O tema da semana passada gerou um dilema para uma de nossas mais assíduas leitoras, Marly Chaves, de São Paulo. No seu e-mail ela fez a seguinte colocação:
“Mas aí, como conhecer (um bom vinho) sem sermos um Tuty ou um José Paulo?”

Não pretendíamos continuar neste tema, mas a dúvida é comum a todos que se iniciam na arte de beber um bom vinho. Eu e José Paulo passamos por isto e resolvemos dissertar um pouco mais sobre a questão.
Aprender sempre!
Este é o caminho, a cada gole uma nova experiência, mesmo que ela seja ruim: nos erros se aprende mais. Mas para podermos apreciar um vinho, qualquer vinho, é preciso alguma base. Desde o início desta coluna, há quase 2 anos, temos proposto uma série de textos bem didáticos com a declarada intenção de estabelecer um conhecimento comum entre autores e leitores. Quase como uma analogia ao dever de casa dos tempos de escola, a Dica da Semana deveria funcionar como treino para o olfato e paladar, material de estudo. Não foram escolhas aleatórias e nem obrigatórias, mas direcionadas para o propósito descrito.
Outro bom conselho oferecido e que muitos leitores, na época, afirmaram que adotariam, é anotar tudo que for experimentado. Pode ser num caderno destinado para isto ou nos modelos de Ficha de Degustação sugeridos. O importante é termos uma informação valiosa que possa ser recuperada naquele momento de indecisão: Qual era aquele vinho que gostei?
Se nossas anotações forem consistentes, vamos obter o tipo de vinho (varietal ou corte), quais as uvas, safra, país, região, produtor e até mesmo em que situação foi adquirido e consumido. Isto vale ouro!

José Paulo Gils, nosso experiente consultor, lembra: “Qualquer que seja o produto, você pode comprar um de boa qualidade sem ser conhecedor do assunto. Isto vale para os vinhos”.

Sugere, ainda, simples regrinhas que são brilhantes:
1 – Procurem vinhos em lojas especializadas, pois sempre haverá um funcionário preparado para nos dar informações corretas; (evitem supermercados)
2 – O preço é um indicativo de qualidade, mas nem sempre o mais caro é o melhor;
3 – Observem a cor do líquido na garrafa, contra a luz, se estiver âmbar pode estar oxidado, não comprem. Esta recomendação é para vinhos tintos e brancos;
4 – Comprem vinhos com menos de 4 anos, principalmente para vinhos brancos;
5 – Procurem matérias sobre vinhos em revistas, jornais e sites. Livros são boas opções também. Leiam muito;
6 – Na dúvida sobre a compra do vinho, levem só uma garrafa para conhecer.
Expandindo o nosso universo
Em outras palavras, só vamos crescer no mundo do vinho usando positivamente as anotações colhidas em nossas experiências enológicas. Este é o tal ‘universo’ do título.
Para deixar as coisas claras, vamos imaginar um cenário para um fictício 1º vinho, a partir do qual vamos expandir horizontes: o compramos, por impulso, atraídos por uma boa apresentação e preço acessível. (Caso não tenha sido assim, por favor, façam as adaptações necessárias).

Também não precisamos nos preocupar se o vinho era ruim. Neste caso ele sempre será um bom vinho e aqui começa a nossa aventura. Poderíamos, simplesmente, comprar outra garrafa idêntica. Estaremos absolutamente seguros que vamos repetir uma boa experiência, mas o que aprendemos? Nada!

Examinando rótulo e contra rótulo, descobrimos a origem do vinho, a uva ou uvas no caso de um corte, região produtora, safra, produtor e até mesmo o nome do importador caso não seja um vinho nacional. A questão a ser respondida, neste momento, é: será que existem outros vinhos com estas mesmas características?
Múltiplos caminhos podem ser seguidos na busca desta resposta, e devemos trilhar todos, mas um de cada vez. Um bom começo é o produtor: que outros vinhos ele elabora? Se preferir, podemos buscar outros produtores da mesma região. Talvez apareçam novas combinações de uvas que podem ou não nos agradar. Devemos respeitar o ‘um passo de cada vez’: se algo não deu certo, voltamos para a última coisa boa e mudamos o rumo.
Mais sugestões: outros vinhos do mesmo país; mesmo tipo de vinho feito em outros países e outros desdobramentos possíveis. Mais um caminho plausível: que outros vinhos são trazidos por este importador. Fácil perceber que há muita coisa para testar…
Com isto vamos provando, comparando e ganhando mais bagagem. Passaremos pelas uvas clássicas, Cabernet, Merlot, Sirah e Pinot, pelos cortes bordaleses e pelos inusitados, pelas uvas que brilham nos terroirs do Novo Mundo, Malbec, Carmenere e Tannat. Uma delas vai nos conquistar, sem dúvida, e se tornará o nosso ‘vinho de cabeceira’, o porto seguro, a referência.
Recorrendo ao nosso consultor: “O vinho está na boca de cada pessoa”.

Encontrar este vinho tão especial é quase um rito de passagem. Agora estamos seguros para tentar entender o que é ter paixão por vinhos, discutir sobre Chateau Petrús, Vega-Sicilia e Romanée Conti e, quem sabe, investir numa garrafa icônica.

Não pensamos mais em vinhos de prateleira e nossa literatura predileta são os ricos catálogos dos importadores. Uma viagem de sonho? Para uma grande vinícola, é claro! Começamos a colecionar rolhas, rótulos, taças, decantadores, saca-rolhas, etc.; cada um vai nos trazer boas lembranças, para sempre.
Dica da Semana: outro bom vinho de verão

Colomé Torrontés 2011 
Argentina/Salta
Palha vibrante. Intensamente aromático, com impressões de cítricos confitados, lichias, rosas e madressilva, além de especiarias exóticas. Viscoso em boca, mas com excelente sapidez mineral dando equilíbrio ao conjunto.