Categoria: O mundo dos vinhos (Page 10 of 72)

Alguns vinhos icônicos – Tokaji Oremus

Para encerrar esta primeira série sobre alguns dos vinhos mais conhecidos mundialmente, vamos contar a história deste vinho de sobremesa, húngaro, que ficou escondido, por décadas, atrás da “cortina de ferro”.

Pode parecer um plágio, mas a verdade é que por trás de um grande vinho há, sempre, um grande vinhedo. As primeiras menções ao vinhedo Oremus datam de 1630. Tem a seu crédito o fato de ter fornecido as uvas para a produção do primeiro Tokaji.

Luis XIV gostava tanto deste vinho que chegou a afirmar que era “um vinho para reis e o rei dos vinhos”. Seu reconhecimento como um vinho de excelência só cresce desde estes tempos.

Uma curiosa história relata a possível origem desta maravilha. Começa em 1650. Temendo uma invasão turca, a colheita em Oremus é postergada por cerca de 2 meses. Isto permitiu que as uvas ficassem desidratadas e com alto teor de açúcares. Uma vez vinificadas, o produto resultante era maravilhoso. Nascia o Tokaji.

Com a queda do regime comunista, a família Alvarez, proprietária do não menos icônico Veja-Sicilia, compra a operação em 1993. Fundam a Tokaj-Oremus Viñedos y Bodegas. A nova empresa tem como foco manter todas as tradições e continuar com a fama deste vinho.

Produzir um Oremus não é tarefa simples. Só é elaborado em safras muito especiais.

As uvas, basicamente Furmint, precisam estar atacadas pela podridão nobre (Botrytis cinérea) e são selecionadas, bago a bago, manualmente, por mulheres, num extenuante processo.

A vinificação, seguindo a quatrocentona receita, é complexa e demorada, envolvendo vinhos base, fermentações, um precioso líquido desprendido na colheita, denominado “eszencia” e um longo amadurecimento em barricas de carvalho, húngaro, obviamente.

Muito mais que um vinho, o Oremus é uma história cheia de tradições, lendas e curiosidades. Assim como o seu “alter ego francês”, é perfeito com patês de fígado de pato ou ganso, bem como, carnes de caça, castanhas e até charutos suaves.

Curiosidades:

Tradicionalmente, a quantidade de açúcar residual nestes vinhos era medida por “Puttonyos”, nome dado a um cesto onde as uvas são colhidas. Hoje adotam padrões decimais. Cada “puttonyo” equivale, aproximadamente, a 25 g/l de açúcar. Um Oremus, como o da foto, tem 125 g/l.

O vinhateiro que elaborou o que seria o primeiro Tokaji Aszsu, logo depois da colheita atrasada, se chamava László Máté Szepsi. Ganhou o apelido de “Dom Perignon da Hungria” e lhe atribuiram, incorretamente, a descoberta da Botrytis.

A região do vinhedo Oremus é, seguramente, a mais antiga região vinícola demarcada e classificada, muito anterior a do Vinho do Porto ou das de Bordeaux. Em 2002, a UNESCO declarou está área como Patrimônio da Humanidade.

Aszu, que significa “lágrima” na língua húngara, também é o termo utilizado pelos vinhateiros para identificar a uva já desidratada: uva aszu.  Além da Furmint, podem ser usadas as varietais Hárslevelü, Sárga Muskotály, Zéta, Kövérszolo e Gohér.

Preço no Brasil: R$ 1.400,00 – safra 2000, garrafa de 500 ml.

Tempo de guarda: mais de 10 anos, pelo menos…

Saúde e bons vinhos!

P.S.: Muitos outros vinhos poderiam entrar nesta lista. Não citamos nenhum italiano e nem atravessamos o Atlântico para falar de América do Norte e do Sul.

Não dobramos o Cabo das Tormentas para chegar na África do Sul e nem tomamos o “Caminho das Índias” em busca de Austrália e Nova Zelândia.

Em breve voltaremos ao tema.

Alguns vinhos icônicos – Château d’Yquem

Seguindo a nossa saga em busca dos vinhos emblemáticos, retornamos à Bordeaux para apresentar um produto fora do comum.

Eis algumas de suas credenciais:

– Sua história começa em 1593!  

– Foi o único vinho de sua região, Sauternes, a entrar na classificação de 1855;

– É um “Premier Grand Cru Supérieur”, a mais alta classificação;

– Em 2011, Christian Vanneque, um dos jurados do famoso “Julgamento de Paris”, arrematou, em um leilão, uma garrafa da safra de 1811 por US$ 117,000.00, o que o torna o vinho mais caro já comercializado, levando em conta que o volume da garrafa era de 375 ml. (a garrafa normal de vinho é de 750 ml)

A safra de 1811, um ano do cometa Halley, é considerada uma das melhores e carrega toda esta mística criada em torno do ilustre visitante que aparece, por aqui, a cada 76 anos.

Os vinhos de Sauternes são doces, os famosos “de sobremesa”. O Château d’Yquem é considerado como um milagre da natureza, algo sublime.

A vinificação deste corte de Semillon e Sauvignon Blanc (80/20 aprox.) começa nos vinhedos. As uvas precisam ser atacadas pela “podridão nobre” (Botrytis Cinerea) antes de serem colhidas, o que é feito manualmente: cada cacho é inspecionado bago a bago. Muitas vezes, mais de uma colheita é necessária para colher todos os frutos.

O processo de fermentação, atualmente, é feito em barricas novas de carvalho francês. Dura, em média, de 2 a 6 semanas, dependendo do teor de açúcar das uvas. Cada parcela de vinhedo é vinificada separadamente.

O período de amadurecimento pode durar até 30 meses, em diferentes barricas. O corte é feito após este período.

O Chateau d’Yquem é, literalmente, um pequeno castelo. Tem uma história de origem nobre.

As terras pertenciam a Henrique II, Rei da Inglaterra e Duque da Aquitânia. Concede direitos feudais para a nobre família Sauvage, que constrói o Château por volta de 1700. (ainda mantém a aparência original)

A família Lur-Saluces, através de enlaces matrimoniais, assume a propriedade a partir de 1785, mantendo este controle até 1996, quando o grupo LVMH compra toda a operação.

Por conta do baixo rendimento dos vinhedos, há uma lenda que afirma que cada cacho produz, apenas, um cálice deste vinho. A produção fica limitada a 10.000 caixas por ano, vendidas a um preço perto do “exorbitante”.

Desde 2020, os vinhedos foram 100% convertidos para manejo biodinâmico.

Pode ser consumido jovem, mas os especialistas recomendam deixá-lo guardado por cerca de 35 a 50 anos, quando atingiria sua plena maturidade.

Há uma série de harmonizações possíveis; as sobremesas são as mais óbvias. Uma é muito especial que une este extraordinário vinho e outra iguaria icônica: o Foie Grass.

Não é para qualquer um…

Preço médio no Brasil: R$ 9.000,00 safra 2014, garrafa de 750 ml.

Saúde e bons vinhos!

CREDITOS:

Foto de abertura obtida em: Yquem

Link para a foto do Château

Alguns vinhos icônicos – Dom Pérignon

Quase uma unanimidade: quem lembra de um champagne, automaticamente, pensa num nome: Dom Pérignon!

Uma marca, da Casa Moët & Chandon, que homenageia o célebre Monge Beneditino da Abadia de Hautvillers, em Epérnay (século XVII).

O prédio que sediou esta Abadia e os vinhedos originalmente plantados pelos monges, pertencem, atualmente, à Casa Moët & Chandon (grupo LVMH).

Este champagne é considerado como o melhor vinho espumante do mundo, não só por críticos especializados, como pelos fiéis e apaixonados consumidores. Curiosamente, não se enquadra na categoria dos Grand Crus, tudo por um pequeno detalhe, mas muito importante nesta história: o vinhedo da Abadia.

Para se enquadrar na mais alta categoria entre os champagnes, é preciso que as uvas utilizadas venham de vinhedos também denominados como Gran Crus. Na elaboração do Dom Pérignon, usam frutos de alguns destes vinhedos mas uma parcela, vem do vinhedo original, classificado como Premier Cru.

Sempre um corte de Pinot Noir e Chardonnay, só é elaborado em safras consideradas como perfeitas.

Sua primeira produção remonta ao ano de 1921, vinificada para ser o principal rótulo desta tradicional Maison. Naquela época, era um “blend” dos melhores vinhos base, safrados e envelhecidos, que estivessem disponíveis. A primeira venda ao público foi em 1936, o que o torna o Champagne Premium mais antigo de todos.

A partir de 1940, tornou-se um “blend” dedicado a partir de vinhedos exclusivos. Sempre é safrado e não foi lançado em determinados anos.

Existem diversos mitos que circundam o Monge e a marca. O mais famoso lhe concede o título de “Pai do Champagne”. Num outro relato afirmam que ele seria cego ou lhe atribuem a frase “estou bebendo as estrelas”.

São lendas, bonitas e cativantes, que inspiram os consumidores.

Dom Pérignon não inventou esta deliciosa bebida, mas contribuiu, de forma decisiva, no aperfeiçoamento dos métodos de produção. Não era cego, e tinha boa saúde quando assumiu, muito jovem, a responsabilidade de produzir vinhos na Abadia.

Acreditava que o trabalho o aproximava de Deus, e seu objetivo era produzir o melhor vinho do mundo. A fama de suas vinificações chegou à Versalhes, onde Louis XIV reinava.

A famosa frase apareceu, pela primeira vez, num anúncio em 1880, bem posterior aos tempos do Monge.

Este produto sempre foi considerado como uma obra de arte e, três séculos depois, ainda mantém esta estupenda tradição.

O atual Chefe da Cave, Vincent Chaperon, tem à sua disposição oito vinhedos Gran Cru, além das uvas da Abdia. O segredo desta vinificação está no corte, na forma em que as duas castas são dosadas. Depois de fermentado, o vinho passa cerca de sete anos, em média, amadurecendo sobre as suas borras.

Uma bebida complexa e deliciosa, que é reinventada a cada safra.

Honestamente, não existe nada igual.

Preço médio no Brasil: R$ 2.500,00 (safra 2012)

Saúde e bons vinhos!

Alguns vinhos icônicos – Champagne Cristal

Na coluna sobre o Romanée-Conti, um leitor fez o seguinte comentário:

“bebida é vinho, vinho é tinto …”

Ao que, outro leitor, retrucou:

“Vinho é tinto, mas é branco também, e como é …”

Polêmicas à parte, vinhos podem ser classificados pelas suas cores: tinto, branco, rosado, laranja, ou por seus estilos: tranquilos, espumantes, fortificados ou ainda pela quantidade de açúcar residual: seco, meio seco e doce…

Enfim, denominações não faltam, mas, o que não pode faltar é boa qualidade. Todos os vinhos “icônicos” já apresentados nesta série são, neste quesito, impecáveis!

O Champagne Cristal, é mais um destes ícones incontestáveis. Tem uma curiosa história.

Em 1876, o Tzar Alexander II da Rússia procura a Maison Louis Roederer e faz um pedido muito especial: queria uma cuvée de Champagne exclusiva, só ele poderia servir ou degustar.

Impôs algumas exigências:

– A garrafa deveria ser de cristal, absolutamente transparente o que, mais tarde, daria origem ao seu nome comercial. Isto permitia que o conteúdo fosse examinado antes do consumo. Ele temia ser envenenado;

– O fundo deveria ser chato, sem aquele indentação (punt), para evitar que explosivos fossem, ali, escondidos. (parece que assassinar Tzares era uma prática bem popular na época)

A Louis Roederer começou a elaborar um champagne que se tornaria mundialmente famoso e desejado.

Mesmo com o fim da monarquia russa (1917), a Maison Roederer manteve a sua produção. A comercialização para o resto do mundo iniciou em 1945, com a marca Cristal. Um produto super premium, voltado para as classes mais abastadas.

Sua elaboração é extremamente criteriosa, sendo produzido em safras especiais, apenas. Um corte de Pinot Noir e Chardonnay que fica maturando, sobre as borras, por seis anos. Após a degola (dégorgement), ainda repousa por outros oito meses antes de ser comercializado.

O manejo dos vinhedos, todos próprios e certificados como Grand Cru e biodinâmicos (desde 2012), não emprega meios mecânicos. Cavalos são usados para lavrar a terra. A idade mínima das vinhas gira em torno de vinte e cinco anos.

A luxuosa apresentação traz mais curiosidades sobre esta formidável bebida: o rótulo dourado é uma especial distinção, reservada para champagnes extraordinários, seguindo uma antiga regra (século XIX) que associava cor à qualidade.

O invólucro de celofane dourado não é só um luxo a mais. Foi projetado para proteger o líquido da ação dos raios UV, o que as garrafas escuras fazem naturalmente.

Por conta de sua pouca produção, 300 a 400 mil garrafas por ano, seu preço é considerado como muito elevado.

Custo no Brasil: R$ 4.000,00 a R$ 7.000,00 dependendo da safra.

A Maison Roederer produz, também, um Cristal Rosé.

Quem ainda concorda que “bebida é vinho, vinho é tinto …”?

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Champagne Louis Roederer Cristal 2006 Vintage” por Fareham Wine está licenciada sob CC BY 2.0.

Alguns vinhos icônicos – Romanée-Conti

DRC ou como prefere o seu atual diretor, Aubert de Villaine, “Domaine de La Romanée-Conti”, é um vinhedo místico, na região de Vosne-Romanée, Borgonha, que produz um único vinho.

Um 100% Pinot Noir, raro, extremamente caro e considerado como o melhor da Borgonha, da França e do mundo!

Esta é a “controvérsia” mencionada na coluna da semana passada.

Afinal, qual destes vinhos é o melhor?

Não importa, a decisão será puramente subjetiva. Imaginem que, além destes, a França ainda tem mais ícones para nos oferecer.

A história do DRC começa em 1131 quando o Duque da Borgonha, Hugues II, doa as terras que resultariam neste vinhedo, para o Priorado de Saint-Vivant.

A primeira denominação foi Cros de Cloux. O nome Romanée surge em 1651, após estas terras serem vendidas pela igreja e passarem por diversas famílias. Segundo alguns relatos escritos, a mudança do nome se deve a Philippe de Croonenburg , então proprietário, talvez inspirada numa lenda sobre os romanos terem plantado videiras, naquelas terras, antes dos monges.

Em 1763, o Príncipe de Conti compra os vinhedos e passa a produzir um vinho exclusivamente para ele. Tido como uma personalidade muito arrogante, agregou o Conti ao Romanée.

Após a Revolução Francesa, os vinhedos do Príncipe foram confiscados e leiloados. Sucederam uma série de vendas e revendas. Em 1869, Jacques-Marie Duvault assume o negócio, formando um monopólio (vinhedos de único dono) com outros Grand Crus da Borgonha. A família “Villaine”, atual controladora, descende deste ramo.

A Société Civile du Domaine da La Romanée-Conti, produz 9 vinhos, 7 tintos e 2 brancos, todos com origem em vinhedos Grand Cru: Échezeaux, Grands Échezeaux, Richebourg, Romanée-St-Vivant, Romanée-Conti, La Tâche, Corton, Corton-Charlemagne (branco) e Montrachet (branco).

Todos são espetaculares.

Uma das características mais relevantes desta vinícola é o respeito pela terra e pelas tradições.

1945 foi um ano de grandes mudanças: a última safra pré-filoxera. Pouquíssimas garrafas foram produzidas, 600 apenas, o que gerou muitas falsificações.

Os vinhedos foram replantados em 1947 e a produção do vinho foi retomada em 1952.

Obtiveram a certificação de cultivo orgânico em 1985. Nenhum meio mecânico é utilizado no plantio, manutenção e colheita.

A produção atual do DRC está limitada a 6.000 garrafas que não são vendidas diretamente pela produtora, seja em unidades ou caixas. A venda mais comum (tem lista de espera …) é feita em lotes de 12 unidades de um mix de todos os vinhos produzidos. Apenas uma garrafa do Romanée-Conti é incluída neste pacote.

Preço médio no Brasil: R$ 33.000,00 (*)

(*) este é um valor estimado pelo app Vivino. A Optim, importadora deste vinho, prefere não declarar o preço. Entende que não é para qualquer um, exigindo uma série informações sobre o comprador e impondo outras tantas obrigações, entre as quais, a que não deve “revender” o vinho adquirido.

O renomado crítico inglês, Clive Coates, falecido em 2022, fez a seguinte afirmação sobre o Romanée-Conti:

“O mais raro, o mais caro e, constantemente, melhor vinho do mundo…
Este é o mais puro, aristocrático e intenso exemplo de um Pinot Noir que se possa imaginar. Não é apenas um néctar, mas uma medida, a partir da qual, todos os outros Pinot serão avaliados.”

Saúde e bons vinhos!

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