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Vinho não tem bula (nem contra-indicações)

O tema da semana passada gerou um dilema para uma de nossas mais assíduas leitoras, Marly Chaves, de São Paulo. No seu e-mail ela fez a seguinte colocação:
“Mas aí, como conhecer (um bom vinho) sem sermos um Tuty ou um José Paulo?”

Não pretendíamos continuar neste tema, mas a dúvida é comum a todos que se iniciam na arte de beber um bom vinho. Eu e José Paulo passamos por isto e resolvemos dissertar um pouco mais sobre a questão.
Aprender sempre!
Este é o caminho, a cada gole uma nova experiência, mesmo que ela seja ruim: nos erros se aprende mais. Mas para podermos apreciar um vinho, qualquer vinho, é preciso alguma base. Desde o início desta coluna, há quase 2 anos, temos proposto uma série de textos bem didáticos com a declarada intenção de estabelecer um conhecimento comum entre autores e leitores. Quase como uma analogia ao dever de casa dos tempos de escola, a Dica da Semana deveria funcionar como treino para o olfato e paladar, material de estudo. Não foram escolhas aleatórias e nem obrigatórias, mas direcionadas para o propósito descrito.
Outro bom conselho oferecido e que muitos leitores, na época, afirmaram que adotariam, é anotar tudo que for experimentado. Pode ser num caderno destinado para isto ou nos modelos de Ficha de Degustação sugeridos. O importante é termos uma informação valiosa que possa ser recuperada naquele momento de indecisão: Qual era aquele vinho que gostei?
Se nossas anotações forem consistentes, vamos obter o tipo de vinho (varietal ou corte), quais as uvas, safra, país, região, produtor e até mesmo em que situação foi adquirido e consumido. Isto vale ouro!

José Paulo Gils, nosso experiente consultor, lembra: “Qualquer que seja o produto, você pode comprar um de boa qualidade sem ser conhecedor do assunto. Isto vale para os vinhos”.

Sugere, ainda, simples regrinhas que são brilhantes:
1 – Procurem vinhos em lojas especializadas, pois sempre haverá um funcionário preparado para nos dar informações corretas; (evitem supermercados)
2 – O preço é um indicativo de qualidade, mas nem sempre o mais caro é o melhor;
3 – Observem a cor do líquido na garrafa, contra a luz, se estiver âmbar pode estar oxidado, não comprem. Esta recomendação é para vinhos tintos e brancos;
4 – Comprem vinhos com menos de 4 anos, principalmente para vinhos brancos;
5 – Procurem matérias sobre vinhos em revistas, jornais e sites. Livros são boas opções também. Leiam muito;
6 – Na dúvida sobre a compra do vinho, levem só uma garrafa para conhecer.
Expandindo o nosso universo
Em outras palavras, só vamos crescer no mundo do vinho usando positivamente as anotações colhidas em nossas experiências enológicas. Este é o tal ‘universo’ do título.
Para deixar as coisas claras, vamos imaginar um cenário para um fictício 1º vinho, a partir do qual vamos expandir horizontes: o compramos, por impulso, atraídos por uma boa apresentação e preço acessível. (Caso não tenha sido assim, por favor, façam as adaptações necessárias).

Também não precisamos nos preocupar se o vinho era ruim. Neste caso ele sempre será um bom vinho e aqui começa a nossa aventura. Poderíamos, simplesmente, comprar outra garrafa idêntica. Estaremos absolutamente seguros que vamos repetir uma boa experiência, mas o que aprendemos? Nada!

Examinando rótulo e contra rótulo, descobrimos a origem do vinho, a uva ou uvas no caso de um corte, região produtora, safra, produtor e até mesmo o nome do importador caso não seja um vinho nacional. A questão a ser respondida, neste momento, é: será que existem outros vinhos com estas mesmas características?
Múltiplos caminhos podem ser seguidos na busca desta resposta, e devemos trilhar todos, mas um de cada vez. Um bom começo é o produtor: que outros vinhos ele elabora? Se preferir, podemos buscar outros produtores da mesma região. Talvez apareçam novas combinações de uvas que podem ou não nos agradar. Devemos respeitar o ‘um passo de cada vez’: se algo não deu certo, voltamos para a última coisa boa e mudamos o rumo.
Mais sugestões: outros vinhos do mesmo país; mesmo tipo de vinho feito em outros países e outros desdobramentos possíveis. Mais um caminho plausível: que outros vinhos são trazidos por este importador. Fácil perceber que há muita coisa para testar…
Com isto vamos provando, comparando e ganhando mais bagagem. Passaremos pelas uvas clássicas, Cabernet, Merlot, Sirah e Pinot, pelos cortes bordaleses e pelos inusitados, pelas uvas que brilham nos terroirs do Novo Mundo, Malbec, Carmenere e Tannat. Uma delas vai nos conquistar, sem dúvida, e se tornará o nosso ‘vinho de cabeceira’, o porto seguro, a referência.
Recorrendo ao nosso consultor: “O vinho está na boca de cada pessoa”.

Encontrar este vinho tão especial é quase um rito de passagem. Agora estamos seguros para tentar entender o que é ter paixão por vinhos, discutir sobre Chateau Petrús, Vega-Sicilia e Romanée Conti e, quem sabe, investir numa garrafa icônica.

Não pensamos mais em vinhos de prateleira e nossa literatura predileta são os ricos catálogos dos importadores. Uma viagem de sonho? Para uma grande vinícola, é claro! Começamos a colecionar rolhas, rótulos, taças, decantadores, saca-rolhas, etc.; cada um vai nos trazer boas lembranças, para sempre.
Dica da Semana: outro bom vinho de verão

Colomé Torrontés 2011 
Argentina/Salta
Palha vibrante. Intensamente aromático, com impressões de cítricos confitados, lichias, rosas e madressilva, além de especiarias exóticas. Viscoso em boca, mas com excelente sapidez mineral dando equilíbrio ao conjunto.

O que estamos bebendo: preço, rótulo ou vinho?

Tradicionalmente ao final de cada ano, jornalistas e publicações especializadas divulgam suas listas de melhores vinhos. Cada uma tem o seu enfoque e pode estar direcionada para um determinado mercado. São ótimas balizadoras para as nossas próximas compras, mas até onde podemos confiar nestes especialistas?
Gosto é subjetivo. Podemos avançar um pouco mais: gosto tem características geográficas, o que implica em clima e cultura. Um vinho de 100 pontos do respeitado Robert Parker pode não ser uma unanimidade. Pensando nisto, alguns interessantes experimentos foram realizados para demonstrar como a influência de pequenos detalhes externos pode mudar a nossa avaliação sobre um vinho.
Em 2001, Frèdèric Brochet (foto acima) um pesquisador da Universidade de Bordeaux, conduziu dois experimentos que geraram grande celeuma. No primeiro, reuniu 54 estudantes de enologia e lhes apresentou um copo de vinho tinto e outro de vinho branco, solicitando que cada um os descrevessem com um máximo de detalhes. Para o tinto os termos usados foram: cereja, framboesa e especiarias; para o branco: fresco, cítrico, pêssego e mel.
O que as cobaias não sabiam é que estavam provando um mesmo vinho branco que fora tingido com um corante inerte para ficar semelhante a um tinto. O objetivo, plenamente alcançado, era demonstrar que a cor do vinho influencia o nosso paladar.
No segundo teste, outro grupo de especialistas foi servido com duas garrafas bem diferentes, um Grand Cru de Bordeaux e um Vin de Table. Foi solicitada a avaliação dos vinhos. Como esperado, o de melhor qualidade ganhou comentários como ‘complexo’, ‘bom final de boca’ e ‘excelente’, enquanto o outro foi considerado como simples e sem graça. Novamente o pesquisador foi capaz de despistar os degustadores com embalagens mais ou menos sofisticadas: o vinho servido era exatamente o mesmo, um corte bordalês de qualidade mediana. Apenas a garrafas e rótulos eram diferentes.
O estudo mais polêmico até o momento veio da Universidade de Davis. Selecionaram 20 voluntários que provariam 5 Cabernet Sauvignon com preços variando de 5 até 90 dólares. Suas reações seriam medidas através de uma ressonância magnética do cérebro. A metodologia era servir o vinho informando sua faixa de preço. Na realidade, usaram apenas 3 vinhos, com preços de 5, 45 e 90 dólares. Na hora de apresentá-los aos voluntários, faziam diversas trocas como oferecer o mais barato como se fosse o mais caro ou repetir o mesmo vinho alterando o preço declarado.
Os resultados foram dentro do esperado: as melhores avaliações eram para os vinhos mais caros, mesmo que lhes fossem servidos os mais baratos.
Resumindo: as listas de melhores vinhos são necessárias e interessantes, mas devemos usá-las associadas às nossas próprias avaliações.
O guia Descorchados é a principal publicação enológica da América do Sul. Organizado por Patrício Tapia, tem versões para o Chile, Argentina e Brasil.
Apresentamos, abaixo, uma prévia do Guia 2013 para o Chile.
Melhores Tintos:
01 – Clos Quebrada de Macul Domus Aurea 2008, Maipo – 96 pontos
02 – Concha y Toro Carmín Carmenère 2010, Peumo – 96 pontos
03 – Carmen Gold Reserve Cabernet Sauvignon 2010, Maipo – 95 pontos
04 – Concha y Toro Terrunyo Cabernet Sauvignon 2010, Pirque – 95 pontos
05 – Almaviva 2010, Maipo – 94 pontos
06 – Antiyal 2010, Maipo – 94 pontos
07 – Aquitania Lázuli 2004, Maipo – 94 pontos
08 – Bodegas RE RE Cabergnan 2009, Loncomilla – 94 pontos
09 – Calyptra Zahir Cabernet Sauvignon 2009, Cachapoal – 94 pontos
10 – Casa Marín Miramar Vineyard Syrah 2010, Lo Abarca – 94 pontos
Melhores Brancos:
01 – Casa Marín Cipreses Vineyard Sauvignon Blanc 2011, Lo Abarca – 95 pontos
02 – Concha y Toro Terrunyo Sauvignon Blanc 2011, Casablanca – 95 pontos
03 – Aquitania Sol de Sol Chardonnay 2009, Malleco – 94 pontos
04 – Bodegas RE Re Chardonnoir 2011, Casablanca – 94 pontos
05 – Calyptra Gran Reserva Chardonnay 2009, Cachapoal – 94 pontos
06 – Concha y Toro Terrunyo T. Bottles Sauvignon Blanc 2011, Casablanca – 94 pontos
07 – Concha y Toro Amelia Chardonnay 2011, Casablanca – 94 pontos
08 – De Martino Single Vineyard Quebrada Seca Chardonnay 2010, Limarí – 94 pontos
09 – Maycas del Limarí Quebrada Seca Chardonnay 2010, Limarí – 94 pontos
10 – Tabalí Talinay Chardonnay 2011, Limarí – 94 pontos

Dica da Semana: uma ótima opção para este inclemente verão.

Carmen Classic Chardonnay 2011
País: Chile
Este ótimo Chardonnay, parcialmente barricado, é um verdadeiro achado, bastante rico e intenso, de excelente relação qualidade/preço.
Harmoniza com peixes e frutos do mar, vários queijos, aves e legumes grelhados.
Robert Parker: 87 pontos (03)

Atendendo aos pedidos

Vários leitores, por e-mail, expressaram suas dúvidas sobre a coluna da semana passada. Como o tema é interessante, preparamos esta nova página em cima dos questionamentos. A pergunta mais recorrente foi: 
As garrafas de vinho poderiam indicar a qualidade, a idade ou a origem? 
Com relação à qualidade ou à idade, a resposta é pura e simplesmente um não. Com relação à origem, em certos casos, é perfeitamente possível saber de onde vem o vinho. Vamos elaborar um pouco mais estes pontos. 
Não há como saber, pelo menos para o consumidor final, qual a qualidade do conteúdo, usando apenas a garrafa como indicador. Talvez nos brancos, em cascos claros, seja possível avaliar se o vinho está passado (cor âmbar), e nada mais. Este é o grande trunfo dos falsificadores, ninguém quer arriscar desarrolhar uma garrafa e prová-la antes de colocar num leilão de vinhos antigos… 
Mas há indicadores confiáveis que podem ser usados para qualificar um produto como melhor que outro. O mais visível é o rótulo: procurem por material mais encorpado e impressão nítida. Outro ponto a ser considerado é a chamada cápsula que envolve o gargalo protegendo a rolha: os melhores vinhos usam estanho ou lacre de cera, os vinhos comuns, plástico. A garrafa, hoje, funciona mais como um apelo mercadológico: pode haver novos formatos e rótulos em impressão direta sobre o vidro; o peso, muitas vezes, é usado para passar a sensação de que este é um produto superior – garrafas de mesmo formato com pesos bem diferentes. Dentro, o mesmo vinho… 
Falando em rótulos, nem sempre foram de papel: 

Seguindo certos parâmetros, poderíamos avaliar se uma garrafa é antiga ou nova, mas nada do que vamos aprender, a seguir, vai estar no nosso dia a dia de apreciador de um bom vinho. Observem a próxima foto: 

Está seria uma garrafa de Chateau Lafite, safra de 1789 da adega do Presidente Thomas Jefferson. Era uma fraude, embora a garrafa fosse antiga. Reparem no formato, não é uma bordalesa com pediria o Lafite, se aproximando do formato da Borgonha. 
Um outro exemplo de garrafa nitidamente antiga (ou pelo menos mal cuidada): 

Quanto ao conteúdo… 
O terceiro ponto: se uma garrafa pode indicar a origem do vinho, a resposta é um possível sim, dentro de certos limites. Os formatos descritos na semana passada têm origem precisamente neste fato – os produtores buscavam uma identidade visual para seus produtos. Com a chegada dos vinhos do novo mundo, esta lógica sofreu uma alteração: os novos produtores gostariam que a identidade visual dos seus vinhos remetesse aos vinhos franceses. 
Resumindo: o que se pode esperar de um vinho, numa garrafa Bordalesa, é que ele tenha sido elaborado com uma ou mais castas originárias de lá: Cabernet Sauvignon, Merlot, Petit Verdot, Cabernet Franc, Malbec e Carmenére. O mesmo raciocínio vale para as varietais da Borgonha e do Vale do Ródano (Rhone). Já estamos escutando a nova dúvida: Há exceções? Sim, muitas! 
Não precisamos ir muito longe, Itália, Portugal e Espanha. Quais a garrafas para os vinhos de Touriga Nacional, ou do Tempranillo ou ainda das inúmeras castas italianas? O melhor a fazer, neste caso, é interpretar por aproximação. Por exemplo: vinhos portugueses em garrafa bordalesa são vinificados, com as castas locais, à moda de Bordeaux. 
Podemos ir mais longe: há garrafas italianas que são quase exclusivas. Dois exemplos abaixo: 

A primeira é o clássico Chianti e a segunda o formato usado para os vinhos produzidos na região de Alba, um meio-termo entre os formatos de Bordeaux e Bourgone. 
Algum dos leitores sabe a razão do corpo em palha da 1ª garrafa acima? 

Uma única linha sobre cores: alguns vinhos, principalmente tintos, devem ser protegidos da luz, logo, as garrafas escuras. 
Por que 750 mililitros? 
Esta foi outra dúvida que tem múltiplas respostas; não há consenso entre os pesquisadores. Começamos com um pouco de história. As primeiras garrafas variavam desde 600 ml até 800 ml. Quem mais se preocupava com isto, naquela época, era a Inglaterra: direito do consumidor é coisa séria até hoje. Eventualmente eles teriam padronizado um volume de 1/5 de galão, medida básica do sistema vigente de então. Os norte-americanos copiariam a ideia, adaptando-a para o seu galão (US gallon), o que dava aproximadamente 757 ml, mais tarde arredondada para 750 ml pelo Canadá e EUA, no início da adoção do sistema métrico por estes países (1979). Mas isto não explica a escolha por este tamanho. Eis algumas possibilidades: 
1 – como as primeiras garrafas eram sopradas individualmente, esta medida era equivalente à capacidade pulmonar média dos sopradores; 
2 – o peso de uma garrafa deste volume se aproxima de 1,5 Kg o que é conveniente para o transporte; 
Esta última é a mais curiosa; 
3 – 1/5 de galão era considerado como uma quantidade aceitável para um adulto consumir numa refeição! 
Os Grandes Tamanhos 
Esta foi uma pergunta intrigante: como servir as garrafas de grandes tamanhos? 
A resposta é meio sem graça: como se serve uma garrafa padrão! (mesmo que seja necessária a ajuda de outra pessoa) 
Mas vale a pena levantar outras dúvidas, por exemplo, quando devemos usar tamanhos maiores? 
Se vamos servir durante um evento apenas o mesmo vinho, tinto ou branco, vale a pena usar garrafas Magnum em lugar de várias garrafas normais. A Magnum dupla é mais complicada e servirá melhor para fazer uma performance. Os produtores gostam de exibi-las, é um chamariz! 
Mas se o assunto for espumante, surge um novo problema para ser resolvido: como gelar uma garrafa como a Melquisedec com seus 1,5 metro e 40Kg ou mais? Sinceramente, não é para os pobres mortais. Mas nos grandes restaurantes do mundo, isto não parece ser um grande problema! 

Para futuras referências, uma coleção de diversos formatos: 

Da esquerda para a direita: Bordeaux, Bourgogne, Flauta, Champagne, D’Alba, Marsala, Porto, Húngara, Bocksbeutel (Francônia). 

Dica da Semana: para deixar todo mundo sem entender nada! 

Chianti DOCG 2009 
Produtor: Piccini 
País: Itália 
Região: Toscana 
Fermentação tradicional com controle de temperatura e um longo período de maceração. Maturação: Não passa por madeira. 
Este eterno Best Buy, para a Wine Enthusiast, mostra um bouquet cheio de frutas maduras. No palato é rico e macio, com um toque fresco que o deixa perfeito para acompanhar comida. 
Combinações: Carnes, queijos, massas, risotos e aperitivos. 

(Cadê a garrafa típica?) 

Agradeço a colaboração dos leitores: Sérgio Pirilo, Felipe Carruncho, Augusto Escobar e Giancarlo Marreti, esperando que suas dúvidas tenham sido esclarecidas.

Os Grandes Vinhos do Mundo – Chile – Final

O preferido dos especialistas 
Embora a expressão agradar a Gregos e Troianos seja bem conhecida, não é tarefa fácil. Deveria ser precedida de “não se pode”…. Transportando esta mitologia para o real mundo dos vinhos, a nossa tarefa se torna hercúlea. Selecionar este terceiro vinho icônico chileno foi muito difícil. São tantos produtos de 1ª grandeza por lá que é fácil fazer uma grande injustiça, isto sem levar em conta o número de especialistas que foram consultados. Afinal, gosto é pessoal. 
Conheçam a Lapostole 
Esta é uma vinícola jovem, inaugurada em 1994 pelo casal francês, Alexandra Marnier Lapostolle e Cyril de Bournet. O sobrenome Marnier tem enorme tradição no ramo de bebidas, o famoso licor Grand Marnier é seu o carro chefe. Mas atuam na vinicultura dirigindo o Chateau de Sancerre no Vale do Loire.

Começaram com uma arquitetura espetacular, 370 hectares de vinhedos em 3 áreas, o que há de melhor em tecnologia e a consultoria de Michel Rolland. O objetivo era um só: produzir um vinho de caráter europeu nos excelentes terroirs do Chile. Está localizada na área de Apalta, Vale de Colchagua, próximo à cidade de Cunaco, a região mais valorizada para vinhos no país. 

Dentre os diversos rótulos produzidos, destaca-se o Clos Apalta, um inacreditável corte de 78% Carménère, 19% Cabernet Sauvignon e 3% Petit Verdot (safra 2009), que tem recebido altas pontuações dos grandes críticos. Sua produção é artesanal. Para preservar todo o potencial da fruta, as uvas são colhidas à noite e colocadas em caixas de 14 Kg no máximo. Na vinícola, são selecionadas e desengaçadas manualmente, mantendo o alto padrão de qualidade. Os pequenos tanques de fermentação, de carvalho francês, são preenchidos por gravidade. Não há pressa. Pacientemente se espera que os agentes naturais façam o seu trabalho transformando o mosto em vinho. Nada de químicas alienígenas aqui. A temperatura é mantida em 28° e a maceração dura entre 4 a 5 semanas, com remontas manuais para se extrair o máximo das cascas e sementes obtendo estrutura e concentração no produto final. O amadurecimento é feito por 24 meses em barris novos e não há filtragem antes de engarrafar. 

Um colosso de vinho, apaixonante! Sua produção é minúscula e somente é vinificado em anos excepcionais. 

Mas não é um vinho fácil. Para apreciá-lo corretamente é preciso entendê-lo e ter um paladar bem apurado. Com um potencial de guarda em torno de 10 anos, temos que esperar que ele fique pronto, não deve ser consumido jovem. Como na foto, decantá-lo é fundamental. 
Notas de degustação (safra 2009) 
Coloração escura entre o roxo e o vermelho. No olfato, apesar de jovem, já demonstra muita fruta vermelha madura, ameixas e cerejas, além de notas de figo seco e moca. Percebe-se facilmente, aromas de baunilha e cravo da índia no final. 
No palato, é um vinho muito estruturado, com um ataque de boca compacto e sedoso. Taninos domados e um surpreendente e longo retrogosto (não falei que era um vinho para os especialistas?). 
Harmonização: carnes do tipo contra-filé, ovinos e carne de caça. Ótima combinação com sobremesas ricas em chocolate amargo. 
Um único fator contra: é um vinho muito caro! (e muito falsificado…). 
Críticas recentes: 
Wine Spectator: 93 pontos (safra 08) 
Wine Enthusiast: 95 pontos (safra 08) 
Wine Spectator: 94 pontos (safra 06) 
Wine Spectator: 96 pontos (safra 05) 
Cometemos alguma injustiça? 
São tantos vinhos maravilhosos no Chile que fica difícil dizer que não. Esta escolha foi baseada em análises de vários profissionais da área. Mas o universo de vinhos deste país é imenso, sem falar nas diversas vinícolas-boutique que produzem vinhos fora de série em pequenas quantidades e, portanto, desconhecidos. Dois outros grandes produtores merecem ser citados: 
– Emiliana Vinhedos Orgânicos – outra associação da poderosa Concha y Toro, que produz o fabuloso Coyan; 
– Viña Montes – do internacionalmente respeitado vinhateiro Aurélio Montes que, entre várias delícias, produz o Purple Angel, um dos vinhos mais celebrados da atualidade. 
Sem dúvida o Chile merece uma nova visita.  

Dica da Semana: mais um bom chileno da mesma região do Clos Apalta. 

Montes Selección Limitada Cabernet/Carmenère 2010 
País: Chile / Apalta 
Produtor: Viña Montes 
Uva: Cabernet Sauvignon e Carménère 
Um sucesso constante. Envelhecido em barricas de carvalho americano, que conferem ao vinho um delicioso toque de baunilha. Segundo a revista Wine Spectator, é difícil não gostar deste vinho. Harmoniza com carnes grelhadas, cortes de ovinos e de caça. 
Robert Parker: 90 pontos (safra 09) 

Na próxima semana cruzaremos os Andes!

Os Grandes Vinhos do Mundo – Chile – 2ª parte

O Mais conhecido! 
O Chile é um país privilegiado para vinhedos e vinhos. Um solo muito fértil, um clima perfeito para o desenvolvimento das uvas, obtendo-se resultados inigualáveis. Devido à sua curiosa localização geográfica, uma estreita faixa de terra espremida entre os Andes e o Pacífico, ficou imune à maioria das pragas, principalmente a temida Filoxera. Não foi por acaso que se tornou uma espécie de santuário das parreiras, preservando espécies, muitas vezes em pé franco, que já não existem mais em qualquer outra parte do mundo. Talvez nem se saiba, até hoje, a real dimensão deste repositório. A qualquer momento podem surgir novas espécies dadas como extintas. 
O exemplo mais conhecido é o da Carménère, hoje a uva emblemática do país, que só foi identificada corretamente em 1994 graças a um meticuloso trabalho do ampelógrafo francês Professor Jean-Michel Boursiquot. Esta uva, hoje raríssima na Europa, é uma das 6 uvas originais de Bordeaux (Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Malbec e Petit Verdot), que foram enviadas para a América do Sul para evitar a temida praga. Mesmo depois de descoberto o sistema de enxertia, ela nunca foi replantada, provavelmente por ser suscetível à outra doença, a Coulure, moléstia que ataca os bagos das uvas logo que começam a florescer. Resultou num belo trunfo para os chilenos, provocando a chegada de importantes vinícolas europeias para ali vinificarem e recuperarem algumas destas verdadeiras joias. 

Uva Carménère 

Em 1997 a Concha y Toro se associou com a bordalesa Baron Philippe de Rothschild SA, para produzirem um vinho excepcional, o Almaviva, talvez o vinho chileno de alta gama mais conhecido internacionalmente. 

Para produzi-lo, construíram uma espetacular vinícola, na região de Puente Alto, próximo a Santiago. 

O Almaviva é um corte de Cabernet Sauvignon vinificado com as mesmas uvas e métodos utilizados na produção do Don Melchor, com vinificações independentes de Carménère, Cabernet Franc e Merlot em proporções que variam a cada safra. A de 2007, que está no mercado, declara: 64% Cabernet Sauvignon; 28% Carménère; 7% Cabernet Franc e 1% Merlot. A decisão final desta mistura é feita por um colegiado de enólogos, chilenos e franceses. Um verdadeiro e respeitado Corte Bordalês produzido fora da França. Talvez o único no gênero. 
De cor vermelha rubi profunda e intensa, revela aromas puros e delicados de groselha maduras, amoras e morangos silvestres, combinados com notas minerais e toques de baunilha, café, alcaçuz, e especiarias. No palato, mostra-se muito equilibrado, taninos firmes e excepcionalmente longos, maduros, refinados e concentrados, contribuindo para densidade e textura elegante. Harmoniosamente perfeito. Excelente! ($$$$) 
Ótimo para acompanhar carnes vermelhas, cordeiro, carne de porco, queijos duros e pratos condimentados. 

Dica da Semana: um chileno delicioso e bem mais palatável no bolso. 

Chocalan Reserva Cabernet Sauvignon 2010 
País: Chile / Valle del Maipo 
Produtor: Viña Chocalan 
Uvas: 85 % Cabernet Sauvignon, 8% Syrah, 5% Carménère e 2% Petit Verdot 
Vinho de cor rubi com tons violáceos. Aromas de frutas vermelhas frescas e um pouco de mentol. No palato amora, cassis, ameixas, cerejas pretas. Saboroso e bem equilibrado, com madeira bem integrada. Grata acidez, bom volume e um final longo. Ideal para acompanhar queijo emmental e brie, carne de boi, carneiro, porco, veados e javalis, ou simplesmente com empanadas. 

Na próxima semana, o chileno predileto dos especialistas.

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