Nosso último dia em Mendoza seria mais curto, pois o voo de retorno à Buenos Aires era às 17:00. Parte do grupo voltaria no mesmo dia para o Rio de Janeiro enquanto minha esposa e eu, Lu e Gustavo esticaríamos um par de dias na capital da Argentina.
Seriam duas visitas somente. Na primeira, descobrimos o que é uma “vinícola ecológica”, a Bodega Dolium.
A foto mostra o que está sobre o solo, apenas o pequeno restaurante/sala de degustação e os escritórios. A parte de produção está enterrada cerca de 14m no subsolo.
Mostramos, na coluna anterior, algo parecido na Bodega Sin Fin, que colocou embaixo do solo as áreas de entretenimento, loja e degustação. Na Dolium isto foi invertido.
A ideia por trás deste curioso projeto é minimizar o consumo de eletricidade e diminuir emissões ou, no jargão dos ecologistas, reduzir a pegada de carbono (carbon footprint). Interessante notar que esta empresa não trabalha com cultivo orgânico ou biodinâmico nos vinhedos, apesar de serem opções dentro da mesma linha ecológica.
As fotos, a seguir, foram tiradas de um mesmo ponto mostrando o lado esquerdo e o direito: está é toda a área de produção. Fazia muito frio lá embaixo, mesmo a nossa guia, que é mendocina e estava bem agasalhada, não aguentou o frio neste ambiente.
Resumindo: custo zero para manter o processo em baixa temperatura. Os tanques são simples, não usam qualquer tipo de controle de temperatura. Emissões nulas. Neste aspecto é formidável!
Retornamos para a sala de degustação para uma experiência bem diferente do que nos fora oferecido até agora nas outras vinícolas: uma prova comparativa. Os vinhos seriam servidos aos pares para que pudéssemos perceber as diferentes nuances entre formas de elaboração, castas, vinhedos, etc.
A Dolium trabalha com algumas linhas de produtos que começam com a denominação Andes Peak, de viés ecológico, passa pela linha Clássica e termina com os Reserva e Gran Reserva. Nesta degustação experimentamos um rosé jovem e outro envelhecido em carvalho; dois Malbec de diferentes regiões, Lujan e Uco, além de um Tempranillo em confronto com um Cabernet Sauvignon. Ao final, dois vinhos top de linha foram servidos.
Toda esta ação foi comentada pelo nosso anfitrião que sempre se interessava pelas nossas escolhas. Diferente e esclarecedor.
A última visita do dia foi realmente um “Gran Finale”. Embora já conhecêssemos os vinhos da Domínio del Plata (Suzana Balbo), nem em sonhos poderíamos imaginar o que nos aguardava neste deliciosos almoço harmonizado no restaurante da vinícola, o “Osadia de Crear”. (faz jus ao nome…)
Vários aspectos nos chamaram a atenção: um ambiente elegante e acolhedor, a tradicional atenção com que somos recebidos nas vinícolas, a qualidade dos vinhos que seriam servidos e um cardápio cheio de alternativas entre o tradicional e o ousado. Cinco passos e cinco vinhos, com opções para os não carnívoros, o que gerou um interessante debate.
A primeira etapa foi regada pelo sempre bom Chardonnay 2012 da linha Crios. Para harmonizar foi servido um Escabeche de Coelho sobre uma Foccacia de Azeitonas. Equilíbrio correto e delicioso.
O próximo prato foi uma releitura de tradições locais, a Molleja ou glândula Timo dos bovinos, muito apreciada nestas terras. A apresentação era diferente: empanada e colocada num espetinho, acompanhada de cebolas caramelizadas, purê de batatas e alguns verdes. O vinho era o Crios Red Blend 2012, um corte de Malbec, Bonarda, Syrah e Tannat. Um verdadeiro festival de sabores e aromas que preparou o palato para o próximo passo.
Como a estação era supostamente fria, o prato seguinte foi uma sopa de Sobreasada, um embutido de carne de porco levemente picante. Uma harmonização sempre difícil, mas o bom Ben Marco Malbec 2012 cumpriu com galhardia o seu papel.
Para a próxima etapa havia duas opções: com ou sem carne. Cada uma seria acompanhada por um vinho diferente.
Obviamente a grande maioria partiu para o bife de Aberdeen Angus (raça bovina com carne muito macia) acompanhada do típico creme de milho à moda Cuyana (humita). O vinho servido foi o Ben Marco Expresivo 2013, muito bom por sinal e que proporcionou excelente casamento com o prato.
Para os que estavam mais atentos e optaram pelo prato sem carne, uma ótima surpresa estava reservada. Entra em cena o que muitos consideram como o vinho top da casa, o Susana Balbo Brioso 2012, pouco divulgado no nosso país por ter uma produção limitada.
Acompanhando este magnifico vinho, foi servido um elaborado Gnocchi feito com as borras do Brioso, com um pesto vermelho, cogumelos refogados e queijo defumado.
Supimpa! Não poderia ser melhor. Perfeito! (O mais complicado foi desviar os garfos e bocas alheias ao meu prato e vinho!)
Para terminar, foi servida a interpretação da casa sobre o que deve ser a dobradinha “doce com queijo”, harmonizada com um Susana Balbo Late Harvest Malbec 2011.
Equilíbrio inacreditável, todos gostariam de repetir, mas era hora de partir. Ainda passaríamos por algumas peripécias no aeroporto, todas resolvidas a tempo.
Na próxima coluna comentaremos sobre Buenos Aires e alguns episódios curiosos que não se encaixaram neste relato dos 3 dias.
O grupo, da esquerda para a direita: María José, nossa Guia, Diretora da Divinos Rojos (www.divinosrojos.com.ar) e organizadora das visitas; eu, minha esposa; Gustavo e Lu; Lobianco; Fabio; Marcio e Ronald.
Dica da Semana: como o Brioso já foi sugerido numa dica mais antiga, indicamos outro bom vinho desta vinícola.
Corte de 55% Malbec, 15% Bonarda, 10% Cabernet Sauvignon, 10% Syrah e 10% Merlot, oriundos de vinhedos em Agrelo, Chacras de Coria (Luján de Cuyo), Los Arboles (Tupungato) e La consulta (San Carlos) com idade média de 36 anos em pés francos.
Apresenta aromas de groselhas, carvalho e baunilha com notas defumadas de cacau, noz-moscada e chocolate. Taninos elegantes.
Acompanha carnes, queijos fortes e molhos intensos.
Tempo de guarda de 10 a 15 anos
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