Categoria: Mitos (Page 7 of 9)

Mais alguns mitos – 1

Nada é uma verdade absoluta no mundo dos vinhos e, por esta razão, mitos vão sempre existir. Enquanto alguns são derrubados, novos são criados.

Um tema que sempre é recorrente nas conversas entre enófilos são os vinhos vendidos como orgânicos ou biodinâmicos. Seriam realmente melhores que os demais?

Um amigo da juventude, Vicente, Engenheiro Químico, ficou revoltado quando inauguraram, aqui no Rio de Janeiro, o que teria sido o primeiro restaurante de “comida natural”. Foi uma revolução, mas gerou grandes controvérsias. Vicente, indignado, chegou a imaginar um “restaurante artificial” onde o prato principal seria um “Filé Plastic”, em homenagem a uma massa plástica usada em reparos automotivos.

Mesmo nos tempos atuais ainda é complicado falar em alimentos não naturais e assemelhados. Mencionar vinhos orgânicos ou biodinâmicos levanta a mesma série de questões. Existiria um vinho não natural?

O maior problema em compreender esta classificação está no fato de que ela se aplica, quase que exclusivamente aos vinhedos e, dependendo da legislação de cada país produtor, a definição de “orgânico” pode ser muito ampla.

Cultivos orgânicos, sejam de uvas, outros alimentos ou animais, buscam minimizar o uso de produtos químicos como defensivos agrícolas ou agentes que estimulem o crescimento, entre outros. Até o emprego de implementos agrícolas mecanizados na lavoura pode ser visto como algo inorgânico. Por exemplo, cito a Borgonha e seu mais famoso vinhedo, Romanée-Conti, onde somente cavalos são usados para o transporte da colheita e para a manutenção.

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Quando as uvas chegam na cantina e se inicia a vinificação, manter todo o processo como orgânico é muito complicado. Analisando a legislação norte-americana, vamos descobrir que podem ser usados cerca de 70 aditivos permitidos na elaboração, dita orgânica, mesmo sabendo que alguns são sintéticos, sem os quais não seria possível nem começar a fermentação nas condições sanitárias adequadas.

Um destes produtos, um antigo e eficiente fungicida agrícola, conhecido como Calda Bordalesa (Mistura de Bordeaux), nada mais é que a combinação de sulfato de cobre, cal e água.

Isto tudo é orgânico?

Segundo alguns especialistas, sim!

Outro bom exemplo é o ácido tartárico, principal ácido do vinho que lhe garante saúde e longevidade. Quando a quantidade necessária não é obtida na vinificação, não só é lícito como desejável acrescentá-lo para fazer as correções necessárias.

Orgânico?

Elementar meu caro Watson, ou se preferirem, mito não confirmado, como diriam os apresentadores do Mythbusters (Caçadores de Mitos) do Discovery Channel.

O melhor seria que estes vinhos fossem identificados como “elaborados com uvas de cultivo orgânico” e não como vinho orgânico.

Ao pé da letra, ou todos são ou nenhum é. Vocês decidem…

Saúde e bons vinhos!

Vinho da Semana: para comemorar, neste domingo 10/07, o dia da Pizza.

org 2Montes Merlot 2014 – $

Vinho de boa expressão, com frutado intenso muito agradável e elegantes notas de carvalho.

Os taninos e a acidez bem integrados dão um paladar com muita harmonia.

Final de boca de boa persistência.

Harmonização: Merlot é uma casta que produz vinhos fáceis de harmonizar com diversos tipos de pratos. Perfeito para as pizzas tradicionais

 

O que um Enófilo busca no vinho?

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Qualquer dicionário vai explicar que Enófilo é quem aprecia e estuda vinhos. Mais que um apreciador comum, é alguém que tem por hábito, entre outras coisas, anotar o que degusta, pesquisar vinhos que melhor se adequam a uma estação do ano ou a um determinado prato ou alimento. Um aficionado em todos os sentidos.

Não existe uma formação obrigatória para ser reconhecido como Enófilo, mas algumas características se impõem:

– Aroma e paladar treinados;

– Sólidos conhecimentos sobre regiões, castas e vinhos;

– Compreender a importância das safras (para grandes vinhos);

– Noções de harmonização;

– Dominar, com confiança e habilidade, o serviço do vinho.

Mais poderia ser dito, mas estaríamos enveredando por adegas, garrafas míticas, cadastros em lojas especializadas e vasta biblioteca. O que importa, entretanto, é entender a diferença entre alguém que pede um vinho para acompanhar sua refeição e a mesma situação vivida pelo Enófilo.

Para estes, não basta gostar do vinho, é preciso ter mais informações para poder apreciar completamente o seu potencial: procedência, como foi elaborado, safra, castas e qualquer outra informação, mesmo que pareça irrelevante, pode contribuir para que se alcance o que é denominado como “toda a extensão do paladar”. Este passo, a mais, faz toda a diferença.

Entramos num terreno quase mítico. Será verdade que o vinho elaborado por um determinado produtor é tão melhor que qualquer um outro? Ou que esta casta produz vinhos mais fáceis de beber?

Uma resposta simples seria “mais mitos que verdades”, mas há muito mais por trás disto.

Cada pessoa que provar um vinho vai ter uma experiência diferente. Há uma razão muito simples para isto: não somos iguais. Cada degustador passou, ao longo de sua vida, por diferentes experiências na formação de seus gostos pessoais, o que inclui aromas e sabores.

Isto posto, como será possível, por exemplo, identificar, ao degustar um vinho, um aroma ou sabor que não conhecemos?

Duas correntes são aceitas, os que ignoram aquilo que não conhecem e os que buscam saber do que se trata. Esta é a atitude que separa um Enófilo do degustador comum.

Há uma satisfação, toda especial, em associar uma gama de conhecimentos, prazerosamente adquiridos anteriormente, com um determinado vinho. Seja pela coloração, aroma, sabor ou pela informação irrelevante. Isto leva tempo para acontecer.

A citação é de Fabricio Portelli, um dos mais importantes conhecedores de vinhos da Argentina:

“Os bons vinhos são possíveis por serem elaborados por pessoas e castas que provêm de lugares específicos, sob um conceito e perseguindo um objetivo preciso. Caso contrário, não existiriam. Entretanto, o seu êxito estará em conseguir agradar”.

O pensamento termina com mais uma frase de difícil tradução literal. Para podermos compreender, foi feita uma adaptação:

“Quando se degusta um vinho, não é qualquer vinho”.

Esta é a chave para entendermos como funciona a cabeça de um Enófilo.

Eles não fazem vinhos, função do Enólogo; não coordenam cartas de restaurantes ou lojas especializadas em bebidas, função do Sommelier; mas são os que melhor sabem consumir a bebida de Baco.

Tiram prazer em cada gota.

Saúde e bons vinhos!

Vinho da Semana: um Syrah chileno cheio de coisas para descobrir

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Ventisquero Queulat Gran Reserva Syrah

De cor vermelha escura, o vinho possui aromas que mescla frutas silvestres escuras, pimenta, couro, tostado, café, tabaco e chocolate.

Na boca tem taninos firmes e elegantes, com final de boca macio e elegante.

 

Uma taça para cada tipo de vinho. Verdade?

Mais um mito, moderno, aceito por enófilos apaixonados. Este foi criado pelo fabricante de taças de cristal Riedel, em 1973.
Claus Riedel, em busca de aumentar o volume de vendas, desenvolveu uma linha de taças denominada Sommelier com 10 modelos diferentes, projetados de acordo com o caráter de determinados vinhos. Nascia a ideia das taças específicas. Atualmente o seu sucessor na empresa, Georg Riedel, se encarrega de manter viva esta ideia, viajando o mundo com uma interessante apresentação midiática que causa grande impacto: uma degustação feita nestas taças exclusivas. Quem já participou sai convencido que elas melhoram o vinho…
Grandes nomes endossam esta afirmação, entre eles Robert Parker: “O efeito que a taça exerce sobre um vinho fino é profundo”; ou o crítico francês Michael Bettane: “as taças de Riedel permitem que apreciemos os melhores vinhos do mundo com todas as suas nuances de aromas e sabores”.
Mas nem todo o mundo se convenceu disto e alguns grupos de pesquisadores se dedicaram a descobrir o quanto de ciência existe neste fato. O resultado não chega a ser surpreendente, mas traz o vinho de volta ao papel principal, temporariamente ocupado pela taça. A melhor síntese disto tudo esta nesta frase:
“O que importa é o vinho e não o cristal.” (o resto é puro marketing…)
Em 2004 a Gourmet Magazine publicou um artigo apresentando os resultados de pesquisas realizadas na Europa e nos Estados Unidos, sugerindo que as alegações de Riedel eram infundadas (cientificamente). Segundo a psicóloga Dra. Linda Bartoshuk, da Universidade de Yale, “O cérebro não se importa de onde está vindo o sabor que se sente na boca, e a comunidade científica sabe disto há pelo menos 30 anos”.
Duas outras pesquisadoras, Jeannine Delwiche e Marcia Pelchat, do “Monell Chemical Senses Center” realizaram um extenso trabalho que foi publicado no “Journal of Sensory Studies” (Jornal de Estudos Sensoriais – http://www.tastingscience.info/publications/Glass_shape.pdf), envolvendo quatro tipos diferentes de taças: um copo para água de formato quadrado, uma taça comum de vidro como as usadas nos restaurantes, uma taça Riedel para Chardonnay e outra para Bordeaux. 
Para reduzir qualquer influência dos formatos na pesquisa, foi criada uma estrutura de apoio, como a da foto abaixo, copiada do relatório final:
O teste era “às cegas”, cada participante recebia uma máscara opaca e as taças eram mantidas em distâncias constantes do nariz de cada voluntário. Um sistema de vórtice de baixa velocidade garantia uma suave agitação do vinho, simulando o movimento feito habitualmente ao se girar a taça.
Os resultados derrubaram a teoria de Riedel. Segundo o artigo mencionado: “Com relação à intensidade dos atributos testados não foram encontradas diferenças significativas entre as diferentes taças”. Houve um curioso resultado secundário: quando a taça para Bordeaux foi testada, os aromas foram considerados como “menos intensos”. Este resultado foi atribuído ao fato desta taça ser mais alta que as demais.
Nenhum estudo pode ser considerado como definitivo. Em 2012, num artigo publicado no New York Times, o jornalista Eric Pfanner escreveu: “Apesar de conhecer as pesquisas que questionam a validade desta tese, as taças Riedel parecem deixar o vinho melhor”.
A explicação pode estar ligada a algumas questões psicológicas, como já comentamos numa coluna anterior. (O que estamos bebendo …)
Uma boa explicação seria: “Taças de fino cristal podem tornar qualquer bebida melhor, por que são bonitas, delicadas, caras e por que temos a expectativa que vão melhorar o vinho”.
Difícil decisão!
O tema taças ou copos não tem fim. Um grupo de estudantes franceses de design, preocupados com a lenda que se deve beber um copo de água para cada copo de vinho degustado, desenvolveu um curioso conjunto de taça/copo encaixados, como na foto:
Engenhoso, pode ser segurado com uma única mão, facilitando o consumo de um ou outro. A pegadinha fica por conta da conhecida lenda que afirma que proporção de água mencionada manteria a hidratação do corpo diminuindo os efeitos da ressaca.
Não é bem assim. No livro “Proof: Science of Booze”, literalmente “Prova: Ciência da Birita”, o autor Adam Rogers explica que nenhuma pesquisa acadêmica sobre a ressaca conseguiu demonstrar que a desidratação ou níveis baixos de eletrólitos seriam a causa deste desagradável mal-estar.
Este inovador conjunto ainda não é o remédio miraculoso.
Dica da Semana:  vamos para o Alentejo, sem ressacas e com a taça certa…
Cortes de Cima
Um corte de Aragonez, Syrah e Trincadeira que estagiou por 12 meses em barricas de carvalho francês.
Apresenta aroma de frutos maduros e notas florais bem integradas, eucalipto e noz moscada.
No palato tem bom corpo, é macio, cheio e redondo, rico em fruto e sabores de chocolate e carvalho, bem equilibrado com taninos maduros.

Temperatura de Serviço dos Vinhos Tintos: Mito, Tabu ou Ciência?

Quando escrevemos sobre desmistificar certas lendas do vinho, recebemos algumas mensagens cobrando uma explicação sobre o tema “Temperatura”. Respondemos que este assunto estaria mais perto de um Tabu do que um mito propriamente dito. Há razões de sobra para acreditar nisto!
 
Não somos enólogos, apenas estudiosos sobre vinhos, com alguns cursos, muitas visitas a centros produtores e uma boa biblioteca que nos orienta nas pesquisas e experimentações.
 
Temperatura de serviço é uma fonte constante de discussão entre enófilos. Qualquer importadora de vinhos ou boa loja de varejo vai oferecer uma “Tabela” indicando o ponto certo para degustar o nosso rótulo predileto. Para piorar as coisas, existem diferenças sensíveis nestas tabelinhas…
 
Para compreender o que acontece com o vinho quando se altera a temperatura de serviço é necessário que se explique alguns fenômenos da física e da química, algo bastante escorregadio e de difícil compreensão pela maioria.
 
Em termos simples, na “temperatura ideal” o vinho desprende uma série de compostos aromáticos e parte do álcool, retém outros e tem, ainda, a capacidade de absorver compostos presentes no ar que respiramos principalmente Dióxido de Carbono (CO2) ou como preferem alguns autores, ‘absorver oxigênio’.
 
À medida que a temperatura aumenta ou diminui, este delicado equilíbrio se altera mudando os aromas e sabores de nossa bebida. Isto é facilmente percebido naquelas taças que ficam esquecidas sobre a mesa, por um algum tempo, aumentando naturalmente a temperatura: o aroma de álcool se torna dominante obliterando os demais.
 
Outra maneira de observar esta variação de aromas é na fase em afirmamos que o vinho “precisa respirar ou ainda não abriu”, ou seja, ainda não liberou os principais aromas e tem o paladar bastante tânico ou travado, o que irá mudar radicalmente em poucos minutos com a ajuda daquela leve agitação ao girarmos a taça e do aumento da temperatura que vai se aproximar daquela do ambiente. Do ponto de vista científico, não fizemos nada mais do que ajustar o vinho às condições ambientais: ele chegou ao seu ponto de equilíbrio.
 
Mas há mais coisas para compreendermos.
 
A variação de temperatura, sozinha, não é a única responsável por isto tudo. Entra em cena outro fator, a Pressão Atmosférica, um valor que, a grosso modo, representa o peso exercido pela camada atmosférica sobre um determinado local: ao nível do mar este valor é maior do que no topo de uma alta montanha, por exemplo.
 
Complicou?
 
Muito! Agora temos que lidar com mais uma variável que está intrinsicamente ligada a uma localização geográfica e que regula diretamente a quantidade de CO2 absorvida pelo vinho. As mais recentes pesquisas demonstraram que a maior ou menor presença deste composto tem influência direta no sabor do vinho. Quem já se atreveu a degustar uma taça num voo internacional sabe do que estamos falando: o gosto é diferente, muitas vezes ruim. Isto se deve à baixa absorção decorrente da pouca pressão atmosférica neste ambiente, apesar da cabine do avião ser pressurizada.
 
Para tornar esta coluna mais palatável vamos fazer uso de uma analogia. Levando-se em conta que, na composição química do vinho, a água representa de 85% a 90% do volume, podemos afirmar que há uma semelhança comportamental entre ambos. Não estaríamos errando muito ao afirmar que o vinho, com relação à variação da temperatura e da pressão atmosférica, se comporta da mesma maneira que a água.
 
O segundo componente de peso no vinho é o álcool, com porcentagens que variam de 7% a 24% (etanol, glicerol, metanol, isopropil, etc.).
 
Este dois gráficos a seguir são bem conhecidos:
 
o 1º mostra o estado da água em relação à variação da temperatura: sólido abaixo de 0ºC, líquido entre 0ºC e 100ºC e gasoso acima deste.
 
O segundo gráfico mostra o comportamento do Etanol, líquido até cerca de 78ºC e gasoso a partir deste ponto. (fonte: Wikipédia e www.ebah.com.br)
 
 
 
Nestes dois casos, durante a fase líquida, à medida que a temperatura sobe começa um processo denominado “evapotranspiração” que equivale dizer que as frações mais voláteis vão passando para a fase gasosa até chegar ao ponto de ebulição quando todo o resto muda de fase. No caso do vinho podemos observar isto através da evolução dos aromas e sabores durante uma degustação.
 
Estes resultados são válidos para uma determinada condição de Pressão Atmosférica chamada de “Condição Normal”, que equivale à do nível do mar.
 
A tabela resumida abaixo demonstra o que acontece com a água quando fixamos um ponto da curva, neste caso o “ponto de ebulição” e alteramos a pressão, por exemplo, fervendo água em diferentes altitudes:
 
 
Ou seja, em uma região como a de Mendoza, na Argentina, onde alguns dos melhores Malbec que tanto apreciamos são produzidos na altitude de 1500m, a água ferveria a 95º C (a cidade está a 750m de altitude). Este fenômeno, muito importante, é explorado pelas panelas de pressão tão comuns em nossas cozinhas: aumentando-se a pressão o alimento é cozido a uma temperatura menor, mais rápido e com pouco consumo de gás ou eletricidade.
 
Mas o que isto tem a ver com o nosso vinho?
 
Tudo! Esta é a chave para entender um ponto importantíssimo: o comportamento da nossa bebida favorita vai mudar de acordo com o local em que vamos consumi-la. Para cada um vai haver uma temperatura ideal de consumo, diretamente relacionada com a pressão atmosférica local ou com a altitude, que regulará a quantidade de C02 absorvida em uma unidade de tempo. Isto vale, inclusive, para a elaboração dos vinhos: os chamados “de altitude” vão se comportar de forma diferente daqueles produzidos ao nível do mar.
 
Simplificando: pelo exposto, um vinho só vai se comportar como o enólogo previu no local onde foi elaborado. A temperatura originalmente indicada deverá sofrer correções para qualquer outro lugar do mundo uma vez que não podemos corrigir a Pressão Atmosférica. As diferenças podem até ser desprezíveis, mas sempre vão existir.
 
Se for um vinho produzido em grandes altitudes, estas correções podem ser significativas, algo perto dos 4º ou 5º de variação para uma cidade ao nível do mar.
 
Mas ninguém está se importando muito com isto, a força dos “18º C” para os tintos é grande. A regra tem origem na Europa e se tornou padrão mundial baseada no seguinte fato:
 
“18º C é a temperatura média anual em Bordeaux”.
 
(Há algum tempo pesquiso a origem deste conhecido valor, sem muito sucesso. Sou engenheiro e respostas subjetivas não me satisfazem, mas vou ter que conviver com este fato, aceito, tacitamente, pela grande maioria)…
 
Gostaríamos, pelo menos, que a indicação de uma temperatura de serviço de um vinho fosse acompanhada ou da pressão atmosférica ou de uma localização geográfica: “Servir a 18º C @ 760 mm Hg”.
 
Definitivamente: beber um vinho em Bordeaux é diferente de beber este mesmo vinho no Rio ou em Mendoza e assim por diante.
 
Alguns fatos interessantes surgiram nas pesquisas. Observem a tabela a seguir com dados meteorológicos de Bordeaux: (fonte: http://www.climatemps.com/)
 
 
Na 1ª linha fica claro que a temperatura média anual máxima é 18º C.
 
A pressão atmosférica, pesquisada em outra fonte, varia entre 757 mm Hg e 767 mm Hg. (Fonte: NOAA)
 
Vamos comparar com Mendoza:
 
 
A temperatura média máxima é 23º C e a pressão barométrica varia entre 640 mm Hg e 762 mm Hg. (mesmas fontes)
 
Interpolando na tabelinha apresentada, podemos concluir que existe uma variação, para menos, de aproximadamente 4º C na temperatura de ebulição da água em relação a Bordeaux. A mesma linha de raciocínio, dentro de certos limites, pode ser aplicada ao vinho.
 
Um exemplo: se um produtor argentino recomenda que seu vinho seja consumido a 18º C, em sua vinícola que está situada nos 1500m, a temperatura corrigida, desta forma, para Bordeaux, poderia subir alguns graus a mais chegando até aos improváveis 22º C, dependo das condições atmosféricas do dia de consumo. Para a maioria dos autores isto é um absurdo.
 
Mas a ciência demonstra que não! (alguns autores mais recentes já admitem uma variação de 2 ou 3 graus em relação às temperaturas de serviço)
 
Como proceder?
 
1 – depois desta explicação complexa e, esperamos, extremamente didática e esclarecedora, acreditamos que ficou claro que as temperaturas de serviço indicadas são apenas referências.
 
2 – seguindo neste espírito, sempre é melhor servir o vinho numa temperatura mais baixa deixando que ele se adeque ao ambiente já na taça. Em poucas palavras, sirva aos 18º C ou equivalente, mas espere um pouco antes de degustá-lo.
 
3 – na grande maioria das vezes os vinhos vão “melhorar” na taça. “Abriu”, afirmam alguns enófilos, “respirou” dizem outros. Na verdade o vinho atingiu a temperatura correta, liberando e absorvendo o que deveria nas devidas proporções. Certamente será uma temperatura sensivelmente diferente da que foi servido. Para tirar dúvidas, esta é a hora de usar o termômetro!
 
4 – O fator ‘tempo’, de importância fundamental, será regido pela pressão barométrica local: quanto maior mais rápida a absorção de CO2 sera menor o espaço de tempo em que o vinho vai se comportar como deveria.
 
Um último conselho: experimente!
 
Lembrando, sempre, que gosto é um assunto pessoal, o importante é degustá-lo de acordo com nossas preferências, mais frios ou mais quentes. Cada tipo de vinho vai ter o seu ponto de equilíbrio, sendo quase impossível generalizar. O ideal é aprendermos a ajustar estas variáveis de acordo com o paladar de cada um para que a experiência seja ótima.
 
Não sejam escravos de regras fixas ou de tabelas burras!

Dica da Semana:  um rosado para ajudar a superar este verão.
 
Kaiken Rosé 2011 
Um vinho argentino (Mendoza) incrivelmente fresco e equilibrado, seco, mas dotado de cativantes aromas de frutas vermelhas.
100% Malbec.
Harmonização: Carne branca, saladas e comida japonesa.
Temperatura de Serviço: 13º a 16º C

Quebrando alguns mitos – Final

#6: Os críticos de vinhos sempre dão as melhores dicas…
 
Para finalizar esta primeira série sobre a mitologia do enófilo, vamos tocar num assunto muito delicado. Pode até ofender alguns profissionais, mas o nosso objetivo é explicar os fatos.
 
Começamos usando o próprio exemplo desta coluna. Pelas nossas contas, esta seria a de nº 140 e excetuando uma única vez que não fizemos uma indicação, foram 139 dicas semanais. Em algumas ocasiões houve mais de uma dica, com outras sugestões embutidas no texto.
 
Será que acertamos em todas? 
 
Provavelmente não. Nem sempre agradamos a Gregos e Troianos e a ideia por trás da dica da semana era estimular o consumo de vinho.
 
Por isto mesmo, com poucas exceções, eram vinhos agradáveis, fáceis de beber e numa faixa se preços convidativa. Escolhê-los não é uma tarefa simples e há muitas pessoas envolvidas que nos passam, direta ou indiretamente, algumas destas informações.
 
Eis a principal razão porque os críticos de vinhos, as listas de melhores vinhos, as revistas e congêneres, não são infalíveis: gosto é um assunto pessoal. Cada um deles têm suas preferências como qualquer outro enófilo. Honestamente, é muito difícil ser isento numa análise que é bastante subjetiva, por mais que nos atenhamos à fichas de degustação e critérios previamente definidos. Nem o famoso Robert Parker escapa: sua preferência por vinhos do Vale do Ródano é abertamente declarada e conhecida.
 
Como proceder?
 
O primeiro ponto para aproveitar uma dica de um especialista é conhecer o nosso paladar. O segundo ponto é saber um pouco sobre vinhos ou pelo menos sobre a recomendação, de maneira que possamos avaliá-la corretamente em vez de sairmos desesperados em busca da “garrafa mágica”, que nem sempre pode estar à venda em nosso mercado.
 
Novamente, tarefa nada simples. Só com o tempo vamos moldando o nosso paladar e refinando nossas escolhas vínicas. Para apreciarmos um vinho ou qualquer outra bebida, a boa gastronomia, etc, é necessário que tenhamos sensações específicas de aromas e sabores previamente registradas em nossa memória gustativa/olfativa. Só assim seremos capazes de rapidamente identificar o que nos é agradável, fazer combinações de diversos ingredientes e realmente apreciar o que nos é servido. Cada um de nós vai ter um “mapa” diferente destas impressões e vai reagir de forma diversa em cada oportunidade. Insisto: isto vale para os críticos também. Eles não são deuses e nem senhores de todas as coisas.
 
Resumindo: gosto é pessoal.
 
O segundo ponto é ajustar o nosso paladar ao de um crítico de referência. Há alguns fatores que devem ser observados, o principal deles é de ordem cultural: qual o “background” e a origem do nosso autor preferido. Isto pode dizer muito, mas nem sempre estas informações estão claras.
 
Vamos organizar um pouco as ideias.
 
Imaginemos um crítico francês, povo que vivencia vinhos diariamente. Esta bebida faz parte da dieta básica, é considerada como um alimento e tem preços compatíveis com o dia a dia de um cidadão. Para um especialista como este, sua escala de valores é bem definida e tem por ponto de partida o que é consumido em sua casa, diariamente.
 
Um jornalista especializado inglês ou norte-americano, embora consumam vinho em suas dietas normais, levam em conta outros fatores regionais que afetam diretamente suas indicações. Os ingleses são os maiores importadores de vinhos do mundo enquanto os americanos olham muito para sua própria produção da qual são extremamente orgulhosos. São dois vetores importantes.
 
Nós teremos melhores chances com os críticos brasileiros e sul-americanos: conhecem o nosso mercado, o gosto predominante e estão atentos aos preços extorsivos praticados, mesmo para produtores nacionais. Aqui o negócio é faturar e não aumentar o consumo: se puderem lucrar tudo numa única garrafa, melhor!
 
Vamos refletir sobre a lista anual de melhores vinhos da revista Wine Spectator. Apresento os 10 melhores a seguir:
 
1 – Cune Rioja Imperial Gran Reserva – 2004 – 95 pts
2 – Château Canon-La Gaffelière St.-Emilion – 2010 – 96 pts
3 – Domaine Serene Pinot Noir Willamette Valley Evenstad Reserve – 2010 – 95 pts
4 – Hewitt Cabernet Sauvignon Rutherford – 2010 – 95 pts
5 – Kongsgaard Chardonnay Napa Valley – 2010 – 95 pts
6 – Giuseppe Mascarello & Figlio Barolo Monprivato – 2008- 95 pts
7 – Domaine du Pégaü Châteauneuf-du-Pape Cuvée Réservée – 2010 – 97 pts
8 – Château de Beaucastel Châteauneuf-du-Pape – 2010 – 96 pts
9 – Lewis Cabernet Sauvignon Napa Valley Reserve – 2010 – 96 pts
10 – Quilceda Creek Cabernet Sauvignon Columbia Valley – 2010 – 95 pts
 
Dos vinhos apresentados, encontrei 4 (quatro) à venda no Brasil, vejam as diferenças:
 
– Cune Rioja Imperial, safra 2005 custa R$ 247,47 na Vinci Vinhos. Lá fora podemos comprar por US$ 63.00;
 
– Château Canon-La Gaffelière, safra 2006, por R$ 699,00 na Grand Cru (mais caro por ser uma safra mais antiga). No exterior custa US$ 110.00 (safra 2010);
 
– Château de Beaucastel Châteauneuf-du-Pape, safra 2009 por R$ 632,00 na Via Vini. Fora do nosso país custa US$ 120.00;
 
– Giuseppe Mascarello & Figlio Barolo Monprivato. Safra 2006, por R$ 584,90 na Decanter. Voltando de um passeio à Europa, compramos por US$ 110.00.
 
Excetuando o vinho espanhol, nenhum deles é um vinho “barato”, nos padrões europeus ou norte–americanos, mas acessíveis. Aqui são abusivos…
 
Só para completar, não havia nenhum vinho nacional.
 
Dos nossos vizinhos, 3 argentinos (nos 36, 42 e 73) e 3 chilenos (nos 44, 47 e 62).
 
Fica fácil perceber que devemos encarar estas relações de vinhos com uma certa reserva: representam, na maioria das vezes, apenas desejos, metas para termos em nossa adega. O ideal é confiarmos em nós mesmos aprendendo com o tempo e com os erros. Os “especialistas” vão mostrar o caminho a seguir, apenas.
 
Dica da Semana:  sem, medo de errar. O da safra 2011 esta na lista citada. Mas ainda não estão vendendo por aqui. Até lá, fique com esta outra safra.
 
Norton Reserva Malbec 2010
 
Elaborado com uvas Malbec provenientes de vinhedos com mais de 30 anos, este é um dos Malbecs mais emblemáticos da Bodega Norton. Um vinho encorpado e elegante ao mesmo tempo, com boa presença de fruta e taninos macios.
Na boca é harmonioso, amplo e persistente. Indicado para pratos de carnes vermelhas, queijos de massa mole.
 
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