Categoria: O mundo dos vinhos (Page 24 of 82)

Vamos melhorar o nosso paladar?

Desenvolver o nosso paladar a ponto de conseguir identificar as diferentes castas, por seus aromas e sabores, é uma das metas mais prazerosas e difíceis de se conquistar. Não existem atalhos, mas com boa dedicação e um pouco de organização, é possível chegar lá de uma maneira didática e divertida.

Ficaram curiosos?

O caminho mais seguro e eficiente é através de degustações comparativas. Existem alguns estilos destas provas, por exemplo, quando participamos de um evento de vinhos aberto ao público. Várias vinícolas ou seus distribuidores são reunidos, num mesmo espaço, onde podemos degustar uma enorme variedade de vinhos. Temos a oportunidade de experimentar e comparar, castas, métodos de elaboração, origens, estilos e muito mais.

Se não formos muito objetivos, seremos envolvidos pelo excesso de ofertas, perdendo-se o efeito da comparação. O ideal é organizar estas degustações em “ponto pequeno”, com alguns amigos e, se possível, com alguém mais experiente para tirar dúvidas. O truque é começar comparando uma ou duas castas de cada vez. Escolham as clássicas incialmente, só acrescentado as menos conhecidas à medida que vamos nos sentindo mais seguros.

Um ótimo ponto de partida seria comparar a uvas tintas Cabernet Sauvignon e Merlot e, em um flight separado, as brancas Chardonnay e Sauvignon Blanc.

Para quem não sabe, a palavra “flight”, literalmente “voo” em inglês, é o nome que se dá, no nosso meio, ao conjunto de taças, com vinho, para serem provados em sequência, como na foto que ilustra este texto.

A escolha dos vinhos que serão testados é muito importante. Não se trata, apenas, de pegar duas garrafas quaisquer, abrir e servir. O sucesso por trás desta simpática forma de aprender depende de escolhas acertadas.

Aqui vão algumas sugestões:

Cabernet Sauvignon e Merlot chilenos. Ambas as castas são muito bem vinificadas naquele país, com destaque para a primeira, cujos vinhos são considerados como um dos melhores do mundo. Procurem comprar de uma mesma vinícola e dentro de uma mesma linha, por exemplo “Reserva”.

No Cabernet, procurem identificar os aromas e sabores que nos remetem a frutas vermelhas muito maduras: cereja, groselha, amora. Se o vinho passou por madeira, vamos encontrar, também: pimenta do reino, tabaco, baunilha e alcaçuz. Devem ser encorpados, com taninos presentes, mas suaves, e boa acidez.

No Merlot, a grande característica é a sua suavidade quando comparada com a Cabernet. Tem quase o mesmo perfil de aromas e sabores, acrescentando amora madura e ameixa preta ao leque anterior. Ao passar por madeira, vamos encontrar, café, chocolate, louro e pirazinas, mais conhecidas como “o gosto do pimentão”.

Algumas variações desta prova são bem interessantes e podem ser usadas: comparar vinhos de países de clima frio com os de clima mais tropical. Tentem descobrir as diferenças.

Entre as brancas, um bom começo seria comparar dois vinhos argentinos. Procurem por vinícolas menores, com pequenas produções. Alguns Chardonnay de lá estão no nível dos famosos californianos.

As principais características a serem identificadas são:

Chardonnay – maçã verde, frutas cítricas, pera, pêssegos, mel e notas florais. Se passou por madeira vamos encontrar aromas e sabores láticos, temperos e defumados leves. O corpo é de leve a médio, mas será notada uma certa “crocância”. Tem muita personalidade.

Sauvignon Blanc – ervas selvagens, notas cítricas, de abacaxi e de maracujá. Muito mineral, corpo leve, alta acidez e longa permanência.

Uma variação muito instrutiva seria fazer, simultaneamente, esta mesma prova com dois vinhos chilenos e explorar as diferenças.

Uma vez dominadas estas quatro castas, é hora de ampliar os nossos horizontes. Aqui vão mais sugestões:

Syrah: australiano, francês, norte americano, sul africano e brasileiro;

Tempranillo: Espanha, Portugal (Aragonês ou Tinta Roriz) Chile e Argentina;

Pinot Noir: francês, chileno e norte-americano;

Alvarinho: Espanha (Albariño), Portugal e Uruguai;

Riesling: alemão, austríaco e alsaciano (França);

Pinot Grigio: Itália, França (Pinot Gris).

Para acompanhar, nada de exageros: pão e água seria o ideal. Procurem por alimentos com sabor neutro e que não conflitem com o que está sendo degustado. A ideia é manter o paladar limpo e sem influências externas.

No início, as degustações serão abertas. Deixe as degustações cegas para um estágio mais avançado.

Para encontrar as características mais marcantes de cada uva, consulte um bom livro sobre vinhos ou pesquise em sites confiáveis.

Sobretudo, divirtam-se.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Imagem por Freepik

Cortes pouco comuns

Considerados como os vinhos mais famosos, os Bordeaux, são elaborados dentro de rígidas regras. Em tese, só podem ser utilizadas 6 tipos de uvas viníferas: Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Petit Verdot, Carménère e Malbec. Cada uma é vinificada separadamente e misturada posteriormente. Esta operação é conhecida como “corte”, “blend” ou “assemblage”.

Na sua grande maioria, Cabernet Sauvignon e Merlot dominam as vinificações nos diversos produtores ao longo do rio Garrone. A primeira casta é a preferida pelos que estão na margem esquerda, enquanto a segunda, é a mais utilizada pelos Châteaux da margem direita. São vinhos clássicos e referências para quaisquer outros vinhateiros. O corte bordalês é sempre uma garantia de que há algo bom naquela garrafa.

Ao decidir por misturar diferentes vinificações para elaborar um vinho, o Enólogo busca melhorar a qualidade de seu produto. Se o vinho não está com a cor desejada, acrescenta-se um pouco de vinho de uma casta “tintureira”. Se os taninos não estão no padrão desejado, acrescenta-se um pouco de vinho de uma casta tânica. Esta é a ideia básica.

Existem outras misturas, digamos, mais complexas, como a do conhecido Châteauneuf-du-Pape, onde até 14 castas diferentes podem ser usadas, inclusive algumas brancas. Da mesma região, outra sigla tem fama e alcance mundial, o corte “GSM”, onde se misturam vinhos elaborados com Grenache, Syrah e Mourvèdre, uvas típicas da região do Rio Ródano.

Todos são considerados como “cortes clássicos” e esta fórmula é copiada por produtores de diversos países. Existem outros tipos de corte, pouco usuais, que produzem bons resultados.

Um deles é o que mistura diferentes safras, seja de uma mesma varietal ou de castas diferentes.

O Champagne, salvo indicação no rótulo, sempre é um corte de diversas safras. Cabe ao Enólogo decidir quais vinhos base vai usar para criar uma das bebidas mais conhecidas e apreciadas.

O Vinho do Porto, a grande joia do comércio de vinhos de Portugal, também é elaborado com diferentes safras, algumas bem antigas. O resultado é espetacular.

No Brasil, já provamos dois ótimos vinhos elaborados com esta técnica, o Inominable, da vinícola Villagio Grando, de Santa Catarina e o Pedro, da vinícola Zanella, do Rio Grande do Sul.

A característica comum a estes vinhos é que são comercializados sem a indicação da safra, ou “não safrados”. Para saber como foram elaborados, é preciso consultar o contrarrótulo ou a ficha técnica.

Um processo, muito antigo, que está voltando a ser empregado com muito sucesso, inclusive pelos produtores que preferem o caminho da “mínima intervenção”, é a “co-fermentação”. Ao contrário dos cortes tradicionais, onde cada uva é fermentada separadamente para, depois, ser misturada, esta outra forma de vinificar, opta por trabalhar todas as uvas, simultaneamente, em um mesmo tanque de fermentação.

Um dos grandes problemas deste tipo de elaboração está no ponto de maturação de cada casta. Se eles são parecidos, fica tudo mais fácil. Caso contrário, Enólogos e Agrônomos precisam conhecer profundamente os seus vinhedos para obterem o melhor resultado desta combinação de diferentes uvas. O resultado não permite correções posteriores.

Para finalizar este tema de cortes diferentes, não podemos deixar de mencionar os “field blends”, comuns em Portugal, Douro, e em alguns outros países: os vinhedos são compostos por diferentes espécies, que são colhidas e vinificadas juntas. Muito semelhante à técnica de co-fermentação, exige profundo conhecimento dos vinhateiros para que o produto, ao final, seja excelente.

Parece que descobrimos um dos segredinhos dos ótimos vinhos portugueses. Será?

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de Evie Fjord na Unsplash

A importância da fermentação – de volta ao básico

Um vinho, assim como outras bebidas alcoólicas, depende de uma fermentação que transforma os açúcares de uma matéria prima, no nosso caso o sumo das uvas, ou mosto, em álcool. Mas não é só isto, o alcance desta reação química vai muito mais longe.

Para os que estão iniciando neste mundo, pode parecer algo muito técnico, complexo e cheio de mistérios. Por outro lado, fermentações estão no nosso dia a dia há muito tempo e, talvez, muitos nunca se deram conta disto.

Um ótimo exemplo são pães e bolos. Nenhum deles existiria se não houvesse uma fermentação. O tradicional “pó Royal” nada mais é do que fermento químico. Qualquer “chef” doméstico manipula este produto sem problema algum …

Na elaboração dos vinhos, quem faz o papel do fermento são as leveduras, um tipo de fungo. Tanto podem ser naturais, as mais simples são as que estão nas peles das uvas, ou preparadas para tirar o melhor que podem do mosto. Cada produtor, de acordo com o que obtém nas colheitas, vai decidir o que usar. Cada levedura vai agir de uma forma e dentro de um tempo que deve ser controlado.

mosto + leveduras = álcool + gás carbônico (que se desprende)

Nesta transformação, aparecem alguns subprodutos que são de grande importância para Enófilos, Sommeliers, críticos, entre outros. São conhecidos pelos técnicos como “compostos aromáticos”, formados por ésteres, aldeídos, pirazinas, terpenos, tiol e lactonas. São nomes complicados para explicar a existência de tantos aromas e sabores diferentes nos vinhos.

Vinho é uma bebida que não tem gosto de uva, apesar de ser elaborado com elas. A mágica ocorre durante a fase de fermentação, a mais importante delas. Outras notas aromáticas vão surgir nas etapas pós fermentação. A mais tradicional é o amadurecimento em barricas de carvalho. Outra fase traz novas camadas de sabor e sensações táteis é a conversão malolática, quando o áspero ácido málico é convertido no amanteigado ácido lático.

Para que isto tudo que foi mencionado resulte numa bebida que nos agrade, é necessário mais um fator: tempo. Nenhum vinho está “pronto” assim que terminam as fases de elaboração. Mesmo depois de engarrafados, ainda ficam repousando para que todos estes aromas e sabores se integrem.

Pensem nisto quando abrirem a sua próxima garrafa. Não a tratem como um “qualquer”. Deixem o vinho respirar, usem um decantador ou um aerador. Mesmo na taça, ajudem o vinho a revelar todo o seu potencial, agitando suavemente.

“Ter paciência é difícil, mas o resultado é gratificante”. (Jean-Jacques Rousseau)

Saúde e bons vinhos!

Créditos:

Imagem de Sketchepedia no Freepik

Montando uma adega em casa

Sonho, possível, de muitos enófilos. Pode parecer um luxo, mas ter algumas garrafas, bem selecionadas, ao alcance da mão, a qualquer hora, é muito prático.

O primeiro ponto a ser observado é o local escolhido para armazenar as garrafas: deve ser ventilado, fresco, de fácil acesso e protegido de luz solar direta. O ideal é que se possa colocar as garrafas na horizontal. Uma boa opção é investir numa adega climatizada.

Para facilitar o manuseio, é interessante que a adega tenha uma regra de organização. Existem várias técnicas, a mais básica é separar tintos, brancos, rosados, espumantes e “outros”. Dentro de cada um destes grupos, podemos ir sofisticando, por exemplo, arrumando por preço, casta, safra, região ou produtor. Cada um vai achar uma maneira que melhor se adapte à sua forma de escolher um vinho.

A parte mais difícil será escolher os vinhos que vão compor o nosso acervo. Duas opções são bem claras: vinhos de consumo rápido, que devem estar mais à mão e vinhos de guarda, que serão armazenados “lá no fundo da adega”.

Agora entre em cena a questão financeira. Um bom estoque inicial gira em torno de 30 garrafas. Devemos fixar um preço médio previamente, para podermos nos divertir sem “furar o teto de gastos”. O ideal é estocar 3 garrafas de cada tipo. Se isto for inviável, tenham pelo menos duas iguais.

Alguma excentricidade sempre será permitida, mas nada de comprar vinhos icônicos e caros …

ESPUMANTES:

Duas garrafas no mínimo. Os produzidos no Brasil são excelentes. Vale a pena investir em marcas consagradas como Chandon, Geisse, Valduga e outras.

A excentricidade seria um Champagne. Se assim decidirem, escolham um ótimo produtor, com garantia que envelhecerá corretamente.

BRANCOS:

Algumas uvas são clássicas e devem estar em qualquer adega que se preze: Sauvignon Blanc, Chardonnay e Riesling. O gosto pessoal deve ser levado em conta e, se algumas destas sugestões não for do seu agrado, simplesmente não inclua na sua lista.

Existem inúmeras alternativas: Alvarinho e Loureiro, clássicas do Vinho Verde português; Pinot Gris/Grigio, seja da Itália ou da Alsácia; Verdejo espanhol etc …

Selecionem vinhos do Cone sul. Os Sauvignon Blanc do Chile são deliciosos e fáceis de encontrar. Chardonnay da Argentina ou do Brasil estão com um ótimo nível de qualidade. Já o Riesling, prefiram os alemães, austríacos ou da Alsácia.

TINTOS

Assim como nos brancos, as uvas clássicas, Cabernet Sauvignon, Merlot, Pinot Noir e Syrah são as nossas apostas. Mas não podemos deixar de fora da nossa lista a Malbec, vinificada de forma magistral na Argentina, a Tempranillo, casta icônica da Espanha e alguns vinhos de corte, como o Bordalês ou os GSM do vale do rio Ródano.

Tudo vai depender do gosto pessoal e do “bolso” de cada um.

Seguindo a trilha do Cone Sul, vamos encontrar excelentes Cabernet no Chile. Estão cotados entre os melhores do mundo, rivalizando com os famosos norte-americanos.

Em nosso país o Merlot já ganhou fama. Diversos produtores oferecem rótulos de alta qualidade: Valduga, Dal Pizzol, Pizzato, etc …

Temos, também, bons Syrah. Mas se o orçamento permitir, optem por vinhos australianos elaborados com esta casta.

Pinot Noir é uma casta famosa, difícil de vinificar e seus vinhos são necessariamente caros. Os da Borgonha são impraticáveis. Um bom garimpo pode encontrar joias do Oregon (EUA), Chile, Nova Zelândia e Brasil.

Há muitas opções se esta lista básica não agradar. Os cortes bordaleses são cartão de visita de qualquer vinícola do mundo. Muito fáceis de encontrar, mas, também, com qualidade discutível às vezes. Os vinhos tintos portugueses, cortes com uvas nativas, preenchem esta lacuna perfeitamente, com custos bem palatáveis.

Os GSM (Grenache/Syrah/Mourvèdre) franceses são excelentes vinhos, não necessariamente caros. Procurem por um Cotês du Rhône, sempre com boa relação de preço.

OUTROS VINHOS

Uma adega não estaria completa sem alguns vinhos de sobremesa e fortificados. Aqui estão algumas sugestões:

Vinho do Porto – um clássico. Tenha uma garrafa pelo menos;

Colheita tardia – vinhos doces que foram elaborados com uvas muito maduras. Argentina e Chile produzem pequenas joias. Curiosamente, a casta Riesling brilha por aqui.

A extravagância seria investir num Sauternes, o mais clássico dos vinhos doces ou em um Tokaji, o mais famoso vinho húngaro: são caríssimos!

Agora é só tomar coragem e começar.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de Hermes Rivera na Unsplash

Vinho tem textura?

Estamos tão acostumados com aromas e sabores que nunca nos lembramos que os vinhos têm mais uma característica que deve ser avaliada: a textura.

OK, já escutamos o “do que vocês estão falando?”.

Para alguns leigos, falar em texturas líquidas pode soar muito estranho, do outro mundo. Mas elas existem e são percebidas pela nossa mucosa oral.

Vamos deixar o vinho de lado por um minuto, durante o qual, convidamos o leitor a pensar num alimento. Ao prová-lo, podemos experimentar diferentes sensações como suculência, cremosidade, maciez, firmeza, pungência, calor, frio e algumas outras.

Estaríamos errando ao afirmar que estas são texturas?

É fácil imaginar que elas também existem para os líquidos, vinhos incluídos.

Fazendo uma analogia com aromas e sabores, não é difícil identificar a presença de texturas numa degustação. Algumas podem, inclusive, sinalizar problemas no vinho, como pedaços de rolha, ou problemas no serviço, quando cristais de tartarato são sentidos na boca (despeçam este Sommelier).

Dois fatores, pouco utilizados por enófilos menos experientes, quantidade e intensidade, ganham um peso maior na hora de avaliar as texturas. Vinhos tintos, por conta dos taninos, servem de exemplo: um vinho muito tânico (quantidade) tem uma presença (na boca) desagradável (intensidade).

Para os brancos precisamos de maior sutileza. A acidez é quem vai ditar a característica mais presente. Um Sauvignon Blanc pode ter sensações muito ásperas em comparação a um Chardonnay que é mais “arredondado”.

A gama de sensações possíveis é muito ampla e cada tipo de vinificação pode introduzir algo novo e inesperado. Vinhos que passam por madeira trilham um caminho, vinhos que amadureceram sobre as borras vão por outro e assim por diante.

O grande espetáculo é a nossa capacidade de identificar e apreciar cada uma destas diferentes texturas e compreender o seu significado.

Agora, quando o seu amigo usar uma expressão como “este vinho dá para mastigar”, não o trate como um extraterrestre; aprenda com ele!

Saúde e bons vinhos!

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