Categoria: Castas (Page 5 of 9)

17/04 – Dia da uva Malbec

Coube ao agrônomo francês Michel Pouget a chegada das primeiras mudas da casta Malbec, na Argentina, vindas diretamente da França. O Ano era 1853. Pouget havia sido contratado pela Quinta Agronômica de Mendoza para melhorar a qualidade dos vinhos produzidos na região.

17 de abril é registrado como o dia de sua chegada ao país. A data comemorativa só foi instituída a partir de 2011. Em função da situação pandêmica, os eventos que celebram este dia serão virtuais, como master classes e degustações.

Ninguém poderia imaginar que muitos anos depois da chegada de Pouget, a Malbec, uma varietal muito conhecida em Cahors e em Bordeaux, onde era utilizada no famoso corte antes da devastação provocada pela Filoxera, fosse renascer em solo estrangeiro e se tornar uma protagonista.

Hoje faz sucesso com os vinhos denominados “Malbec Argentino” e também com rótulos elaborados no Chile, na Califórnia, na Nova Zelândia e na França, pelo menos. No Brasil já se encontram algumas tímidas vinificações.

O sucesso desta casta no terroir argentino tem a mão de mais dois estrangeiros, outro francês, Michell Rolland, e o norte americano, Paul Hobbs, trazido pelo “pai” argentino do vinho Malbec, Nicolas Catena. Toda essa mudança só começa lá pelos anos 90. Incrível!

Segundo a Wines of Argentina, vinhos elaborados com esta casta são exportados para 129 países. O Brasil é o 3º maior importador, atrás da Inglaterra e dos Estados Unidos.

Mendoza não é o único terroir argentino. Duas outras regiões se destacam, a Patagônia e o noroeste do país: Vale Calchaquí (Salta), Chañar Punco, Quebrada de Humahuaca.

Cada local destes tem suas próprias características resultando em vinhos únicos. Para os paladares treinados, é fácil identificar cada um deles.

Vamos homenagear esta uva, que caiu no gosto dos enófilos brasileiros, indicando um bom vinho de cada região. Para aqueles que forem aventureiros, sugiro que organizem uma degustação comparativa. Vai ficar na memória, para sempre.

Da região de Mendoza: Achaval Ferrer Malbec

Da Patagônia: Humberto Canale Malbec

Do Noroeste argentino: Colomé Estate Malbec

São três excelentes vinhos. Existem diversas outras opções caso não encontrem essas recomendações. A ideia é ter um bom momento de diversão e, quem sabe, treinar o paladar.

Saúde e bom dia da Malbec!

Créditos: imagem de abertura por María Fernanda Pérez por Pixabay

Uma casta, um vinho – Mencía

Não se pode falar sobre essa varietal sem associar uma região da Espanha, Bierzo, e um produtor, Alvaro Palácios, a quem coube elevar os vinhos elaborados com essa uva a uma outra categoria.

Não é exclusiva nem de um e nem de outro: é uma casta ibérica. Diversos autores e pesquisadores divergem, muito, sobre suas origens.

Durante muitos anos acreditou-se que era uma casta clone da Cabernet Franc, surgida na Espanha. Mais tarde, já com o auxílio de análises por DNA, conclui-se que era a mesma casta conhecida por Jaén, na região do Dão, Portugal. Especulava-se que peregrinos, retornando de Santiago de Compostela, a teriam plantado em território português.

A descoberta mais recente, com o auxílio de moderníssimas técnicas de análise do perfil genético das plantas, concluiu que é uma casta portuguesa, com certeza, surgida através do cruzamento, natural, das uvas Alfrocheiro e Patorra, típicas da região do Dão.

A área plantada, somando os dois países, alcança 11.600 hectares. A maior concentração está em Bierzo. Sempre foi usada na elaboração de vinhos de mesa até que Alvaro Palacios redescobriu alguns antigos vinhedos de altitude. Aplicou métodos de vinificação atuais e obteve pequenas joias.

Críticos colocam os vinhos desta casta entre um Pinot Noir e um Syrah. Apresentam um corpo médio a encorpado, com características florais e de frutas vermelhas como Romã, Ginja e Framboesa. Os taninos estão presentes, sempre muito suaves e domados. Amadurece com grande dignidade.

Por ser um vinho bem gastronômico, a paleta de harmonizações é ampla incluindo variados pratos de carne, bovina, suína, ovina, aves e caça, elaboradas de diversas maneiras; queijos amarelos duros, como o Manchego ou macios como o Serra da Estrela e Azeitão.

Especiarias também não são problemas para este versátil vinho: pimenta negra, cravo, anis, cardamomo, alecrim, alho, cebola e muito mais. No capítulo dos vegetais enfrenta até uma difícil alcachofra.

É pau para toda obra!

Escolhemos um vinho espanhol para representar esta interessante casta:

Pétalos del Bierzo, da vinícola Descendientes de J. Palacios.

Elaborado com 100% Mencía por Alvaro Palcios e seu primo Ricardo Peréz, é uma delícia para ser degustado. Potente, encorpado e muito elegante, recebeu 92 pontos do crítico Antonio Galloni, na safra de 2015. Um dos melhores “best buys” da Espanha.

Saúde e bons vinhos!

Créditos: foto de abertura – https://glossary.wein.plus/mencia

Bordeaux aprova o uso de novas castas

Em 2019, produtores bordaleses solicitaram ao INAO (Institut National de l’Origine et de la Qualité) a inclusão de 7 novas castas que poderiam ser vinificadas na região. Tudo em nome das alterações climáticas e a eterna preocupação de manter a reconhecida qualidade superior dos vinhos de Bordeaux. (veja nossa coluna: Novas castas Bordalesas)

As pesquisas já estavam sendo feitas há cerca de 10 anos, incluindo plantio e vinificações experimentais. Este processo seletivo, que teria começado com mais de 50 castas, concluiu que apenas cinco uvas tintas e duas brancas eram adequadas. Faltava a aprovação dos órgãos de controle.

Não foi uma decisão fácil para o respeitado INAO, afinal, o seu OK a este ambicioso projeto significava, também, a quebra de uma tradição secular: o mais que famoso “corte bordalês”, elaborado com as nobres Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Petit Verdot, Malbec e Carménère. Teria que ser repensado e, quem sabe, ganhar uma nova denominação. A decisão foi embasada pelo Conselho de vinhos de Bordeaux (CIVB).

Das sete castas propostas, uma não passou no crivo, a branca Petit Manseng. Apesar de se adaptar perfeitamente ao novo terroir e permitir cortes brancos perfeitos, a razão pela que não teria sido aceita não tem nada de técnica ou científica: é a casta icônica do sudoeste francês (Cahors, Bergerac, Buzet and Gaillac). Seria um grande problema alterar esse “status quo”.

Há algumas curiosidades no grupo aprovado.

As tintas Arinarnoa e Marsellan são uvas criadas através de cruzamentos controlados. A primeira entre a Cabernet Sauvignon e a Tannat (1956) e a segunda entre a Cabernet Sauvignon e a Grenache (1961).

A terceira casta tinta aprovada se chama Castets. É nativa na região e mais conhecida por ser uma casta bordalesa quase esquecida. Ou seja, estava por ali e ninguém se interessava por ela…

A grande novidade é a quarta uva tinta, importada de Portugal, a Touriga Nacional, uma das grandes castas lusitanas.

No capítulo das brancas, aparece outra casta ibérica e também muito importante no cenário de Portugal, a Alvarinho ou Albarinho, na Espanha.

A última casta aprovada, branca, se chama Liliorila. Novamente, é um cruzamento entre a Chardonnay e a Baroque, outra casta do sudoeste francês que andou muito desprestigiada por longo tempo.

As regras de utilização

Por enquanto essas novas castas não serão as protagonistas, sendo colocadas num 3º time ou reservas, para usar uma linguagem bem popular. Antes delas estão as principais (Cabernet, Merlot…) e as secundárias (Malbec, Carménère…). Este critério será revisto a cada 10 anos.

Com relação à área plantada, limitaram a 5% do vinhedo total. Na elaboração do corte, estipularam um máximo de 10% do volume.

Isto implica que, de acordo com a legislação vigente, não é obrigatório citar as novas castas nos rótulos.

As pesquisas para encontrar soluções que ajudem aos produtores se adequarem as mudanças climáticas continuam em várias outras frentes, que incluem até o manejo das parreiras, seja com podas mas precisas, mudanças na chamada área coberta, altura das plantas e colheitas em diferentes pontos de maturação.

Fazendo um paralelo, pesquisas brasileiras desenvolveram a poda invertida, mudando a época de frutificação das uvas para um período de clima mais ameno no nosso país.

Esta técnica é um enorme sucesso que permitiu ampliar a nossas regiões produtoras e a utilização de novas castas que não se davam bem por aqui.

O resultado final são alguns vinhos tranquilos muito bons que já estão chamando a atenção de críticos e consumidores internacionais.

Sinal que os caminhos bordaleses têm tudo para dar certo.

Saúde e bons vinhos!

Créditos: Imagem de alohamalakhov por Pixabay

Uma casta, um vinho – País

Esta é uma casta muito especial para os enófilos das américas: coube a ela a introdução do vinho em nosso continente.

Sua origem é espanhola, na região de Castilla-La Mancha. A primeira descrição desta casta é de 1513, feita por Alonso de Herrera, que a chamou de Palomina Negra.

Em condições normais, esta uva não teria sobrevivido a epidemia de Filoxera que devastou os parreirais europeus. Mas, com o auxílio da técnicas de análise por DNA, muito atuais, descobriu-se que nos séculos XVI e XVII, colonizadores e missionários a caminho do novo continente a levaram para quatro diferente regiões que hoje são: México, Chile, Argentina e Ilhas Canárias. Em cada local recebeu uma denominação diferente: País, Mission, Criolla Chica, Listán Prietro e muitos outros, totalizando quase 50 sinônimos.

Muitos pesquisadores admitem que esta foi a primeira Vitis vinifera plantada no continente americano, naqueles territórios controlados pela Espanha. Curiosamente não chegou ao Brasil, embora ela exista em Portugal com o nome de Listrão.

Com a chegada de outras castas viníferas, como a Malbec, Cabernet Sauvignon e Merlot, a País foi sendo esquecida, mas seus vinhedos foram preservados e eventualmente era vinificada de modo bem rústico, sem grande importância para o mercado de vinhos finos.

Coube ao Chile redescobrir esta casta e, logo depois, a Argentina. Com técnicas modernas de plantio e vinificação estão produzindo pequenas joias. No Chile é a segunda varietal mais encontrada, depois da Cabernet Sauvignon.

O movimento de vinificar vinhos atuais com a País começou por pequenas vinícolas. Mantinham uma certa rusticidade como principal característica dos vinhos, tudo para preservar um estilo “rural”. Eram vinhos destinados a acompanhar as comidas típicas de um campesino – carnes na brasa, guisados, miúdos e embutidos domésticos.

Os resultados foram ótimos e logo as vinícolas de maior porte embarcaram nesta deliciosa aventura. O Guia Descorchados, apresenta uma categoria só para esta casta. Na edição de 2020 os vencedores receberam 95 pontos: Bouchon Pais Salvage 2019 (Chi) e o Cara Sur Parcela La Tortora 2018 (Arg).

Na relação dos melhores, vamos encontrar produtores como a Vallisto, Durigutti, El Esteco, Cadus e Catena Zapata (Arg); Garces Silva, Garage Wine Co., Miguel Torres e Santa Cruz (Chi). Nada mau.

Tintos e rosados são o caminho desta tradicional casta, quase esquecida. São vinhos com uma interessante acidez, atípica para os tintos e boa tanicidade. São ao mesmo tempo refrescantes e poderosos para enfrentar um gordo naco de carne ou de caça.

O vinho escolhido foge da maioria dessas características, mas abraça, com muita dignidade, a acidez natural desta varietal – um espumante!

Santa Digna Estelado Brut Rosé– Miguel Torres

Elaborado com uvas produzidas por pequenos produtores, apresenta coloração rosa pálido. No nariz, notas frutadas, com ênfase em frutas vermelhas e cítricas. O paladar é descrito como “selvagem” e fresco, característica desta casta histórica.

Perfeito para acompanhar pratos de peixes e frutos do mar.

Na safra de 2018 recebeu 93 pontos do Guia Descorchados e 90 pontos do crítico James Suckling.

Saúde e bons vinhos!

Créditos: imagem de abertura – https://glossary.wein.plus/criolla-chica

Uma casta, um vinho – Syrah

Também conhecida por Shiraz, Hermitage e vários outros sinônimos, é uma uva muito importante. Curiosamente, nunca é citada no conhecido grupo das castas nobres (Cabernet Sauvignon, Merlot, Pinot Noir, Chardonnay, Riesling e Sauvignon Blanc) o que pode ser considerado com uma grande injustiça: os vinhos elaborados a partir desta casta estão entre os mais celebrados e premiados do mundo, Robert Parker que o diga.

Uma uva francesa, com certeza, apesar de inúmeras versões sobre sua origem, incluindo uma envolvendo uma cidade persa, homônima (Shiraz). São lendas, apenas. Descende, diretamente, de um cruzamento natural entre as uvas Durezam e Mondeuse Blanche.

Seu berço natal e local onde melhor se expressa é o vale do rio Ródano, no sul da França. De lá partiu para o resto do planeta, onde está plantada em outras regiões europeias, americanas e asiáticas.

Cada terroir produz um vinho com características ligeiramente diferentes que podem ser resumidas no gráfico a seguir:

Taninos macios, alcaçuz, pimenta preta, frutos negros e chocolate são algumas das notas comuns em qualquer vinificação desta casta.

Na França estão alguns dos melhores vinhos, como os famosos Hermitage, Côte Rotie, Cornas, Crozes-Hermitage e Saint-Joseph. Mais ao sul vamos encontrar cortes com as castas Mourvedre e Grenache, conhecidos como GSM, um fantástico contraponto ao corte bordalês. Na nossa opinião, os GSM são superiores.

Para fechar o quadro, é uma das 18 uvas que podem ser usadas na elaboração do não menos conhecido Chateauneuf-du-Pape.

Barossa, McLaren Vale e Limestone Coast na Austrália; Priorat, Montsant, Toro e Yecla na Espanha; Mendoza na Argentina; Stellenbosch, Paarl e Franschhoek na África do Sul; Paso Robles, Santa Barbara, Napa, Sonoma e Columbia Valley nos EUA; Toscana e Sicília na Itália; Vales de Colchagua e Maipo no Chile; Alentejo e outras regiões de Portugal.

Não poderíamos deixar de citar algumas regiões do Brasil onde esta casta tem surpreendido e aceitado perfeitamente o sistema desenvolvido pela EPAMIG, a dupla poda: Sul de Minas e Serra da Mantiqueira em SP. Produzem alguns dos mais premiados vinhos brasileiros no exterior.

Casta polivalente e multifacetada, seus vinhos são altamente gastronômicos com os quais podemos harmonizar desde os picantes queijos de mofo azul até carnes na brasa. Perfeitos para acompanhar pratos que usem e abusem de ervas da Provence e outras especiarias.

Apesar da fama dos vinhos franceses, australianos e sul-africanos, escolhi um alentejano para representar esta casta:

Antes de mais nada é um Syrah delicioso, embora já esteja numa faixa de preços perto do proibitivo. O mais interessante é que se tornou um marco na história dos vinhos portugueses.

Elaborado pela vinícola Cortes de Cima, de propriedade do casal Carrie e Hans Jorgensen, ela norte-americana e ele dinamarquês. Compraram terras no Alentejo e, contra tudo e contra todos, plantaram castas não portugueses, a Syrah entre elas.

Depois de longo período esperando as parreiras produzirem adequadamente, elaboraram a 1ª safra deste lindo vinho. Foi quando se deram conta que não podiam obter nenhum registro oficial dos institutos que controlam a produção de vinhos em Portugal. Era uma vinho que “não existia”, pelo menos para a burocracia local. Deste fato surge o nome Incógnito, uma grande ironia para batizar um vinho que teria que ficar escondido…

Hoje é um dos carros-chefe desta vinícola e um dos melhores vinhos portugueses. A legislação se dobrou frente à qualidade e importância desta casta.

Bem estruturado, com notas de especiarias e frutos negros. Sedoso no paladar, fácil de beber. Mostra todas as características que fazem da Syrah uma uva campeã.

Saúde e bons vinhos!

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