Categoria: O mundo dos vinhos (Page 25 of 82)

Degustar ou “entornar”?

Numa das oficinas de degustação que organizamos, um dos presentes avaliava cada vinho apresentado, que lhe agradava, com o seguinte comentário: “altamente entornável”!

Isto nos deixava com um misto de satisfação, pelo vinho escolhido, e tristeza, por conta do baixo aproveitamento de tudo que havia sido exposto na parte teórica da oficina.

Cada bebida alcoólica tem seus ritos de degustação que deveriam ser seguidos por seus admiradores. O vinho não é exceção e talvez seja a bebida que mais ritos exige para dar, ao seu aficionado, um título de expert, enófilo ou de grande conhecedor.

Vinhos são pensados e elaborados para nos proporcionar uma série de pequenos encantos que começam quando o líquido é vertido numa taça e terminam algum tempo depois do último gole, ao fim da garrafa.

A capacidade de apreciar tudo isto exige algum conhecimento e muito treino. Não é algo que se adquire da uma hora para outra e nem tem um preço fixado que pode ser pago em suaves prestações.

Uma das primeiras lições é como identificar se um vinho tem qualidades acima da média. Um ótimo indicador já está bem delineado nos parágrafos anteriores: permanência. Um vinho de boa origem e vinificado com todos os cuidados, vai se manter no nosso palato por algum tempo. Não é aquela coisa do bebeu e passou. Esta qualidade é fundamental para que a harmonização com alimentos funcione.

Não podemos deixar de lado o conhecido trio: cor, aroma e sabor. Este primeiro contato tem muito a nos dizer sobre o que vamos provar. É tão importante que Sommeliers são avaliados por sua capacidade de identificar diferentes vinhos a partir destes três elementos, o que não é fácil.

Apesar do rito ser o mesmo para profissionais ou para simples apreciadores, é na conclusão do que se observou que surgem as diferenças. Enquanto eles procuram pistas sobre as origens do que estão degustando, nós devemos olhar para outros parâmetros. O mais importante deles é o equilíbrio.

Fruta, acidez, taninos e teor alcoólico devem estar em harmonia, um não deve ser mais evidente que os outros. Um importante reflexo disto é observar que, na hora de acompanhar uma refeição, a intensidade de sabor do vinho deve acompanhar a do prato servido.

Vinhos se destacam por sua capacidade de nos oferecer uma ampla gama de aromas e sabores que, ao final, se traduzem em satisfação. Ao olhar a cor, sentir os diversos aromas e sabores, procurem identificar e associar com as suas referências – não vamos conseguir identificar algo que nunca provamos antes.

Um exemplo clássico é o alcaçuz, uma presença fácil de ser identificada nos tintos que passaram por barricas de carvalho. Infelizmente, esta raiz adocicada deixou de fazer parte do nosso dia a dia. Antigamente, era comum balas de alcaçuz serem vendidas por baleiros ambulantes. Hoje, este marcante sabor só é identificado em algum xarope para tosse, mesmo assim, se formos avisados que ele está ali.

O conselho final é: trabalhem com o conhecimento que vocês têm. Para enriquecer sua base de dados, participem de degustações, viajem e façam cursos e oficinas e, sobretudo, não “entornem” …

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Foto de abertura por Freepik

17 de abril – Dia do Malbec

Em 2023 será a 13ª edição desta comemoração, que celebra um dos vinhos mais apreciados por aqui.

Tudo começou em 1853 quando o Presidente da Argentina, Domingo Faustino Sarmiento, autorizou a importação de castas europeias, a Malbec entre elas, para melhorar a qualidade do vinho argentino.

150 anos depois, os vinhos desta casta, produzidos em Mendoza, ganharam o mundo. Não foi uma tarefa fácil. Originalmente a tendencia dos produtores argentinos era apostar nas clássicas Cabernet Sauvignon e Merlot. Com a chegada de consultores internacionais, entre eles Hobbs, Rolland, Cipresso e alguns outros, intrigados com a quase obscura casta originária de Cahors, França, resolveram experimentar e o sucesso foi enorme.

A Malbec havia se adaptado perfeitamente ao terroir quase desértico de Mendoza e de outras regiões do país. Coube ao Dr. Nicolás Catena mostrar estes novos vinhos para o resto do mundo. Mas não foi só ele: José Alberto Zuccardi, Susana Balbo e Michael Halstrick, o proprietário da Bodega Norton. Cada um teve um importante papel nesta história.

As portas foram abertas para investidores de todos os cantos. Grupos de vinhateiros de Bordeaux constroem vinícolas em Mendoza, Salta e Rio Negro. Nomes como Donald Hess, Hervé Fabre, Genot Langes e Francois Lurton se tornam comuns neste cenário.

Uma segunda geração se destaca, sendo muito importante para manter a qualidade de tudo que já foi construído, mas sobretudo, para trazer novos olhares para estes vinhos: Jorge Riccitelli, Walter Bressia, José Galante, Mariano Di Paola, Marcos Etchart, Marcelo Pelleriti, Daniel Pi, Roberto de la Mota, Alejandro Vigil, Sebastian Zuccardi, David Bonomi, Matias Michelini, Alejandro Sejanovich, Matthias Riccitelli e muitos outros.

Guardem estes nomes e escolham seus Malbec por eles!

Dizem que é o vinho perfeito para harmonizar com o “asado”, que em linhas gerais corresponde ao nosso churrasco. Na nossa opinião, também pode ser degustado com massas em molho de tomate, empanadas e queijos de sabor intenso.

Uma das harmonizações mais curiosas que já experimentamos foi com uma sobremesa, uma mousse de chocolate amargo, café e canela, servida com o Kinien, melhor Malbec da vinícola Ruca Malém, onde almoçamos sob a batuta do Chef Lucas Bustos. (não é mais elaborado, mas ainda se encontram garrafas à venda)

Inesquecível!

Nossa sugestão para “bebemorar” nesta data:

El Enemigo Malbec 2018

Muito frutado e elegante. Um vinho excelente para sua faixa de preço. Recebeu 93 pts Parker, nesta safra.

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Imagem de 8photo no Freepik

Vinhos para a Páscoa

Uma das mais importantes tradições brasileiras, as celebrações da Semana Santa, são aguardadas com muito carinho pelas nossas famílias. A expectativa de reencontrar parentes e amigos em torno de uma boa mesa é sempre animadora e, claro, não podem faltar bons vinhos para harmonizar tudo.

Os frutos do mar se destacam nesta época, principalmente o Bacalhau, preparado em mais de mil formas diferentes, todas deliciosas. Outros peixes, crustáceos e moluscos não ficam atrás e o cardápio da Sexta-Feira Santa é sempre farto.

Como se isto não bastasse, no Domingo de Páscoa temos outra mesa abundante. Neste dia, carnes bovinas, suínas, ovinas e de aves fazem contraponto com as delícias servidas na sexta-feira.

Mas o momento mais esperado é o da sobremesa: chocolates, nas mais diversas formas…

Haja vinho para combinar com isto tudo.

Tintos, brancos, rosados e generosos dão conta facilmente, basta saber o que abrir em cada momento.

Bacalhau, que em Portugal é tratado como “o fiel amigo”, pode ser acompanhado de brancos ou tintos, tudo irá depender do preparo. Para não errar, opte por um bom branco. A nossa sugestão é um Pinot Grigio. Há várias boas ofertas nas nossas lojas e mercados. Escolhemos esta:

Argento Pinot Grigio

Este vinho argentino é delicioso e fácil de encontrar. Muito aromático, apresenta aromas cítricos, pêssego e damasco. Fácil de beber. Deve ser servido entre 8º e 10º

Se a opção recair sobre um tinto, que servirá também para os pratos de domingo, a escolha pode ficar entre portugueses, chilenos ou argentinos. O ideal é um vinho mais neutro que nos permita apreciar o prato escolhido, sem se sobrepor. Nossa sugestão é este interessante chileno, vendido em garrafas de 1 litro:

Cacique Maravilla Pipeño País

A casta País, também conhecida como Mission, talvez seja a verdadeira uva emblemática das Américas. Desprezada por muito tempo, voltou a ser vinificada em grande estilo. Um vinho leve e refrescante, com taninos finos e presentes. Uma grande surpresa.

O capítulo final da nossa odisseia é como enfrentar toneladas de chocolates, sejam nos ovinhos, bombons, mousses, brigadeiros e muito mais.

Nossa sugestão se curva para a forma mais tradicional de harmonizar esta formidável guloseima: Vinho do Porto.

Entre Ruby, Tawny ou LBV, cada um combina melhor com um tipo de chocolate. Aqui está a nossa sugestão:

Calem Velhotes Ruby

Perfeito com chocolates ao leite, os mais comuns na época de Páscoa. Este Porto é uma das marcas mais populares em Portugal. Fácil de encontrar por aqui, também. Boa relação custo x benefício.

Pode ser servido ligeiramente refrescado.

Se nenhuma destas opções fez a cabeça de algum leitor, temos alguns vinhos coringa, por exemplo, rosados e espumantes, que podem ser brut ou demi-sec, para acompanhar as sobremesas.

Boa páscoa para todos!

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS:

Imagem de abertura por Racool_studio no Freepik;

Fotos das garrafas obtidas no sites das vinícolas ou distribuidoras.

Vinho nas “redes sociais”

Recentemente, um dos pares desta coluna recebeu a imagem, acima, em uma de suas redes e achou curioso. Ato contínuo, encaminhou para a redação da coluna com a clássica dúvida: “Isto é verdadeiro?”

A resposta é sim e este tema já foi assunto do nosso site em duas ocasiões diferentes:

Em 2014 – Uma taça para cada tipo de vinho;

Em 2022 – Qual é a sua taça?

Acreditávamos que estes dois textos seriam suficientes para esgotar este tópico, principalmente se observarmos que está longe de ser uma novidade, como gostam os produtores de “conteúdo para as redes”. Imaginem que a primeira notícia sobre as taças desenvolvidas especificamente para cada tipo de vinho data de 1973, quando Claus Riedel, renomado fabricante austríaco, lançou a linha Sommelier, com taças dedicadas a diferentes castas e estilos de vinhos.

Estabelecido que isto não é uma novidade, resolvemos imaginar as razões para a figurinha em questão fazer tanto sucesso atualmente, “viralizou” …

A explicação mais rápida e rasteira seria: quem publicou não entende nada de vinhos.

Uma segunda linha de raciocínio nos levaria a perguntar: seriam necessárias todas estas taças?

Provavelmente não, a menos que vocês sejam renomados “enochatos” e têm espaço suficiente para guardar todas elas, em dobro, no mínimo.

Novamente, quem publicou demonstrou, mais uma vez, sua total ignorância sobre o assunto.

Na realidade, trata-se de uma elegante maneira de fazer um marketing poderoso, num mercado (de taças) muito disputado. São mais de setenta fabricantes, alguns muito famosos como Riedel, Zalto, Spiegelau e Schott. Acreditem, assim como no futebol, há grupos adeptos de cada marca que preferem discutir qual taça é a melhor, e o vinho que está nela fica em segundo plano.

Em termos de estratégias, podemos traçar uma semelhança com o tal vinho chileno “Reservado”, outra curiosa forma de marketing. Há quem simplesmente abomine esta ideia e há quem tece loas à qualidade do vinho.

De forma análoga às taças, o importante passa a ser a atitude da vinícola ou do enófilo, que compra e degusta, em oposição aos que são mais conservadores e se irritam com a sugestão da fraude (o rótulo Reservado) e nem provam o vinho.

Como sempre, na Terra Brasilis, normatizaram esta categoria de vinhos, pegando uma carona no marketing alheio. Típico …

Tradicionalmente, três tipos de taças seriam mais que suficientes para atender a qualquer Enófilo, iniciante ou experimentado: taças para tintos, brancos e espumantes. Poderíamos incluir taças para vinhos generosos, como o Porto ou o Jerez.

Uma versão mais atual desta regrinha, muito dirigida para os que não têm orçamentos ilimitados, propõe a taça universal, que serve para tintos, brancos e rosados e as para espumantes. Seguindo nesta linha minimalista, já há que quem use uma única taça para qualquer tipo de vinho, inclusive os espumantes, o que na nossa opinião é o caminho a ser seguido.

Os leitores já devem ter percebido que a foto que viralizou e ilustra este texto não chega a ser uma “eno fake News”, mas também não contribui, em nada, para um debate mais civilizado.

Ao que tudo indica, estes conteúdos populares nas redes, em sua maioria, são desprovidos de fundamentos que os apoiem. São opiniões pessoais ou apenas fruto dos adeptos da “Achologia”. Acabam seguindo um conhecido chavão, “quem conta um conto aumenta um ponto”.

A melhor defesa contra este tipo de informação, pouco precisa, é termos conhecimento e cultura: façam um bom curso sobre vinhos, participem de oficinas de degustação e visitem vinícolas, se for possível.

Nas redes há muita coisa boa e, modéstia à parte, o nosso site é uma delas. Também tem muita bobagem e inutilidades. Somos nós que devemos aplicar os filtros adequados: antes de repassar, pesquisem, analisem, perguntem e tenham certeza de que vale à pena divulgar esta ou aquela informação.

Se acharem por bem divulgar, deixem claro que se trata de uma opinião pessoal ou citem fontes confiáveis. Mensagens “anônimas” são sempre suspeitas.

Proponho um desafio: releiam os dois textos já publicados (é só clicar nos links) e depois comentem ao final desta coluna (cliquem em comments). Um fórum é uma das melhores formas de aprender e tirar dúvidas.

Saúde e bons vinhos!

Será que este vinho está bom?

Esta é uma dúvida bastante frequente, seja na hora de uma compra ou naquele momento em que redescobrimos uma garrafa perdida no fundo da adega.

Os mais aventureiros partem, logo, para o teste “São Tomé”: simplesmente abrem a garrafa, provam e tiram conclusões.

Os engajados no mundo do vinho conhecem algumas pistas que permitem uma análise bastante confiável, evitando ter que sacar a rolha.

Vamos a elas:

1 – Examinar a garrafa contra um fundo bem claro e iluminado. Pode ser uma luminária, desde que não esquente o vinho. Vale para tintos e brancos. Mas não agitem a garrafa antes desta etapa.

Se encontrarmos alguma turbidez ou pouca transparência, é um primeiro sinal de alerta. Depósitos no fundo podem ajudar a esclarecer mais um pouco. Muito comum nos tintos que não foram filtrados antes do envase, há uma quantidade de sedimentos se depositam no fundo da garrafa.

Não são defeitos e o mesmo raciocínio vale para os cristais de tartarato. Deixe a garrafa em repouso, na vertical, por um par de horas e faça nova inspeção em busca de um conteúdo mais límpido.

Inspecionem, também, o nível do líquido no gargalo. Se estiver muito baixo, é sinal de que houve evaporação pela rolha. Isto é comum em vinhos muito velhos, mas se a garrafa tiver menos de 10 anos …

Outro ponto a ser observado é a rolha. Se ela estiver meio levantada, mofada ou esfarelando, até deixando pedacinhos boiando no vinho, ligue o sinal de alerta.

Uma rolha que não esteja nivelada com o gargalo indica que a garrafa foi exposta a altas temperaturas. Grandes chances de o vinho estar passado.

Se estiver só mofada, pode ser apenas consequências da adega. Já uma rolha quebradiça é sinal que chegou no fim de sua vida útil. O vinho pode estar oxidado.

2 – Se a nossa garrafa sob suspeita passar nestes testes iniciais, chegou a hora de sacar a rolha, que deve sair inteira. Novos sinais devem ser observados:

– Aromas de papelão molhado ou de pano mofado – indica o vinho “bouchonné”, um defeito que ocorre pela presença de tricloroanisol (TCA). Pode ser passageiro. Experimentem decantar o vinho e aguardar algum tempo. Se não desaparecer, lixo;

– Aromas de enxofre, borracha queimada ou similares – indica que o vinho não teve um processo de elaboração com todos os cuidados necessários. Pode, ainda, ter origem no campo, com uvas que não foram cultivadas da melhor forma. Há quem tente salvar estes vinhos colocando moedas de cobre, impecavelmente limpas, em contato com o líquido por algumas horas. O melhor é descartar esta garrafa;

O último e definitivo teste é provar. Qualquer sabor estranho ao nosso universo é suficiente para interromper o teste e tentar alguma ação corretiva. A mais comum é decantar e aguardar, algumas vezes, por mais de 24 horas.

Será que vale à pena?

Saúde e bons vinhos!

CRÉDITOS: Imagem de Racool studio no Freepik

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