
Que tal um jantar informal ou suas variações?
 
Apesar do título pomposo, isto nada mais é do que um prato quente oferecido em algum momento da noite. Algumas coisas devem ser decididas de antemão, por exemplo, o que vai ser servido? Isto implicará no que vai harmonizar com o prato.
 
Outro ponto que achamos importante considerar é o custo da brincadeira.
 
Lembrem-se que um jantar num bom restaurante, com 1 ou 2 garrafas de vinho não sai por menos que 180,00 ou 200,00 reais por cabeça. Em casa podemos preparar uma bela festa gastando muito menos que isto. Não se acanhem em rachar a despesa. Uma forma que vai fazer com que todos participem é pedir aos convidados que contribuam, seja com os vinhos, previamente definidos, a sobremesa ou mesmo os pães e salgadinhos. O anfitrião entra com a casa e o prato principal.
 
Na semana passada organizamos uma reunião como esta aqui em casa.
 
Inicialmente seria servido um Arroz de Lula, mas descobrimos que um dos casais convidados tinha problemas com frutos do mar. Mudamos para um Escondidinho de Carne Seca, que acabou sendo um sucesso. Os acompanhamentos eram Arroz de Jasmim e Salada.
 
Para abrir os trabalhos havia um bloco de patê acompanhado de geleia de frutas vermelhas e uma forma de queijo Camembert. Torradinhas, Nachos e outros salgadinhos completavam o quadro.
 
Para preparar o paladar foram derrubadas duas garrafas de espumante, um Cave Pericó Champenoise Nature, de Santa Catarina, excelente por sinal, seguido de um Cave Geisse Brut, velho conhecido nosso. Tudo servido em longas flûtes e num ritmo lento e gostoso.
 
 
O Escondidinho foi servido por volta das 22:00. Estava tudo previamente montado restando apenas colocar no forno por alguns minutos e levar para os convivas.
 
Para harmonizar com o prato quente selecionamos um Inominable Lote III, interessante corte de diversas safras e castas (5 pelo menos) elaborado pela vinícola Villagio Grando, que estava guardado há algum tempo. Foi decantado no final da tarde repousando até o momento de degustar.
 
Para provocar os nossos amigos, deixamos a garrafa à vista já sabendo que todos só olhavam para o decantador.
 
Não deu outra, ninguém descobriu qual era o vinho…
 
Uma segundo vinho foi aberto, o Lagarde Guarda, corte de Malbec, Cabernet Sauvignon e outras castas, servido através de um aerador. Ficou bem interessante a comparação com a preferência dividida entre o Nacional e o Argentino.
 
 
Para encerrar a noite sorvete de baunilha e biscoitos de chocolate acompanhados de uma tacinha de Licor de Tannat, uma especialidade uruguaia. Já passava da meia-noite quando todos se despediram.
 
 
Não fizemos as contas, mas ficou infinitamente mais barato do que se gastaria na noite carioca, sem falar que o ambiente era insuperável. Um único e óbvio senão foi arrumar a casa no sábado de manhã…
 
Existem diversos desdobramentos possíveis nesta linha:
 
. Vinhos de uma determinada região e a culinária correspondente;
 
. Vinhos de uma mesma casta elaborado em diferentes regiões;
 
. Novo Mundo x Velho Mundo – esta é clássica e bem fácil de organizar;
 
. Vinhos de uma mesma faixa de preço. Muito interessante, fixe o valor e o tipo (branco ou tinto) e deixe que cada um escolha o que vai trazer. Divertido!
 
Para reuniões mais sofisticadas é perfeitamente possível fazer comparações de grandes vinhos, safras e até mesmo vinhos “elegantes” ou “icônicos”.

Dica da Semana:  um vinhaço lá da Califórnia. Escolhido recentemente como o melhor do Encontro de Vinhos 2014 no Rio de Janeiro
 

Mettler – Old Vines Zinfandel Epicenter

No nariz, aromas de ameixa, morangos e baunilha seguidos de um quê de anis.Na boca, complexos sabores de ameixa, cerejas negras, frutas do bosque escuras e tabaco.Tudo equilibrado com chocolate amargo que envolve o pálato.Taninos aveludados são mantidos em vibrante suco com acidez presente.
Harmoniza com carnes vermelhas, embutidos e massas com molho vermelho.

Aromas! – Final

Os aromas mais comuns em tintos ou brancos não se resumem aos de frutas. Há muitos outros que podem ser identificados por olfatos bem treinados. Fizemos a sugestão do “dever de casa”, mas isto não era obrigatório e nem necessário para apreciar um bom vinho. Era, apenas, desejável.
 
É sabido que os aromas de nossos alimentos e bebidas influenciam o nosso paladar: o cheiro que sentimos definirá o gosto em nosso palato. Isto vale para o vinho embora muito do que se sente no nariz não se repete com a mesma intensidade na boca.
 
Para completar a nossa escala aromática, vamos passear pelas notas que tem origem nas flores, especiarias, ervas, madeira e alguns outros mais raros e curiosos. (apresentaremos os mais comuns apenas)
 
Começamos pelos Tintos:
 
Aromas Florais:
Eucalipto, Hibisco, Lavanda e Rosa.
Aromas Herbáceos e de Especiarias:
Alecrim, Anis, Baunilha, Canela, Hortelã/Menta Orégano, Pimenta do Reino e Sálvia.
Aromas Madeirados e Outros:
Café, Chá Preto, Chocolate, Cogumelos (terra), Couro, Cravo da Índia, Defumado (fumaça), Endro (Dill), Folhas Secas, Grafite, Noz Moscada, Sândalo, Tabaco e Toucinho (bacon). Pode-se acrescentar, novamente, Baunilha, que surge durante o contato com o Carvalho, notadamente o de origem Americana.
 
“Grafite” parece fora de lugar, mas ele existe é já foi um aroma peculiar em alguma fase de nossas vidas, afinal, apontamos muitos lápis…
 
Vinhos Brancos:
 
Aromas Florais:
Flores Brancas, Flor de Laranjeira, Madressilva e Rosa.
Aromas Herbáceos e de Especiarias:
Açafrão, Aipo, Baunilha, Capim, Erva Cidreira, Gengibre, Tomilho e Pimenta Dedo de Moça.
Aromas Madeirados e Outros:
Açúcar Queimado, Amêndoa, Caramelo, Cera de Abelha, Coco, Cogumelos, Creme de Leite, Derivados de Petróleo (Querosene), Manteiga, Mel, Noz Moscada, Pedra de Isqueiro, Pó de Giz, Solução Salina e também Baunilha como no caso do vinho tinto.
 
 
“Pedra de Isqueiro” é aquele aroma que sentimos quando acionamos este acessório e sai uma faísca sem a chama.
 
Querosene, embora seja um aroma quase desagradável, é muito comum nos Riesling alemães ou alsacianos, sendo um indicativo de boa qualidade.
 
Giz ou Pó de Giz é nosso velho conhecido dos tempos de bancos escolares. Um dos aromas minerais mais fáceis de identificar. Outros seriam o de cascalho e terra molhada.
 
Algumas castas têm características mais marcantes e fáceis de perceber. Eis algumas delas:
 
– Cabernet Sauvignon, Malbec, Tempranillo e Syrah tem predominância das Frutas Negras;
 
– Pinot Noir, Grenache, Sangiovese, Merlot e Nebbiolo tem predominância das Frutas Vermelhas;
 
– Viognier, Chenin Blanc, Moscato, Sauvignon Blanc e Gewurtztraminer apresentam com mais facilidade os aromas de frutas de árvores;
 
– Semillon, Chardonnay, Riesling e Pinot Grigio apresentam, quase sempre, aromas cítricos.
 
Dependendo do binômio vinho/casta os aromas podem denunciar alguma coisa a mais sobre o que vamos beber. Os especialistas nas degustações às cegas usam muito estas técnicas. Por exemplo:
 
– num bom Chardonnay o principal aroma de fruta pode variar do limão até o abacaxi, indicando um vinho mais jovem ou mais maduro;
 
– Se um Chardonnay (principalmente) apresentar aromas e sabores “amanteigados” significa que passou por uma fermentação malolática e/ou por madeira;
 
– tintos com aromas de Pimenta do Reino e minerais (cascalho), dependendo da intensidade dos taninos, podem indicar vinhos de Bordeaux (tânicos), Rhône (redondos) ou mesmo alguns italianos se houver algum aroma de fruta por trás;
 
Enfim, há uma série interminável de combinações possíveis e só com muitas “horas de taça” nos tornaremos “experts” neste delicioso assunto.
 

 
Dica da Semana: uma das minhas castas brancas preferidas.
 
 
TERRE DEL FOHN PINOT GRIGIO – 2010 – $
Produtor:Cantine Monfort
Região: Alto Ádige, Trentino, Itália
Delicado, aromático, com sabores encorpados no palato, e um final elegante e bem equilibrado. Excelente como aperitivo, com peixes e carnes brancas.

Temperatura de Serviço dos Vinhos Tintos: Mito, Tabu ou Ciência?

Quando escrevemos sobre desmistificar certas lendas do vinho, recebemos algumas mensagens cobrando uma explicação sobre o tema “Temperatura”. Respondemos que este assunto estaria mais perto de um Tabu do que um mito propriamente dito. Há razões de sobra para acreditar nisto!
 
Não somos enólogos, apenas estudiosos sobre vinhos, com alguns cursos, muitas visitas a centros produtores e uma boa biblioteca que nos orienta nas pesquisas e experimentações.
 
Temperatura de serviço é uma fonte constante de discussão entre enófilos. Qualquer importadora de vinhos ou boa loja de varejo vai oferecer uma “Tabela” indicando o ponto certo para degustar o nosso rótulo predileto. Para piorar as coisas, existem diferenças sensíveis nestas tabelinhas…
 
Para compreender o que acontece com o vinho quando se altera a temperatura de serviço é necessário que se explique alguns fenômenos da física e da química, algo bastante escorregadio e de difícil compreensão pela maioria.
 
Em termos simples, na “temperatura ideal” o vinho desprende uma série de compostos aromáticos e parte do álcool, retém outros e tem, ainda, a capacidade de absorver compostos presentes no ar que respiramos principalmente Dióxido de Carbono (CO2) ou como preferem alguns autores, ‘absorver oxigênio’.
 
À medida que a temperatura aumenta ou diminui, este delicado equilíbrio se altera mudando os aromas e sabores de nossa bebida. Isto é facilmente percebido naquelas taças que ficam esquecidas sobre a mesa, por um algum tempo, aumentando naturalmente a temperatura: o aroma de álcool se torna dominante obliterando os demais.
 
Outra maneira de observar esta variação de aromas é na fase em afirmamos que o vinho “precisa respirar ou ainda não abriu”, ou seja, ainda não liberou os principais aromas e tem o paladar bastante tânico ou travado, o que irá mudar radicalmente em poucos minutos com a ajuda daquela leve agitação ao girarmos a taça e do aumento da temperatura que vai se aproximar daquela do ambiente. Do ponto de vista científico, não fizemos nada mais do que ajustar o vinho às condições ambientais: ele chegou ao seu ponto de equilíbrio.
 
Mas há mais coisas para compreendermos.
 
A variação de temperatura, sozinha, não é a única responsável por isto tudo. Entra em cena outro fator, a Pressão Atmosférica, um valor que, a grosso modo, representa o peso exercido pela camada atmosférica sobre um determinado local: ao nível do mar este valor é maior do que no topo de uma alta montanha, por exemplo.
 
Complicou?
 
Muito! Agora temos que lidar com mais uma variável que está intrinsicamente ligada a uma localização geográfica e que regula diretamente a quantidade de CO2 absorvida pelo vinho. As mais recentes pesquisas demonstraram que a maior ou menor presença deste composto tem influência direta no sabor do vinho. Quem já se atreveu a degustar uma taça num voo internacional sabe do que estamos falando: o gosto é diferente, muitas vezes ruim. Isto se deve à baixa absorção decorrente da pouca pressão atmosférica neste ambiente, apesar da cabine do avião ser pressurizada.
 
Para tornar esta coluna mais palatável vamos fazer uso de uma analogia. Levando-se em conta que, na composição química do vinho, a água representa de 85% a 90% do volume, podemos afirmar que há uma semelhança comportamental entre ambos. Não estaríamos errando muito ao afirmar que o vinho, com relação à variação da temperatura e da pressão atmosférica, se comporta da mesma maneira que a água.
 
O segundo componente de peso no vinho é o álcool, com porcentagens que variam de 7% a 24% (etanol, glicerol, metanol, isopropil, etc.).
 
Este dois gráficos a seguir são bem conhecidos:
 
o 1º mostra o estado da água em relação à variação da temperatura: sólido abaixo de 0ºC, líquido entre 0ºC e 100ºC e gasoso acima deste.
 
O segundo gráfico mostra o comportamento do Etanol, líquido até cerca de 78ºC e gasoso a partir deste ponto. (fonte: Wikipédia e www.ebah.com.br)
 
 
 
Nestes dois casos, durante a fase líquida, à medida que a temperatura sobe começa um processo denominado “evapotranspiração” que equivale dizer que as frações mais voláteis vão passando para a fase gasosa até chegar ao ponto de ebulição quando todo o resto muda de fase. No caso do vinho podemos observar isto através da evolução dos aromas e sabores durante uma degustação.
 
Estes resultados são válidos para uma determinada condição de Pressão Atmosférica chamada de “Condição Normal”, que equivale à do nível do mar.
 
A tabela resumida abaixo demonstra o que acontece com a água quando fixamos um ponto da curva, neste caso o “ponto de ebulição” e alteramos a pressão, por exemplo, fervendo água em diferentes altitudes:
 
 
Ou seja, em uma região como a de Mendoza, na Argentina, onde alguns dos melhores Malbec que tanto apreciamos são produzidos na altitude de 1500m, a água ferveria a 95º C (a cidade está a 750m de altitude). Este fenômeno, muito importante, é explorado pelas panelas de pressão tão comuns em nossas cozinhas: aumentando-se a pressão o alimento é cozido a uma temperatura menor, mais rápido e com pouco consumo de gás ou eletricidade.
 
Mas o que isto tem a ver com o nosso vinho?
 
Tudo! Esta é a chave para entender um ponto importantíssimo: o comportamento da nossa bebida favorita vai mudar de acordo com o local em que vamos consumi-la. Para cada um vai haver uma temperatura ideal de consumo, diretamente relacionada com a pressão atmosférica local ou com a altitude, que regulará a quantidade de C02 absorvida em uma unidade de tempo. Isto vale, inclusive, para a elaboração dos vinhos: os chamados “de altitude” vão se comportar de forma diferente daqueles produzidos ao nível do mar.
 
Simplificando: pelo exposto, um vinho só vai se comportar como o enólogo previu no local onde foi elaborado. A temperatura originalmente indicada deverá sofrer correções para qualquer outro lugar do mundo uma vez que não podemos corrigir a Pressão Atmosférica. As diferenças podem até ser desprezíveis, mas sempre vão existir.
 
Se for um vinho produzido em grandes altitudes, estas correções podem ser significativas, algo perto dos 4º ou 5º de variação para uma cidade ao nível do mar.
 
Mas ninguém está se importando muito com isto, a força dos “18º C” para os tintos é grande. A regra tem origem na Europa e se tornou padrão mundial baseada no seguinte fato:
 
“18º C é a temperatura média anual em Bordeaux”.
 
(Há algum tempo pesquiso a origem deste conhecido valor, sem muito sucesso. Sou engenheiro e respostas subjetivas não me satisfazem, mas vou ter que conviver com este fato, aceito, tacitamente, pela grande maioria)…
 
Gostaríamos, pelo menos, que a indicação de uma temperatura de serviço de um vinho fosse acompanhada ou da pressão atmosférica ou de uma localização geográfica: “Servir a 18º C @ 760 mm Hg”.
 
Definitivamente: beber um vinho em Bordeaux é diferente de beber este mesmo vinho no Rio ou em Mendoza e assim por diante.
 
Alguns fatos interessantes surgiram nas pesquisas. Observem a tabela a seguir com dados meteorológicos de Bordeaux: (fonte: http://www.climatemps.com/)
 
 
Na 1ª linha fica claro que a temperatura média anual máxima é 18º C.
 
A pressão atmosférica, pesquisada em outra fonte, varia entre 757 mm Hg e 767 mm Hg. (Fonte: NOAA)
 
Vamos comparar com Mendoza:
 
 
A temperatura média máxima é 23º C e a pressão barométrica varia entre 640 mm Hg e 762 mm Hg. (mesmas fontes)
 
Interpolando na tabelinha apresentada, podemos concluir que existe uma variação, para menos, de aproximadamente 4º C na temperatura de ebulição da água em relação a Bordeaux. A mesma linha de raciocínio, dentro de certos limites, pode ser aplicada ao vinho.
 
Um exemplo: se um produtor argentino recomenda que seu vinho seja consumido a 18º C, em sua vinícola que está situada nos 1500m, a temperatura corrigida, desta forma, para Bordeaux, poderia subir alguns graus a mais chegando até aos improváveis 22º C, dependo das condições atmosféricas do dia de consumo. Para a maioria dos autores isto é um absurdo.
 
Mas a ciência demonstra que não! (alguns autores mais recentes já admitem uma variação de 2 ou 3 graus em relação às temperaturas de serviço)
 
Como proceder?
 
1 – depois desta explicação complexa e, esperamos, extremamente didática e esclarecedora, acreditamos que ficou claro que as temperaturas de serviço indicadas são apenas referências.
 
2 – seguindo neste espírito, sempre é melhor servir o vinho numa temperatura mais baixa deixando que ele se adeque ao ambiente já na taça. Em poucas palavras, sirva aos 18º C ou equivalente, mas espere um pouco antes de degustá-lo.
 
3 – na grande maioria das vezes os vinhos vão “melhorar” na taça. “Abriu”, afirmam alguns enófilos, “respirou” dizem outros. Na verdade o vinho atingiu a temperatura correta, liberando e absorvendo o que deveria nas devidas proporções. Certamente será uma temperatura sensivelmente diferente da que foi servido. Para tirar dúvidas, esta é a hora de usar o termômetro!
 
4 – O fator ‘tempo’, de importância fundamental, será regido pela pressão barométrica local: quanto maior mais rápida a absorção de CO2 sera menor o espaço de tempo em que o vinho vai se comportar como deveria.
 
Um último conselho: experimente!
 
Lembrando, sempre, que gosto é um assunto pessoal, o importante é degustá-lo de acordo com nossas preferências, mais frios ou mais quentes. Cada tipo de vinho vai ter o seu ponto de equilíbrio, sendo quase impossível generalizar. O ideal é aprendermos a ajustar estas variáveis de acordo com o paladar de cada um para que a experiência seja ótima.
 
Não sejam escravos de regras fixas ou de tabelas burras!

Dica da Semana:  um rosado para ajudar a superar este verão.
 
Kaiken Rosé 2011 
Um vinho argentino (Mendoza) incrivelmente fresco e equilibrado, seco, mas dotado de cativantes aromas de frutas vermelhas.
100% Malbec.
Harmonização: Carne branca, saladas e comida japonesa.
Temperatura de Serviço: 13º a 16º C

Quebrando alguns mitos – Final

#6: Os críticos de vinhos sempre dão as melhores dicas…
 
Para finalizar esta primeira série sobre a mitologia do enófilo, vamos tocar num assunto muito delicado. Pode até ofender alguns profissionais, mas o nosso objetivo é explicar os fatos.
 
Começamos usando o próprio exemplo desta coluna. Pelas nossas contas, esta seria a de nº 140 e excetuando uma única vez que não fizemos uma indicação, foram 139 dicas semanais. Em algumas ocasiões houve mais de uma dica, com outras sugestões embutidas no texto.
 
Será que acertamos em todas? 
 
Provavelmente não. Nem sempre agradamos a Gregos e Troianos e a ideia por trás da dica da semana era estimular o consumo de vinho.
 
Por isto mesmo, com poucas exceções, eram vinhos agradáveis, fáceis de beber e numa faixa se preços convidativa. Escolhê-los não é uma tarefa simples e há muitas pessoas envolvidas que nos passam, direta ou indiretamente, algumas destas informações.
 
Eis a principal razão porque os críticos de vinhos, as listas de melhores vinhos, as revistas e congêneres, não são infalíveis: gosto é um assunto pessoal. Cada um deles têm suas preferências como qualquer outro enófilo. Honestamente, é muito difícil ser isento numa análise que é bastante subjetiva, por mais que nos atenhamos à fichas de degustação e critérios previamente definidos. Nem o famoso Robert Parker escapa: sua preferência por vinhos do Vale do Ródano é abertamente declarada e conhecida.
 
Como proceder?
 
O primeiro ponto para aproveitar uma dica de um especialista é conhecer o nosso paladar. O segundo ponto é saber um pouco sobre vinhos ou pelo menos sobre a recomendação, de maneira que possamos avaliá-la corretamente em vez de sairmos desesperados em busca da “garrafa mágica”, que nem sempre pode estar à venda em nosso mercado.
 
Novamente, tarefa nada simples. Só com o tempo vamos moldando o nosso paladar e refinando nossas escolhas vínicas. Para apreciarmos um vinho ou qualquer outra bebida, a boa gastronomia, etc, é necessário que tenhamos sensações específicas de aromas e sabores previamente registradas em nossa memória gustativa/olfativa. Só assim seremos capazes de rapidamente identificar o que nos é agradável, fazer combinações de diversos ingredientes e realmente apreciar o que nos é servido. Cada um de nós vai ter um “mapa” diferente destas impressões e vai reagir de forma diversa em cada oportunidade. Insisto: isto vale para os críticos também. Eles não são deuses e nem senhores de todas as coisas.
 
Resumindo: gosto é pessoal.
 
O segundo ponto é ajustar o nosso paladar ao de um crítico de referência. Há alguns fatores que devem ser observados, o principal deles é de ordem cultural: qual o “background” e a origem do nosso autor preferido. Isto pode dizer muito, mas nem sempre estas informações estão claras.
 
Vamos organizar um pouco as ideias.
 
Imaginemos um crítico francês, povo que vivencia vinhos diariamente. Esta bebida faz parte da dieta básica, é considerada como um alimento e tem preços compatíveis com o dia a dia de um cidadão. Para um especialista como este, sua escala de valores é bem definida e tem por ponto de partida o que é consumido em sua casa, diariamente.
 
Um jornalista especializado inglês ou norte-americano, embora consumam vinho em suas dietas normais, levam em conta outros fatores regionais que afetam diretamente suas indicações. Os ingleses são os maiores importadores de vinhos do mundo enquanto os americanos olham muito para sua própria produção da qual são extremamente orgulhosos. São dois vetores importantes.
 
Nós teremos melhores chances com os críticos brasileiros e sul-americanos: conhecem o nosso mercado, o gosto predominante e estão atentos aos preços extorsivos praticados, mesmo para produtores nacionais. Aqui o negócio é faturar e não aumentar o consumo: se puderem lucrar tudo numa única garrafa, melhor!
 
Vamos refletir sobre a lista anual de melhores vinhos da revista Wine Spectator. Apresento os 10 melhores a seguir:
 
1 – Cune Rioja Imperial Gran Reserva – 2004 – 95 pts
2 – Château Canon-La Gaffelière St.-Emilion – 2010 – 96 pts
3 – Domaine Serene Pinot Noir Willamette Valley Evenstad Reserve – 2010 – 95 pts
4 – Hewitt Cabernet Sauvignon Rutherford – 2010 – 95 pts
5 – Kongsgaard Chardonnay Napa Valley – 2010 – 95 pts
6 – Giuseppe Mascarello & Figlio Barolo Monprivato – 2008- 95 pts
7 – Domaine du Pégaü Châteauneuf-du-Pape Cuvée Réservée – 2010 – 97 pts
8 – Château de Beaucastel Châteauneuf-du-Pape – 2010 – 96 pts
9 – Lewis Cabernet Sauvignon Napa Valley Reserve – 2010 – 96 pts
10 – Quilceda Creek Cabernet Sauvignon Columbia Valley – 2010 – 95 pts
 
Dos vinhos apresentados, encontrei 4 (quatro) à venda no Brasil, vejam as diferenças:
 
– Cune Rioja Imperial, safra 2005 custa R$ 247,47 na Vinci Vinhos. Lá fora podemos comprar por US$ 63.00;
 
– Château Canon-La Gaffelière, safra 2006, por R$ 699,00 na Grand Cru (mais caro por ser uma safra mais antiga). No exterior custa US$ 110.00 (safra 2010);
 
– Château de Beaucastel Châteauneuf-du-Pape, safra 2009 por R$ 632,00 na Via Vini. Fora do nosso país custa US$ 120.00;
 
– Giuseppe Mascarello & Figlio Barolo Monprivato. Safra 2006, por R$ 584,90 na Decanter. Voltando de um passeio à Europa, compramos por US$ 110.00.
 
Excetuando o vinho espanhol, nenhum deles é um vinho “barato”, nos padrões europeus ou norte–americanos, mas acessíveis. Aqui são abusivos…
 
Só para completar, não havia nenhum vinho nacional.
 
Dos nossos vizinhos, 3 argentinos (nos 36, 42 e 73) e 3 chilenos (nos 44, 47 e 62).
 
Fica fácil perceber que devemos encarar estas relações de vinhos com uma certa reserva: representam, na maioria das vezes, apenas desejos, metas para termos em nossa adega. O ideal é confiarmos em nós mesmos aprendendo com o tempo e com os erros. Os “especialistas” vão mostrar o caminho a seguir, apenas.
 
Dica da Semana:  sem, medo de errar. O da safra 2011 esta na lista citada. Mas ainda não estão vendendo por aqui. Até lá, fique com esta outra safra.
 
Norton Reserva Malbec 2010
 
Elaborado com uvas Malbec provenientes de vinhedos com mais de 30 anos, este é um dos Malbecs mais emblemáticos da Bodega Norton. Um vinho encorpado e elegante ao mesmo tempo, com boa presença de fruta e taninos macios.
Na boca é harmonioso, amplo e persistente. Indicado para pratos de carnes vermelhas, queijos de massa mole.
 

Quebrando alguns mitos – V

 #5 – Somente vinhos tintos devem ser adegados
 
Este mito altamente improvável começa com um sonho: uma adega climatizada. Dez entre dez enófilos desejam ter uma para chamar de sua e não importa o tamanho, pode ser de 6 ou de 600 garrafas.
 
O problema começa quando temos que decidir o que vai ser adegado, em geral, opta-se pelos tintos, para ser mais realista, qualquer tinto…
 
Neste momento, do ponto de vista técnico, acabamos por dar um destino nada nobre à nossa adega, que pode ter custado um bom dinheirinho: ficou mais parecida com um “frigobar”. Antes de mergulhar em maiores profundidades, respondam sinceramente a algumas questões:
 
1 – Vocês sabem o que é um “vinho evoluído”?
 
2 – Se responderam “sim”, gostam de um vinho destes?
 
3 – Qualquer vinho (tinto, branco, rose, espumante) pode ser amadurecido na garrafa sem prejuízo?
 
Não existem respostas únicas para estas perguntas. Veja como se coloca Jancis Robinson, uma celebrada especialista em vinhos:

“Na sua maioria, os vinhos de hoje devem ser consumidos tão jovens quanto possível, quando ainda se pode apreciar seu caráter frutado. Mas enquanto persiste o mito de que todos os vinhos vão melhorar com o tempo, a realidade mostra que eles estão sendo bebidos muito mais tarde do que muito mais cedo”. 

 
Excepcional poder de síntese de Robinson, quase tudo que precisamos saber está neste pequeno parágrafo. Não caberia nele comentar sobre aromas e sabores do vinho, características que podem mudar sensivelmente após alguns anos de guarda. Começam a surgir os “terciários” e seus sabores associados, típicos de um vinho evoluído.
 
Para quem não lembra mais destas explicações, estamos falando de couro, tabaco, flores e frutas secas, café, pão torrado, alcatrão, carne de caça, verniz, fungos, etc. Não estranhem, não são predominantes (há exceções), mas eles estão lá e vamos sentir um gostinho. Há que aprecie e vibre com isto, mas a maioria não. No final das contas, é isto que se busca quando adegamos um vinho, qualquer vinho.
 
Muito cuidado e atenção serão necessários, não é uma operação do tipo “esquece este vinho na adega que um dia ele fica bom”. Há muitas regras que devem ser seguidas que vão desde a escolha do vinho certo, passando pelo tempo de guarda e a CNTP (para quem não estudou química, isto significa Condições Normais de Temperatura e Pressão).
 
Para os leitores que já se decidiram por fazer uma experiência nesta linha, seja por curiosidade ou por preferirem vinhos evoluídos e para aqueles que ainda duvidam sobre este tema apresentamos, a seguir, um roteiro desmistificador.
 
I – As castas que costumam envelhecer com dignidade
 
Tintas: Cabernet Sauvignon, Merlot, Nebbiolo, Pinot Noir, Syrah;
 
Brancas: Riesling, Chardonnay.
 
Isto não significa que qualquer vinho destas uvas possa ser envelhecido e nem que somente estas varietais devam passar por este processo.
 
II – Vinhos de sobremesa como os de colheita tardia ou os fortificados, podem ser adegados sem problemas.
 
Usando estes como exemplos podemos compreender as razões e aplicar em outros casos:
 
– alto teor alcoólico – com o tempo de guarda este teor cai tornando a bebida mais agradável;
 
– acidez marcante – outra característica que diminui com a idade melhorando o resultado final;
 
– taninos intensos (para os tintos) – definitivamente ficam “domados” com o passar dos anos;
 
– passagem por madeira – este é o ponto crítico uma vez que esta característica não se dilui com o tempo. Ao contrário, pela queda das demais pode sobressair exageradamente desequilibrando o vinho. Portanto é de fundamental importância na escolha de uma garrafa para ser amadurecida.
 
III – Como decidir o que vale a pena adegar
 
Aqui está toda a graça desta experiência, que pode produzir excelentes ensinamentos. Simples conselhos podem ajudar muito:
 
– estabeleçam uma faixa de preços a partir da qual se pode confiar que o investimento valerá a pena;
 
– comprem pelo menos 2 garrafas, 3 seria o ideal. Degustem uma logo (anotem o resultado ou façam um ficha técnica), abram a outra com 2 ou 3 anos de guarda e comparem o resultado com a 1ª. Se valer a pena, guarde a terceira mais um pouco.
 
IV – Seguindo a nossa “Guru” de hoje, Jancis Robinson, eis uma interessante lista por ela compilada.
 
a) Vinhos que devem ser consumidos logo:
 
os europeus classificados como “de mesa”;
 
os de garrafão ou caixa tipo Tetra Pack;
 
os conhecidos como “vin de pays”, relativamente baratos;
 
os do tipo Beaujolais Noveau, ou “en primeur” ou “novelo”;
 
produtos comerciais com preços até 50 ou 60 reais (a grande maioria deles)
 
os rosés;
 
os espumantes mais em conta. 
 
b) Vinhos que ganham com o tempo:
 
Tintos – (tempo de guarda nas condições ideais)
 
Agiorgitiko da Grécia (4–10)
Aglianico da Campania (4–15)
Baga da Barraida (4–12)
Cabernet Sauvignon (4–20)
Grenache/Garnacha (3–12)
Melnik da Bulgária (3–7) (este vinho está sendo revivido)
Merlot (2–10)
Nebbiolo (4–20)
Pinot Noir (2–8)
Raboso do Piave (4–8) (DOC italiana)
Sangiovese (2–8)
Saperavi da Georgia (3–10) (outra casta sendo reabilitada)
Syrah/Shiraz (4–16)
Tannat de Madiran (4–12)
Tempranillo da Espanha (2–8)
Porto Vintage (15-50)
Zinfandel (2–6).
 
Brancos – (tempo de guarda nas condições ideais)
 
Vinhos Botritizados (5–25)
Chardonnay (2–6)
Furmint da Hungria (3–25) (Tokay)
Semillon australiano do Hunter Valley (6–15)
Chenin Blanc do Loire (4–30)
Petit Manseng de Jurançon (3–10)
Riesling (2–30).
 
Para terminar, a lista não é definitiva e nem pretendia ser. Não foram contemplados os Champagnes e outros espumantes de 1ª linha, que podem ser guardados por alguns anos como foi relatado nesta coluna, recentemente, como os Franciacorta. Nem se falou, tampouco, dos vinhos do Cone Sul das Américas. Já tive ótimas
experiências com Malbecs argentinos, Tannats uruguaios e Carmenéres e Cabernets chilenos.
 
Animem-se, arrisquem, experimentem. Nem sempre dá certo, mas sempre vale a pena.
 
Dica da Semana:  para guardar. O tempo vocês decidem….
 
Vinho Chocalán Cabernet Sauvignon Selección
Coloração vermelha intensa e aroma complexo com notas de frutas negras, amora, cassis e notas de tabaco, café e baunilha. Ao paladar, revela-se equilibrado, encorpado e elegante, com taninos bem maduros e final de boca persistente. Ideal para acompanhar carnes vermelhas assadas e queijos maduros.
 
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